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Onde estão os mortos pelos drones dos Estados Unidos?

Líderes locais em um acampamento de protesto contra os drones na localidade paquistanesa de Hayatabad. Foto: Ashfaq Yusufzai/IPS
Líderes locais em um acampamento de protesto contra os drones na localidade paquistanesa de Hayatabad. Foto: Ashfaq Yusufzai/IPS

 

Peshawar, Paquistão, 11/12/2013 – Mais de 300 ataques dos Estados Unidos com aviões não tripulados (drones) mataram 2.160 combatentes islâmicos e 67 civis no Paquistão desde 2008, segundo o Ministério da Defesa do país asiático. Contudo, moradores das áreas afetadas questionam esses números, e os do norte paquistanês perguntam por que ninguém mostra foto dos cadáveres nem informam os nomes das vítimas. Moradores das Áreas Tribais Administradas Federalmente (Fata), fronteiriças com o Afeganistão e onde acontece a maior quantidade de ataques com drones, garantem que morreram mais civis do que indicam os dados oficiais.

“Os ataques com drones dos Estados Unidos são um completo mistério. Ninguém sabe claramente quantas são as baixas do movimento islâmico Talibã e da rede Al Qaeda, mas conhecemos os nomes dos residentes que morreram nesses ataques”, disse Sadiqullah Shah, professor de 51 anos do Waziristão do Norte, uma das Fata. “Com exceção dos nomes mais célebres (de combatentes islâmicos), como Nek Mohammad Wazir, Baitullah Mehsud e Hakeemullah Mehsud, a população local não tem confirmação da morte de outros membros da Al Qaeda ou do Talibã”, destacou à IPS.

Após serem tirados do poder no Afeganistão em 2001, muitos talibãs foram para o Paquistão e estabeleceram bases no Waziristão. Essa região é hoje o principal cenário de ataques com drones. Mas nem todos estão convencidos de que esses aviões bombardeiam apenas objetivos terroristas. “Não há evidência de que os drones matem somente combatentes islâmicos. Conhecemos famílias civis que perderam seus membros nesses ataques aéreos”, disse à IPS o secretário de informação do partido Pakistan Tehreek Insaf (PTI), Sherin Mazari.

O PTI, cujo presidente é o jogador de críquete Imran Jan, garante que mais de 1.500 civis morreram nos ataques norte-americanos com drones. Esse partido, que governa a província de Jyber Pajtunjwa, implantou um bloqueio aos suprimentos que passam pelo norte do Paquistão destinados às forças da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) no Afeganistão, como forma de protesto contra os drones.

Mazari disse que Islamabad simplesmente aceitou o argumento de Washington de que os ataques são dirigidos contra integrantes do Talibã e da Al Qaeda, mas ainda não divulgou os nomes dos mortos. As Fata são administradas pelo governo federal, e, portanto, este tem de informar os nomes das vítimas, afirmou o secretário do PTI, que também é membro da Assembleia Nacional do Paquistão.

Mazari contou que, em 21 de novembro, um ataque com drone no distrito de Hangu, em Jyber Pajtunjwa, matou quatro estudantes de uma madrasa (escola islâmica). A província é vizinha às Fata. Residentes disseram que os mísseis disparados pelos aviões não tripulados colocam suas vidas em perigo. Rafiq Rehman, também professor no Waziristão do norte, contou que sua mãe morreu em outubro passado durante o ataque de um drone enquanto trabalhava no campo. Sua filha e seu filho ficaram feridos. “Fui aos Estados Unidos e testemunhei perante um comitê do Congresso sobre a morte da minha mãe”, contou.

Mohammad Ali, policial do subdistrito de Miramshah, no Waziristão do Norte, disse que os ataques estavam fazendo vítimas inocentes. “Os aviões não tripulados matam alguns combatentes islâmicos, mas a população local que vive perto de seus esconderijos sofre o impacto com frequência”, ressaltou.

No Paquistão não é incomum as agências da ordem mostrarem em público os cadáveres de criminosos mortos, mas não foi assim com os combatentes islâmicos que supostamente foram assassinados pelos drones. Cada vez que um avião não tripulado lança um ataque, a maioria dos meios de comunicação locais divulga notícias semelhantes.

“Publicamos qualquer notícia que nos passe o exército depois de cada ataque com drones. A área está cheia de combatentes islâmicos e há toque de recolher, assim é impossível ir à cena do ataque”, admitiu à IPS um jornalista local que pediu para não ter o nome divulgado. Portanto, a imprensa divulga informações sem poder verificá-las. Nenhum jornalista nem residente pode ver os supostos cadáveres dos terroristas.

Adnan Jan, de 21 anos, estudante de relações internacionais na Universidade de Peshawar, disse que é difícil saber quem ataca quem. “Temos que acreditar nas agências de inteligência quando dizem que algum líder da Al Qaeda morreu em um ataque com drones. Mas, como podemos acreditar que os mísseis atingem apenas combatentes e não inocentes?”, questionou.

Mohammad Sultan, comerciante em Miramshah, disse que a população local vive atemorizada diante de possíveis ataques norte-americanos. “Os combatentes islâmicos estão mudando todo o tempo de lugar por medo dos ataques com aviões não tripulados. Os drones matam os que estão fora do alcance do exército paquistanês no Waziristão”, disse à IPS. Acredita-se que os drones decolem da base aérea de Bagram, no Afeganistão. Envolverde/IPS