Nações Unidas, 21/6/2013 – O secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-moon, e a alta comissária para os Direitos Humanos, Navi Pillay, aconselharam “máxima moderação” após a divulgação pela imprensa de uma violenta ofensiva policial contra manifestantes pacíficos no Parque Gezi de Istambul. “O clima ainda é altamente combustível, é importante que as autoridades reconheçam que a resposta inicial aos protestos, extremamente severa e que causou muitos feridos, ainda é uma parte importante do problema”, afirmou Pillay em um comunicado divulgado no dia 18.
A Associação Médica turca registrou na semana passada quase 7.500 feridos relacionados com os protestos desde que começou a ocupação do Parque, no final de maio, e até agora seis pessoas morreram. Pillay pediu urgência ao governo turco para adotar “todas as medidas necessárias para garantir que as forças policiais não recorram ao uso excessivo da força. O objetivo deveria ser minimizar os danos e prejuízos, e respeitar e preservar a vida humana”.
Os protestos começaram como uma queixa pacífica pelo uso da terra no Parque Gezi – uma ilha de verde em meio ao concreto da Praça Taskim –, mas rapidamente se espalhou até se converter em um levante contra o governo em muitas cidades da Turquia. Uma das 50 manifestantes originais do Parque Gezi, que pediu para ser chamada apenas de Bengi, disse à IPS: “Fui parte do protesto desde seu início. Não me surpreende a violência policial, já que a Turquia tem uma tradição de violência, repressão e brutalidade policial”. Ela reconheceu que as tentativas da última década para aproximar-se da União Europeia levaram a uma redução da aberta hostilidade estatal, “assim, em certo sentido, esta reação poderia ser vista como algo estranho”.
Esperada ou não, a violência é extrema e atraiu a atenção dos meios de comunicação e os olhos das principais organizações de direitos humanos do mundo: Anistia Internacional e Human Rights Watch condenaram severamente as ações das forças de segurança contra manifestantes pacíficos. Bengi vê esta resposta violenta como resultado direto da “caprichosa” maneira de tomar decisões do primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan. “O primeiro-ministro mostrou uma efetiva falta de manejo da situação, e simplesmente quer demonstrar ao povo que o que ele diz é feito”, afirmou.
Muitos questionam a administração de Erdogan em relação à força policial desde que começaram os protestos, incluído o uso generalizado de gás contra a população. Dois manifestantes morreram devido às embalagens de gás. Abdullah Comert, de 22 anos, integrante ds juventude do opositor Partido Republicano Popular, morreu após ser atingido na cabeça por uma lata de gás em Hatay, perto da fronteira síria, no sul da Turquia, enquanto o trabalhador de limpeza Irfan Tuna perdeu a vida após ser submetido a um poderoso gás lacrimogêneo na Praça K?z?lai, em Ancara.
Em seu comunicado do dia 18, a alta comissária das Nações Unidas chamou especificamente a atenção para o uso dessas substâncias pelas forças policiais. É preciso investigar de modo efetivo, crível e transparente as informações de que foram lançadas latas de gás lacrimogêneo e de gás pimenta contra pessoas a uma distância próxima ou em espaços fechados, bem como o suposto mau uso das balas de borracha, ressaltou Pillay.
A Associação Médica Turca indicou que muitos dos feridos apresentaram desordens respiratórias causadas pelo gás lacrimogêneo, e danos no sistema musculoesquelético (ferimentos em tecidos moles, cortes, queimaduras e fraturas), que estão relacionados com a pouca distância da qual foram lançados os gases e disparadas as balas de borracha. Também informou que foi lançado gás lacrimogêneo dentro de uma clínica em Ancara.
Kimber Heinz, coordenadora da campanha Enfrentando o Gás Lacrimogêneo, liderada pela Liga de Resistência à Guerra, com sede nos Estados Unidos, disse à IPS que o gás convencional, o pimenta e outras armas químicas se tornaram ferramenta comum entre os governos opressores para sufocar levantes democráticos. “Em 2011, começamos a ouvir muitos chamados de lugares como o Egito a respeito de como a polícia estava usando gás para molestar pessoas e eliminar os movimentos de resistência popular”, acrescentou.
Muitas das embalagens de gás tinham gravado “Fabricado nos Estados Unidos”. Agora, “de Istambul, informa-se que as latas de gás produzidas por NonLethal Technologies, com sede em Homer, no Estado da Penssylvania, e Defense Technologies, localizada em Casper, no Wyoming, foram encontradas no Parque Gezi”, afirmou Heinz. A campanha ajudou a promover uma petição, redigida pelo advogado turco-norte-americano Kerem Gulay, que chama três congressistas norte-americanos a proporem uma legislação que impeça a exportação desse produtos para países que reprimem violentamente protestos pacíficos.
A petição cita o fato de que aproximadamente 150 mil latas de gás foram usadas em toda a Turquia entre 28 de maio e 16 de junho, e que, no mesmo período, 12 mil pessoas receberam cuidados médicos por sua exposição a múltiplas formas de gás lacrimogêneo. O senador Patrick Leahy, um dos congressistas que recebeu a petição, não estava disponível para dar declarações. Mas Bengi não acredita que a população turca se importe muito com essa iniciativa neste momento. “Neste exato momento, as pessoas tentam superar a comoção que o uso constante de gás lacrimogêneo causa. Sua raiva se centra totalmente no governo turco”, enfatizou. Envolverde/IPS