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ONU se apoia no Brasil para ajuda humanitária

Rio de Janeiro, Brasil, 9/4/2012 – Em sua primeira visita ao Brasil, a secretária-geral adjunta de Assuntos Humanitários da Organização das Nações Unidas (ONU), Valerie Amos, destacou a necessidade de o fórum aproveitar a experiência brasileira na resposta a desastres em áreas urbanas e inundações e na luta contra a pobreza. “O Brasil é conhecido por sua atuação no cenário internacional e, especialmente, na prevenção de desastres, por isso estou interessada em estreitar mais as relações da ONU com o Brasil e fazer um intercâmbio para apoiar ações em países como Haiti, nações africanas e no Oriente Médio”, disse Amos.

A funcionária, de origem britânica, também coordenadora do Socorro de Emergência, se encontrou no dia 2 com os ministros Antonio Patriota, das Relações Exteriores, Celso Amorim, da Defesa, e Fernando Bezerra, de Integração Nacional. Depois viajou para o Rio de Janeiro para conversar com outros funcionários e representantes do setor privado e de organizações não governamentais, para analisar como as ações humanitárias são articuladas.

A esse respeito, Conor Foley, consultor em ajuda e direitos humanos, ressaltou o papel do Brasil no mundo, ao afirmar que, como potência econômica em ascensão, conseguiu uma crescente influência nos debates internacionais e nos programas internacionais de assistência. Na África, por exemplo, há atualmente mais diplomatas brasileiros do que britânicos, indicou este especialista irlandês radicado em Brasília.

O Brasil triplicou sua ajuda financeira nos últimos sete anos, chegando a 65 países, disse Foley à IPS, acrescentando que o país também acumula uma experiência considerável no desenho de projetos de assistência humanitária e sabe lidar com inundações e outros desastres naturais, além de ter um quadro de médicos e especialistas em tratar ferimentos causados por armas de guerra.

Por sua vez, Williams Gonçalves, especialista em relações internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, disse que o Brasil tem know how para dar assistência humanitária em casos extremos, como demonstrou no Haiti. “O trabalho realizado pelos brasileiros nesse país do Caribe e na África chamou a atenção de todos, o que lhe dá as credenciais para realizar um bom trabalho de assistência humanitária desinteressada”, explicou à IPS.

Quanto à segurança alimentar, o Brasil apoia atualmente países africanos no desenvolvimento de sua agricultura e também em projetos para a redução da pobreza, com base em suas experiências domésticas como o Bolsa Família, implantado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2011). Foley observou que “as experiências internas do Brasil são a implantação em grande escala de programas para transferência de renda e nas últimas ações de pacificação de favelas no Rio de Janeiro, que também são um exemplo para o mundo”.

Nesse sentido, o governo brasileiro propôs, para fortalecer os mecanismos de ajuda humanitária internacional, a criação de uma ferramenta virtual, um software para administrar informações e conectar países que necessitam dessa assistência e para os doadores. Na V Reunião Regional sobre Mecanismos Internacionais de Assistência Humanitária, realizada no dia 30 de março, no Panamá, a representação brasileira propôs desenvolver este programa pela internet.

Esta iniciativa poderá contribuir para a gestão de grandes planos internacionais de emergência. O chefe para a América Latina e o Caribe do Escritório de Coordenação de Assuntos Humanitários da ONU (Ocha), Gerard Gómez, que acompanhou a delegação de Amos, confirmou que o Brasil tem um grande desenvolvimento na matéria. “A comunicação entre o que é preciso e o que se recebe é muito importante quando falamos de ajuda humanitária internacional”, ressaltou Gómez.

Para Gonçalves, essa iniciativa não constitui uma “mera sugestão”, mas uma contribuição concreta, considerando que “o Brasil se destaca desde o governo Lula como importante ator no campo da cooperação”, e que “diversos organismos do Estado atuam no exterior, o que significa que técnicos brasileiros acumularam experiência neste campo e estão aptos a propor novos métodos de ação e abordagem dos problemas em diversas áreas”.

No contexto da assistência humanitária que a ONU realiza, a Síria aparece como uma das prioridades. Sobre isto Amos afirmou que atualmente há cerca de um milhão de pessoas nesse país que esperam receber esse auxílio. “A situação está confusa. Estamos preocupados em garantir o tratamento médico à população e o apoio às crianças”, destacou.

O escritório da Ocha conta com a atuação de dez mil voluntários por meio da Cruz Vermelha, mas o grande desafio, segundo Amos, é “ser capaz de reunir mais pessoas para proporcionar ajuda e também dialogar com o governo da Síria o mais rápido possível”, enfatizou. Os especialistas ouvidos pela IPS coincidiram em afirmar que o Brasil pode ter um papel importante nesta crise síria para uma solução pacífica.

Gonçalves analisou o fato de o Brasil defender o respeito à soberania dos Estados e uma solução de paz para as controvérsias. “O Brasil tem bons antecedentes de participação em missões de paz da ONU, o que lhe dá credibilidade para suas manifestações a favor de um diálogo entre as partes em conflito e mostrar que é capaz de obter consensos”, acrescentou.

O acadêmico carioca recordou que o “Brasil já atua neste cenário junto a Índia e África do Sul, implantando importantes programas de ajuda humanitária”. Também disse que, “como não tem um passado socialista, não é uma potência militar com ambições expansionistas e tem uma tradição cultural de inclusão e tolerância religiosa, o país mantém uma imagem positiva na região”.

Precisamente por essa história é que Foley também concorda que o Brasil, embora não tenha um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, poderia desenvolver esforços diplomáticos para levar mais coerência às intervenções humanitárias na Síria, bem como em qualquer outra parte do mundo. Envolverde/IPS