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Os Brics investem em prioridades nacionais

Chris Hart, estrategista principal da gestora de ativos Investment Solutions. Foto: John Fraser/IPS

Johannesburgo, África do Sul, 23/1/2013 – As prioridades nacionais estariam determinando mais as decisões de negócios no grupo Brics do que as perspectivas de criar um grande mercado com essa aliança, formada por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Foi o que afirmou em entrevista à IPS o economista Chris Hart, principal estrategista da gestora de ativos Investment Solutions, após visitas ao Brasil e à Índia.

Hart, junto ao chefe de investimentos da mesma companhia, Glen Silverman, planeja também viajar à China e à Rússia para avaliar em primeira mão as possibilidades da África do Sul dentro deste grupo de economias emergentes. Os especialistas também preveem reunir informação sobre quais são os principais motores de investimento entre os membros do Brics.

IPS: O que tenta conseguir com essas visitas?

CHRIS HART: Estamos procurando entender o cenário de investimentos no mercado emergente, bem como a relevância do Brics nos investimentos mundiais. As condições de investimentos em cada um dos países do grupo devem ser compreendidas claramente, e queremos ver o que podemos aprender que seja relevante para a África do Sul. Não se pode ter uma visão completa a partir de uma pesquisa feita de dentro do escritório, por isso nosso ponto de partida é explorar as condições no terreno. Não pretendo que uma simples visita nos dê uma completa visão de um país, mas que lance uma luz. Conversamos com líderes de negócios, com algumas empresas específicas, com economistas, estrategistas em investimentos e analistas sociais. Em nossa viagem à Índia também nos encontramos com acadêmicos e políticos, e temos planos de falar com geoestrategistas em nossas visitas à China e à Rússia. Além disso, queremos ver as condições no terreno por meio de visitas a bairros específicos, pois não desejamos ter uma visão dourada da realidade. Pretendemos ir à China em maio e à Rússia um ano depois.

IPS: O que fazem com a informação recolhida?

CH: Assessoramos e retroalimentamos nossos estudos sobre como destinar os ativos. Também compartilhamos nossas conclusões em apresentações formais aos nossos clientes e à comunidade de gestores de ativos na África do Sul.

IPS: O que descobriu sobre a atitude do setor empresarial em relação ao grupo Brics?

CH: Se você pergunta a uma companhia brasileira, a resposta é que é absolutamente irrelevante. No Brasil, o idioma é um grande tema. É uma economia autossuficiente. É um enorme Estado. Quem vive ali tem poucas razões para falar outro idioma que não seja o português. A empresa média brasileira ainda não tem plena presença em todo o país, por isso toda a atenção está voltada para dentro. É um país muito introspectivo. Além disso, é muito difícil para empresas de fora competirem no Brasil, porque, pelo idioma e pelas complexidades legislativas, há muitas barreiras.

IPS: O que acontece com a Índia?

CH: A política da Índia é a de se afastar dos bancos de desenvolvimento, que lá não são efetivos. É semelhante ao Brasil, com poucas empresas tendo presença em todo o território. As companhias brasileiras se manterão por muito tempo com um enfoque para dentro, mas na Índia as empresas são bastante abertas e acessíveis às oportunidades internacionais. Vão aonde puderem cravar sua fortaleza corporativa e, nesse sentido, têm maior senso empresarial. São mais conscientes globalmente do que as brasileiras. Contudo, quando as companhias apontam para as oportunidades globais, o Brics não é relevante. Não estão tentando seguir um caminho político. As empresas indianas não procuram entrar no Brasil devido ao Brics. Preferem ir para Quênia ou Gana, ou mesmo Grã-Bretanha. Ao contrário das empresas brasileiras, as da Índia são conglomerados diversificados, e aproveitam cada negócio quando há oportunidade.

IPS: Você fala do conceito de “cicatriz nacional”. A que isto se refere e o quanto é relevante para o Brics?

CH: Na África do Sul, o apartheid é nossa cicatriz, e a reparação do apartheid se torna algo relevante. A cicatriz nacional do Brasil é a inflação, de uma forma semelhante à experiência alemã. É um temor desde a hiperinflação registrada no final dos anos 1980 e começo da década de 1990. Na Índia, a situação é mais complexa. A cicatriz de um empresário é a burocracia e a corrupção. Entretanto, os funcionários públicos mais velhos dizem que, na realidade, é o colonialismo, ao qual atribuem a corrupção. Os acadêmicos citarão a pobreza e a desigualdade. As cicatrizes nacionais distorcem as melhores práticas e têm impacto na política. Podem ser os mais fortes desencorajadores de envolvimento no Brics do que qualquer outra consideração política. Envolverde/IPS