País não incentiva o uso sustentável da biodiversidade

O evidente valor da biodiversidade para o bem-estar humano, assim como as vantagens comparativas do Brasil para o desenvolvimento sustentável, não são acompanhados de mecanismos de incentivo ao uso dessa biodiversidade no país. A análise foi feita pelo diretor de Assuntos Coorporativos e Relações Governamentais da Natura e líder do Movimento Empresarial pela Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade (MEB), Rodolfo Witzig Gutilla, na Conferência Ethos 2011,  em São Paulo.

Em painel dedicado ao tema Biodiversidade, Gutilla debateu com representantes de empresas, sociedade civil e governo, o contexto das políticas públicas e da implementação no Brasil dos objetivos e metas para 2020 do Plano Estratégico de Conservação da Biodiversidade. O painel contou com a participação de Bráulio Ferreira de Souza Dias, secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Cláudio Carrera Maretti, líder da Iniciativa Amazônica do WWF, Helena Pavese, gerente de política ambiental da Conservação Internacional (CI-Brasil), Manoel Silva Cunha, presidente do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), e moderação de José Luciano Duarte Penido, presidente do Conselho Deliberativo da Associação Brasileira de Celulose e Papel (Bracelpa).

Cinco dias após o encontro de líderes empresariais de todo o país com representantes do governo no Diálogos sobre Biodiversidade: construindo a estratégia brasileira para 2020, em Brasília, o painel da Conferência Ethos consolidou a visão da importância de metas nacionais e dos compromissos que o setor privado deve assumir frente ao tema. Entre as metas para uma nova economia escolhidas pelos empresários estiveram a necessidade de incluir o valor da biodiversidade em planos de desenvolvimento e nas contas públicas nacionais, de eliminar incentivos lesivos e implementar positivos, além de reduzir pela metade ou eliminar a conversão dos ecossistemas até 2020.

“O MEB nasceu para sensibilizar o governo brasileiro em relação às metas de Aichi, acordadas em 2010 em Nagoya (Japão), as quais devem ser ‘tropicalizadas’, ou seja, adaptadas à nossa realidade, em amplo debate com a sociedade”, afirmou Gutilla. Ele criticou a atual Medida Provisória (MP) 2186-16/01 de acesso ao patrimônio genético, comentando sobre a dificuldade de inovação e uso da biodiversidade diante de um marco regulatório tão complexo. “Enquanto se estima haver 1,8 milhão de espécies no Brasil, o Conselho de Gestão do Patrimônio Genético liberou somente 25 autorizações de acesso em 2010. Nesse ritmo, levaríamos 72 mil anos para conhecer e fazer o uso sustentável dessa riqueza”.

Responsável pela compra direta de produtos da biodiversidade de até 2 mil famílias de comunidades locais e tradicionais, a Natura, vem investindo na construção de valores socioambientais junto aos consumidores finais, além de apostar na conservação da biodiversidade como oportunidade de negócio e distribuição de riqueza.
Para Manoel Silva Cunha, do CNS e morador da Resex Médio Juruá, a manutenção da biodiversidade é marcante entre os povos da floresta, conforme dependem dos recursos naturais para sua sobrevivência, e daí a importância de políticas públicas voltadas “aos 80% do território amazônicos protegidos pelo Código Florestal, e não aos 20% desmatados para atividades econômicas convencionais”. Cunha ressaltou ainda que atividades conservadoras da floresta mereceriam maior valor na economia e nas políticas públicas.

A relação entre negócios e biodiversidade vem sendo internalizada pelas empresas, na opinião de Helena Pavese, da CI-Brasil, que colocou a preocupação com as perdas de biodiversidade por 53% dos CEOs de grandes empresas, conforme estudo da consultoria McKinsey. “Mas essas organizações devem trabalhar no sentido de identificar seus impactos, gerenciar riscos e abraçar as oportunidades em conjunto com outros setores”, expôs Helena. Ela revelou que empresas como a Coca-Cola já se comprometem a retornar à natureza a quantidade de água equivalente àquela usada em suas bebidas, ou que a Danone visa alcançar a neutralização do carbono embutido na maioria de seus produtos até final de 2011.

Para o secretário do MMA, Bráulio Dias, a sociedade ainda não possui consciência da gravidade do processo de colapso da biodiversidade, como a perda de florestas, do solo, dos recursos pesqueiros ou da oferta de água. “E somos o ‘G1’ da biodiversidade, mas estamos dilapidando esse potencial ao invés de darmos centralidade ao tema, com incentivos econômicos corretos. As metas de Aichi são um importante referencial para o futuro, mas devem ser internalizadas por todos”, finalizou.

* Publicado originalmente pelo  MEB – Movimento Empresarial para a Biodiversidade e retirado do site CarbonoBrasil.