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Paraguai espera retornar ao Mercosul e mira o Pacífico

Assunção, Paraguai, 10/5/2013 – O retorno ao Mercosul e à Unasul são os objetivos urgentes do próximo governo do Paraguai, dentro de uma agenda internacional que também tem como prioridades uma nova projeção para o Oceano Pacífico e a consolidação de mercados para seus principais produtos.

“Primeiro temos que resolver nossos assuntos entre vizinhos, deste bairro não podemos nos mudar”, afirmou o presidente eleito, o direitista Horacio Cartes, em referência à suspensão do Paraguai do Mercosul (Mercado Comum do Sul) e da Unasul (União de Nações Sul-Americanas), devido à destituição do ex-presidente Fernando Lugo, em junho de 2012.

“Sair do Mercosul seria uma bobagem”, disse Cartes. Argentina, Brasil e Uruguai, os outros membros fundadores, decidiram afastar o Paraguai do grupo, por considerarem que neste país foi rompido o fio institucional na substituição parlamentar de Lugo pelo até então vice-presidente, Federico Franco. Porém, Cartes destacou que não participará da próxima cúpula do bloco, no dia 28 de junho em Montevidéu, um mês e meio antes de sua posse na Presidência, em 15 de agosto.

Em entrevista ao jornal chileno El Mercurio, seu primeiro pronunciamento sobre política externa, Cartes disse que os esforços para normalizar seus vínculos com os vizinhos sul-americanos se combinarão com outros objetivos estratégicos de sua diplomacia para a América Latina. “O Pacífico é muito importante, por isso faremos o possível para aprofundar e estreitar essa relação”, afirmou o presidente eleito, com quem o Partido Colorado voltará ao poder, que controlou desde a metade do século 20 até a chegada de Lugo, em 2008.

Também adiantou uma aproximação com a Aliança do Pacífico, integrada por Chile, Colômbia, México e Peru, da qual elogiou a flexibilidade, o potencial e como aproveita sua experiência e suas ligações dentro do fórum Cooperação Ásia Pacífico (Apec). “O Paraguai deve se relacionar muito bem com o mundo. Os vizinhos, certamente, mas também como nossos irmãos latino-americanos e ainda com a Ásia”, disse Cartes. Este país já tem vínculos comerciais importantes com membros asiáticos da Apec.

Cartes também colocou a Europa entre seus objetivos prioritários, junto com o aumento de suas exportações para fora do continente, como as de carne para a Rússia, seu maior comprador, e os países árabes. No entanto, o primeiro grande caso em que o presidente eleito medirá sua capacidade diplomática será o da crise paraguaia com o Mercosul, cuja solução implica a aceitação da Venezuela como membro pleno do bloco. Este ingresso foi oficializado na cúpula do bloco de julho de 2012, depois da suspensão do Paraguai, cujo parlamento vetava até então a adesão plena de Caracas.

“Temos uma postura clara de apoiar a entrada da Venezuela, que o Congresso ratifique esta situação”, disse à IPS o deputado, reeleito, Ricardo Canese, da Frente Guasú, liderada por Lugo. O representante da coalizão de grupos de centro-esquerda e esquerda, que será a terceira força no Congresso bicameral que iniciará sua legislatura em 1º de julho, disse que esse é um dos 17 pontos da agenda parlamentar da Frente, junto com a “imediata reinserção do Paraguai em todos os espaços de integração” dos quais foi suspenso.

O especialista em política José Carlos Lezcano disse à IPS que os colorados acabarão apoiando a entrada da Venezuela no Mercosul. Recordou que foi um de seus governos que assinou em 2005 o protocolo de adesão do país caribenho e que Cartes “necessita do reconhecimento da região” e este depende “totalmente” do Brasil, o que “não deixa muita margem de ação sobre o tema”. Segundo Lezcano, a oposição da direita à entrada venezuelana no bloco foi uma arma para desgastar o governo de Lugo e que agora que os colorados retornam ao poder convém apoiar a ratificação e obrigar a esquerda a apoiá-la neste assunto.

O senador colorado Hugo Estigarribia, que integrou a anterior Comissão de Relações Exteriores legislativa, disse que essa opção está sobre a mesa. E acrescentou que poderia ser discutida “a eliminação do protocolo de Usuahia e sua cláusula política” sobre o compromisso democrático do bloco, para “devolver-lhe sua natureza mais comercial”. Deveria ser analisado se o Paraguai “permanece como membro pleno do Mercosul ou se o faz como Estado associado”, ressaltou.

Informações não confirmadas oficialmente asseguram que a ratificação paraguaia da Venezuela como membro pleno do Mercosul é uma exigência do Brasil para o retorno de Assunção ao bloco, que estaria unida ao reingresso à Unasul, que reúne os 12 países sul-americanos. Tovar da Silva Nunes, porta-voz da chancelaria brasileira, adiantou que Brasília considera que o retorno do Paraguai aos dois grupos “não será automático”, uma vez que o novo governo assuma. Mas não detalhou as eventuais condições para superar a crise.

Paradoxalmente, é de Caracas que chegam abertas declarações a favor de normalizar os vínculos com Cartes. “Necessitamos do Paraguai no Mercosul e na Unasul porque faz falta, porque são nossos irmãos”, disse o presidente venezuelano Nicolás Maduro após as eleições de 21 de abril. Em Assunção, os empresários também pressionam pela ratificação da Venezuela como sócio do Mercosul, muito interessados no reinício de suas exportações de carne e de soja para o país caribenho.

“Não podem impedir que venham investimentos, que venham indústrias dar trabalho”, disse Cartes, ele mesmo um milionário empresário, aos senadores que eventualmente pretendam criar obstáculo à ratificação da Venezuela. Ao contrário do que aconteceu a Lugo, Cartes contará com maioria absoluta na Câmara de Deputados e uma maioria relativa no Senado para solucionar a crise com o Mercosul e a Unasul e para avançar no resto de sua agenda internacional.

No novo parlamento o Partido Colorado terá 47 das 80 cadeiras da Câmara e 19 dos 45 senadores. A segunda força parlamentar fica com o também direitista Partido Nacional. Os analistas recordam que os legisladores colorados nem sempre atuam em bloco e que sua bancada chegou a ter até três divisões. Contudo, preveem que Cartes os convencerá da importância da ratificação e os votos que faltam serão dados pela Frente Guasú e outro grupo minoritário.

O domínio legislativo colorado, afirmam os analistas, também facilitará para o próximo governo o avanço em outro projeto que os empresários paraguaios apoiam com toda força: a assinatura de um tratado de livre comércio com o México, que lhe dê preferências à sua entrada na segunda economia latino-americana. Envolverde/IPS