Havana, Cuba, 4/7/2013 – Enquanto dois julgamentos contra empresários estrangeiros transcorreram em meio a extrema discrição, o governo cubano acrescentou novas disposições para combater a corrupção, o que parece indicar que o presidente Raúl Castro quer evitar pontas soltas neste espinhoso problema. Castro, que está no segundo quinquênio de seu último mandato presidencial, disse que “a questão das indisciplinas e ilegalidades será tratada em profundidade” na reunião do parlamento prevista para o dia 6. Também afirmou em mais de uma ocasião que estas manifestações atentam contra a base do sistema social.
Participantes da seção interativa Café 108 do site do escritório da IPS em Cuba se mostraram céticos quanto a resultados de curto prazo na ofensiva oficial contra a corrupção, que qualificaram de “filha da crise” e fenômeno “presente na vida cotidiana do cubano”. É “lacerante para o país, mau exemplo para as próximas gerações, tolerada, pouco publicada na imprensa, nada criticada pela população, permissível na família, modo de vida para resolver na casa, caldo de cultivo do inimigo”, disse um participante que assina Naue, recordando o ocorrido com o ensaísta Esteban Morales por seus artigos sobre o assunto.
Durante cerca de um ano, entre 2010 e 2011, Morales esteve afastado das fileiras do Partido Comunista de Cuba após escrever sobre a envergadura do problema, que a seu ver é muito mais perigoso do “que a chamada dissidência interna”. Em recente entrevista que circula na internet, Morales considera que há luta contra o problema, mas ainda é insuficiente. Em sua opinião, deve-se apelar muito mais para a participação popular. “É preciso inovar nos métodos para combater a corrupção, porque nenhum dos utilizados até agora serve para acabar com o problema. E penso que a inovação pode estar em organizar as massas, não os burocratas, para este combate”, acrescentou em rápida declaração à IPS.
Embora outros analistas coincidam que só as medidas judiciais não são suficientes para enfrentar este delicado assunto, as mudanças e medidas nessa matéria fazem parte de um esforço maior em favor da institucionalização do país empreendida por Raúl Castro, que começou a criar a Controladoria Geral da República em 2009. O Banco Central de Cuba colocou em vigor em junho várias normas gerais para detectar e prevenir o movimento de capitais ilícitos, a lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo, e introduziu modificações no Código Penal e na lei de procedimento. Estas disposições vieram após a criação, em março, de um órgão estatal de controle para “frear e liquidar a corrupção administrativa”.
Em princípio, economistas ouvidos pela IPS descartaram que as regulações bancárias possam desestimular os investimentos estrangeiros. Porém, um executivo latino-americano com negócios em Cuba considerou que as operações com clientes estrangeiros ficarão mais complexas pela maior quantidade de informação que deverá ser solicitada pelos bancos cubanos, também obrigados a buscar mecanismos de comprovação. No entanto, esta fonte, vinculada ao setor bancário, disse que em seu caso não há novidades, porque são normas adotadas há tempo em seu país.
De maneira coincidente, o acadêmico e especialista em temas financeiros Pável Vidal disse à IPS que as regulamentações “estão de acordo com os novos tempos”. “Os bancos, em nível internacional, tendem a ter cada vez mais cuidado e controle em todo tipo de transação”, afirmou Vidal. Entre outras medidas, as instituições financeiras deverão conferir a identidade do cliente com dados e informação confiável de fontes independentes, dar seguimento contínuo à relação comercial e não permitir a “abertura de contas cifradas ou numeradas”.
Em outra decisão deste ano, o Conselho de Estado presidido por Castro divulgou em março sua decisão de criar a Comissão Estatal de Controle, cuja principal missão será “a apresentação, análise e estudo de casos significativos nos quais se manifestem ilegalidades, supostos fatos delitivos e de corrupção”. Este novo organismo encarregado de “intensificar o estudo das causas e condições que determinam os fatos de corrupção”, bem como de “frear e liquidar” estes fenômenos, substitui e confere status de órgão de Estado a uma comissão governamental que, com os mesmos fins, existia desde 2008 como órgão assessor do governo.
A presidência da comissão ficou com Gladys Bejerano, titular da Controladoria Geral desde que esta foi criada para, entre outras tarefas, elevar o controle interno e “o enfrentamento direto a qualquer manifestação de corrupção”. Desde então, Bejerano ganhou fama de “dura” pelo rigor com que exerce suas funções. No contexto do que meios oficiais definem como “aperfeiçoamento do sistema de justiça penal de Cuba”, em outubro entrarão em vigor várias modificações do Código Penal e da Lei de Procedimento Penal, para atualizar as disposições legais vigentes e sintonizá-las com as transformações que ocorrem na vida socioeconômica do país.
Por outro lado, mediante acordo divulgado no dia 29 de maio, o Tribunal Supremo Popular (TSP) instruiu para “particular atenção” aos casos com “acusados estrangeiros ou em situação migratória permanente em outro país”, garantir aos primeiros a assistência consular “como requisito essencial” de sua defesa e abster-se de julgá-los sem realizar os trâmites diplomáticos pertinentes. Em maio também aconteceram dois julgamentos, em separado, contra empresários estrangeiros sob acusações vinculadas à corrupção.
Nem os julgamentos, realizados a portas fechadas em tribunais de Havana, nem as sentenças tiveram espaço na imprensa estatal cubana. Tampouco houve informação oficial sobre o tema, cujos detalhes se conheceu por meio da imprensa internacional. Segundo essas fontes, o empresário canadense Sarkis Yacoubian, de origem armênia e dono da empresa de importação TriStar Caribbean, e o cidadão libanês Krikor Bayassalian, foram condenados nos últimos dias de junho a nove e quatro anos de prisão, respectivamente.
No entanto, Amado Fakhle, e Stephen Purvis, executivos da empresa britânica de investimento Coral Capital Group Ltd., declarados culpados de acusações menores, foram libertados devido ao tempo que ficaram presos após serem detidos em 2011, segundo meios diplomáticos citados pela imprensa internacional. Entre 2011 e 2012, numerosos cidadãos cubanos, um empresário de nacionalidade francesa e dois chilenos (julgados à revelia) foram condenados em Havana por acusações ligadas à corrupção. Envolverde/IPS