Pensemos o próximo

É mais do que comum, chega a ser entediante, ler, ouvir, ver as previsões para o próximo ano. No que diz respeito à economia, então, a maioria dos jornalistas praticamente transformam os economistas em astrólogos, futurólogos ou algo que o valha, tentando desvendar o que acontecerá com o dólar, quanto crescerá a economia, etc.

Atualizado em 03/01/2012 às 11:01, por Ana Maria.

É mais do que comum, chega a ser entediante, ler, ouvir, ver as previsões para o próximo ano. No que diz respeito à economia, então, a maioria dos jornalistas praticamente transformam os economistas em astrólogos, futurólogos ou algo que o valha, tentando desvendar o que acontecerá com o dólar, quanto crescerá a economia, etc. Com a chegada do fim de cada ano, observa-se que todos erraram. Por quê?

Por uma razão muito simples: encaram a economia como uma ciência exata, desenvolvem um modelinho econométrico e, ao manter a temperatura e pressão constantes, desvendam como será o futuro do mundo. Acontece que, nesses modelos não cabem movimentos sociais e políticos com a Primavera Árabe ou o Ocupe Wall Street, e muito menos os rechonchudos bônus do mercado financeiro. Portanto, os modelinhos estão falidos. Neste sentido, o máximo que nós, economistas, podemos observar ou comentar são somente tendências.

A tendência mundial é de crise. Entretanto, não quer dizer que a economia brasileira passará pela mesma agrura, mas também não estará imune às oscilações globais; se o governo federal sabendo ponderar as políticas fiscal e monetária, conseguiremos enfrentar a tormenta com altivez.

Se a tendência é essa, qual então o próximo passo? Primeiro, não podemos nos iludir se somos ou não a sexta ou a sétima economia mundial. É preciso pensarmos, sim, na qualidade desse crescimento. Diferentemente do milagre econômico, agora estamos crescendo com distribuição de renda e riqueza, haja vista, os aumentos reais e consecutivos do salário mínimo, do Bolsa Família, do Minha Casa Minha Vida, etc. Mas ainda são muito tímidos e limitadores em um futuro não muito distante. Nunca é demais lembrar: a estrutura da política econômica adotada nos últimos 17 anos é a mesma.

É verdade que a exploração da camada de pré-sal poderá mudar a realidade da economia brasileira, entretanto, ainda não está devidamente claro qual caminho percorremos, se é da utilização desmesurada da abundância de divisas e, por sua vez, a dependência da renda petroleira, ou se será a construção da cidadania e do futuro com educação, saúde, tecnologia, ampliação e fomentos a pesquisa e desenvolvimento, principalmente para o setor industrial brasileiro.

Se quisermos dar o próximo passo, precisamos ampliar a democracia no Estado brasileiro em todas as esferas, construindo a participação popular com a democratização de seus orçamentos. É mais do que necessário vontade política, não somente de quem governa, mas principalmente de quem se beneficia do Estado, ou seja, trabalhadores(as), aposentados(as), estudantes, empresários(as), etc. Após pouco mais de 20 anos de ditadura militar e mais outros vinte e tantos de redemocratização e democracia política, estaríamos preparados para desempenhar esta tarefa?

A julgar pela “nova classe média”, muito dificilmente, pois é extremamente difícil e complicado discutir política, economia e sociedade com indivíduos que trabalham de dez a 14 horas por dia, tem dois ou mais empregos, na maioria das vezes, sem sindicatos que os defendam ou não sindicalizados, estudam à noite enquanto trabalham durante o dia, vivem para trabalhar e para consumir um pouco daquilo que não podiam antes.

Por isso, é importante sermos capazes de construir novas condições macroeconômicas, particularmente no que diz respeito a câmbio, juros e uma autêntica política industrial e tecnológica. Estamos diante de uma rara oportunidade histórica para implementar um novo padrão de desenvolvimento nucleado pela retomada da industrialização nos marcos da terceira revolução industrial e ambiental, acompanhado de avanços equivalentes nos serviços produtivos.

Ao mesmo tempo, é mais do que urgente a reestruturação dos serviços públicos de educação, saúde, saneamento, habitação, transporte coletivo, segurança pública entre outros. E é o Estado que tem a responsabilidade de prover estes serviços e equipamentos.

Além do que, avançar na reforma agrária e no desenvolvimento da agricultura familiar, uma vez que grande parte dos miseráveis encontra-se no campo. Só assim será possível a elevação significativa dos rendimentos que resultará na pretendida melhora da estrutura social.

Por fim, é necessário destacar que elevar as condições de consumo e renda significa, também, apropriar-se de conhecimentos e desenvolver potencialidades que habilitam o(a) cidadão(ã) a entrar em outro universo simbólico e de valores, pois pode ser que, a partir daí, o futuro econômico e político do Brasil contemporâneo venha a sinalizar o seu conservadorismo ou o seu progresso.

* Publicado originalmente no site da Carta Capital.


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