Rio de Janeiro, Brasil, 3/7/2012 – Vedados os acordos globais e ambiciosos na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), iniciativas locais dão frutos, como o investimento em projetos de conservação da Amazônia brasileira. O plano para investir US$ 50 milhões durante cinco anos nessa selva tropical é resultado de um acordo de cooperação técnica e financeira entre o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a Fundação Banco do Brasil.
Apenas neste ano seriam desembolsados US$ 12 milhões para ações de conservação e uso sustentável do bioma brasileiro. Dessa quantia, US$ 7,2 milhões correspondem a uma contrapartida do BNDES, por meio do Fundo da Amazônia, criado em 2008, e os restantes US$ 4,8 milhões serão entregues pela Fundação. Trata-se de fomentar o desenvolvimento de cadeias produtivas e tecnologias sociais para comunidades de baixa renda, como populações tradicionais, camponeses assentados pela reforma agrária e agricultores familiares, disse à IPS o gerente de economia solidária da Área de Agropecuária e Inclusão Social do BNDES, Eduardo Lins.
“O BNDES será responsável por 60% dos fundos não reembolsáveis. Não cremos tratar-se de dinheiro perdido, pois haverá um retorno sob a forma de geração de renda para os beneficiários finais, e é uma forma de alavancar os projetos”, afirmou Lins. Nesta etapa estão sendo identificadas as iniciativas que poderiam se beneficiar em diferentes setores, como produção de frutos amazônicos (açaí, cupuaçu, banana, cacau, guaraná e maracujá), castanhas, mandioca, óleos e essências, ou de apicultura, piscicultura, pesca artesanal e agroecologia.
Segundo Lins, o desafio é conseguir uma distribuição equitativa dos fundos nos nove Estados da Amazônia Legal, uma delimitação política que inclui todos os distritos ocupados total ou parcialmente por esse bioma tropical. “O limite é que nenhum Estado receba mais que 30% dos recursos. Colocamos fundos somente em projetos sustentáveis e que possam andar com seus próprios pés. Esta é a lógica. Também prevemos assistência técnica”, explicou Lins.
O gerente do BNDES estima que, após cinco anos, US$ 50 milhões bastarão para apoiar centenas de iniciativas esparramadas pela região amazônica. O Fundo Amazônia, que capta recursos procedentes de doações, destina-se a financiamentos não reembolsáveis de ações que contribuam para frear o desmatamento da selva e promover a conservação e o uso sustentável.
O desafio é garantir a segurança alimentar de povos que habitam a selva e dela dependem para sua subsistência. Também estão entre suas metas o acesso a água potável, geração de energia renovável, recuperação de áreas degradadas e uso do solo em sistemas agroflorestais. O fundo também busca incentivar medidas de reflorestamento, certificação e recuperação de áreas desmatadas. Desde o primeiro acordo de cooperação, assinado em 2009, o BNDES e a Fundação Banco do Brasil desembolsaram cerca de US$ 40 milhões.
Os indígenas kayapós, que habitam as terras Kayapó, Menkragnoti, Baú, Bandjakôre e Capoto-Jarina, no sul do Pará e norte de Mato Grosso, aspiram recursos para financiar atividades econômicas baseadas em bens e serviços que a selva presta. O povo kayapó está assentado em área de 10,6 milhões de hectares, em contínua ameaça pelo avanço da fronteira agrícola e por atividades como corte ilegal de madeira. As cinco terras indígenas equivalem a 3% da Amazônia brasileira. Cerca de sete mil indígenas vivem nessa região situada no chamado “arco do desmatamento”, na bacia do Rio Xingu, onde se concentram quase 80% da perda de selva amazônica.
Com apoio da organização Conservação Internacional e do Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio), os indígenas criaram, em novembro de 2011, o Fundo Kayapó, recentemente escolhido para receber US$ 8,6 milhões do BNDES. Trata-se de um mecanismo operacional e financeiro de longa duração para apoiar associações e cooperativas dos próprios nativos que se dediquem a atividades sustentáveis e produtivas, prevenção do desmatamento, proteção da biodiversidade e de suas terras, explicou à IPS o gestor de programas do Funbio, Fabio Leite, economista, que trabalhou ativamente na criação do Fundo Kayapó.
“Estamos trabalhando há três anos para criar este mecanismo com fundos ambientais. aplicamos um conceito inédito no Brasil, que em inglês é endowment, e empregamos os recursos do mercado financeiro com um estilo conservador”, explicou Leite. É um fundo patrimonial do qual são usados apenas os juros para financiar as atividades, e é o primeiro instrumento de financiamento de longo prazo para grupos indígenas da Amazônia que o BNDES apoia.
A primeira fase começou com o desembolso de quase US$ 3,6 milhões no prazo de dois meses encerrado no dia 2. “Busca-se sustentabilidade. A meta é conseguir qualidade de vida, financiar projetos de educação, saúde e que gerem renda”, destacou Leite. Em cinco anos espera-se reunir mais de US$ 10 milhões, “valor suficiente para obter os recursos que necessitam os projetos dos kayapós”, acrescentou. Com essa quantia será possível investir em cinco iniciativas indígenas por ano.
Em suas terras há abundância de açaí, castanhas, fibras e madeiras como copaíba (que fornece bálsamo, ou óleo) e andiroba. Trata-se de “uma gama de produtos florestais que podem ser explorados de forma sustentável, com sempre fizeram. Se os kayapós não habitassem essas terras, ali não haveria mais floresta”, detalhou Leite. O Fundo Kayapó também sai em busca de potenciais doadores, como empresas e os governos de Alemanha, Grã-Bretanha, Itália e Noruega, que têm uma história de investimentos em projetos de conservação.
“Contamos com um mecanismo de acompanhamento com cronograma, metas e fiscalização da execução dos recursos, além de prestação de contas dos projetos financiados, que são visitados ao menos uma vez por ano”, explicou o coordenador do Funbio, que espera ampliar esta iniciativa para outros povos nativos. Envolverde/IPS