Quito, Equador, 20/5/2011 – Os recursos petrolíferos e minerais, abundantes em vários países da América Latina, não durarão para sempre, e por isto devem servir para uma transição para uma economia mais diversificada. A advertência foi feita por María del Carmen Pantoja, encarregada do “Extraindo Transparência”, programa que promove a informação e o bom uso do dinheiro proporcionado pelos recursos naturais não renováveis, criado pelo Grupo Faro, do Equador, que busca a participação do Estado, da sociedade civil e da empresa privada.
A maior transparência deve se dar nos pagamentos feitos pelas multinacionais ao Estado e no que é feito com esse dinheiro, disse María del Carmen à IPS. “No Equador, o petróleo tem sido a principal fonte de renda do fisco durante quatro décadas, e estamos prestes a começar uma nova fase com a mineração em grande escala”, acrescentou.
“A América Latina é a segunda região do mundo em reservas de petróleo, e vários países da área dependem em grande parte da exploração desse recurso”, disse à IPS o principal economista do Revenue Watch Institute (RWI), Akram Esanov. “O petróleo representa 50% da entrada de divisas do governo na Venezuela, 57% em Trinidad e Tobago e quase 40% no México”, disse Esanov, do Uzbequistão.
“As mais recentes descobertas no litoral do Brasil pode colocar o país entre aqueles com mais reservas de petróleo no mundo. “Daí a transparência no manejo dos recursos ser essencial para garantir que a renda que proporcionam seja usada com eficiência para o desenvolvimento de nossos países”, acrescentou. E as organizações da sociedade civil tentam por diferentes caminhos incidir nesse processo.
No Peru, país que é um dos maiores produtores na área da mineração do mundo, a Proposta Cidadã prega a prestação de contas mediante relatórios periódicos e vigilância sobre a produção petrolífera e mineradora, a renda gerada por essas atividades e o uso governamental desse dinheiro nos planos nacional, regional e local, disse à IPS Epifanio Rivas. Esta organização também trabalha com líderes locais. “Em dez dos 25 departamentos do Peru, há atividades extrativistas”, acrescentou, por isto é importante que os dirigentes locais conheçam seus direitos de participação na renda e tracem planos para seu uso mais eficiente.
A Proposta Cidadã realiza também incidência política, mediante propostas de leis ou mecanismos tributários, como um imposto sobre lucro extraordinário obtido pelas empresas em razão do alto preço que o petróleo e os minerais estão obtendo no mercado internacional. Para fomentar o debate regional e trocar experiências, o Grupo Faro realizou a Semana da Transparência da Informação nas Indústrias Extrativistas, que reuniu especialistas latino-americanos e de outras regiões entre 10 e 13 deste mês.
O RWI nasceu como organização independente em 2006, como uma projeção de um programa de monitoramento do dinheiro recebido pelas indústrias extrativistas na Ásia Central. Esse programa, financiado pela Open Society Foundations, do milionário George Soros, “evoluiu para um organismo que hoje tem escritórios na América Latina, África, Ásia Central, sudeste asiático, Nova York e Londres”, disse Esanov.
No Índice de Controle de Rendas sobre as indústrias extrativistas desenvolvido pelo RWI, alguns países latino-americanos, como Brasil, Chile, Colômbia, Equador, México e Peru, figuram em um nível acima. Isto significa que estes Estados tendem a proporcionar informação pública sobre o manejo de seus setores petrolífero, gasífero ou minerador. Bolívia, Trinidad e Tobago e Venezuela estão um pouco abaixo, onde ficam Estados que fornecem aos seus cidadãos informação, mas com importantes lacunas no acesso a dados que deveriam ser públicos.
“O Equador, que antes divulgava na íntegra os textos de seus contratos do petróleo, pode cair no índice, já que, pela mudança obrigatória para contratos de serviços com todas as empresas, deixou de publicar os textos dos contratos e os parâmetros usados na renegociação”, disse à IPS Katarina Kuai, do programa de treinamento e construção de capacidades da RWI. Essa renegociação, determinada por lei, mudou as concessões ou os acordos de participação por contratos de serviços a uma taxa fixa e individual para cada empresa, o que aumentou consideravelmente a participação estatal no negócio.
Uma análise da firma norte-americana de pesquisa de mercados Bank of America Merrill Lynch (BofAML), divulgado pelo Ministério de Recursos Naturais Não Renováveis, coloca o Equador em quinto lugar no mundo com relação à participação estatal na renda do petróleo (80%), depois da Líbia (94%), Rússia (91%), Angola (86%) e Nigéria (84%).Depois do Equador aparecem Bolívia (76%), Noruega (74%) e Peru (64%). O país latino-americano com menor participação estatal na renda do petróleo é o Chile, com 40%, segundo o BofAML.
“Não se trata apenas de saber qual o valor da renda das indústrias extrativistas, mas o que acontece com esse dinheiro. Há países onde existem imensos buracos na informação”, disse Esanov. Compartilhar experiências entre diferentes países é fundamental para saber o que funciona e encontrar a maneira de dar poder à sociedade civil para fazer suas próprias investigações, acrescentou.
O RWI também impulsiona a Iniciativa de Transparência da Indústria Extrativista (Eiti), da qual fazem parte governos, empresas mineradoras e petrolíferas e organizações multilaterais e não governamentais. Pela Eiti, que permite informar à população e reduzir os riscos de corrupção, só se interessaram dois países da América Latina, Guatemala e Peru.
Ambos “estão na lista de 24 nações que se comprometeram a cumpri-la, enquanto já há 11 países que a cumprem completamente”, disse Kuai. “Temos de continuar trabalhando com todas as partes interessadas, ao mesmo tempo em que preparamos a transição para o pós-extrativismo, com o desenvolvimento de outros setores da economia”, destacou Pantoja. Envolverde/IPS