Conselheiro para temas de Ciência e Tecnologia do presidente Barack Obama, o cientista mexicano Mario Molina critica o físico Ivar Giaever, conhecido por negar que as mudanças climáticas possam ser causadas por ações humanas.
“A Rio+20 não foi exatamente um bom exemplo de progresso nas discussões. Acho que poderemos fazer alguns acordos internacionais, mas não agora, temos que esperar uns anos mais”. Assim o cientista mexicano Mario Molina, Prêmio Nobel de Química em 1995, resumiu a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável – Rio+20, que ocorreu no mês passado, no Rio de Janeiro. Ele participou de diversas discussões relacionadas a temas de meio ambiente durante o 62º Lindau Nobel Laureate Meeting, evento que reuniu 27 ganhadores do Prêmio Nobel e 592 jovens cientistas em Lindau, no sul da Alemanha, de 1º a 6 de julho.
Químico de formação, Molina tornou-se célebre por descobrir que os clorofluorcarbonetos (CFC) são nocivos à camada de ozônio. Em 1995, ele dividiu o Prêmio Nobel com Paul Crutzen e Sherwood Rowland “por seu trabalho na química atmosférica, em especial a que estuda a formação e decomposição da camada de ozônio”. Para Molina, a Rio+20 foi prejudicada pela conjuntura atual na economia mundial, afetada pela crise, mas funcionou como uma “chamada para despertar” a consciência das pessoas.
“A mensagem mais forte é que se não nos preocuparmos com o meio ambiente, o custo será muito maior, será mais difícil realizar o desenvolvimento econômico”, ressalta, lembrando que é importante estimular o trabalho conjunto de cientistas e economistas. “Precisamos nos comunicar mais entre nós e com a sociedade para repassar que precisamos fazer mais sacrifícios para resolver o problema”, pontua.
Conselheiro do Governo do presidente Barack Obama para temas de Ciência e Tecnologia (Molina construiu uma sólida carreira nos Estados Unidos), ele aponta a política interna dos EUA como um dos principais entraves para acordos internacionais, especialmente as forças dentro do Partido Republicano. Porém, afirma que dentro dessa ilha conservadora há representantes “com ideias mais racionais que as linhas de seu partido” e lembra que cerca de metade da população americana “está pronta para aceitar mudanças” nos padrões de comportamento. “Isso me faz mais otimista”, conta.
Polêmica – Ele acredita na teoria que relaciona as atuais tragédias provocadas por enchentes, furacões e outros fenômenos naturais a atividade humana e crê que esse tipo de acontecimento “vai empurrar a sociedade a reagir”. Perguntado sobre o que acha das opiniões de físico Ivar Giaever, que, em sua conferência em Lindau classificou como uma “nova religião” a questão do aquecimento global, Molina não pensou duas vezes em criticar o cientista norueguês.
“Infelizmente, o doutor Giaever ganhou um Prêmio Nobel em um campo da Física que não tem nada a ver com mudanças climáticas. Ele mostrou em sua palestra que não sabe nada de mudanças climáticas, cometeu erros enormes, então, é uma pena”, opina. Premiado com o Nobel de Física em 1973 por suas experiências com semi e supercondutores, Giaever hoje virou uma referência entre os cientistas que negam a influência das ações humanas nas mudanças climáticas.
Giaever trata como “casos isolados” tragédias como o furacão Katrina em Nova Orleans. “Eu gostaria de sentar e conversar com ele, introduzir um pouco de consciência para que ele pesquise mais. Não basta entrar na internet e buscar uns dados por alguns minutos, você deve explorar a literatura científica. Acho que foi muito embaraçoso ter um Prêmio Nobel prestando esse papel ridículo”, dispara Molina.
Hidrelétricas – O cientista mexicano opinou também sobre outro tema controverso, a construção de hidrelétricas, em especial as que envolvem deslocamentos de população e uso de áreas produtivas. “Todas as mudanças têm algum impacto e a expectativa é que os positivos se sobressaiam. A energia hidrelétrica tem o lado bom de não contaminar o meio ambiente, mas é preciso fazer isso de forma adequada”, opina.
Molina conta que a “tendência moderna” nesse campo é construir mini-hidrelétricas, para justamente minimizar essas consequências. “Em nosso continente [América Latina] não exploramos o potencial de mini-hidrelétricas. No entanto, o que realmente precisamos priorizar é a não utilização de combustíveis fósseis. Ainda que seja um custo adicional no momento, ele é muito menor que o dano que vai causar”, reforça.
Ele acredita que a América Latina precisa “parar de importar porcarias” e padrões de tecnologia que muitas vezes funcionam apenas nos países mais desenvolvidos. “O continente precisa estar pronto para, por exemplo, ser um piloto de desenvolvimento de energia solar. A Alemanha a usa em larga escala e não tem tanto sol quanto zonas tropicais”, ilustra, ressaltando também a importância de capacitar pessoas, promover incentivos, cooperar com países em desenvolvimento, educar o público a respeito das ameaças ao meio ambiente e remover subsídios aos combustíveis fósseis.
* Publicado originalmente no site EcoAgência.