Gonzalo Echagüe Méndez de Vigo é presidente da Fundação Conama e presidente do Colégio Oficial de Físicos, da Espanha. Virá ao Brasil participar do Encontro Ibero-Americano sobre Desenvolvimento Sustentável (EIMA 8), que será realizado entre os dias 17 e 20 de outubro.
Considerando que o aprimoramento de novas tecnologias será um fator fundamental de contribuição para o desenvolvimento sustentável, quais são as suas perspectivas ao participar do EIMA 8, em São Paulo?
Mendéz de Vigo: Tanto na Fundação Conama e quanto no Colégio de Físicos mantemos uma visão comprometida com a situação histórica que vivemos. Superar a atual conjuntura da crise global não vai ser possível unicamente com soluções tecnológicas, será preciso uma verdadeira mudança de paradigmas. A tecnologia deverá ter um papel importante, mas não servirá de nada sozinha, sem objetivos que deem forma ao ansiado desenvolvimento sustentável, que adequem nosso desenvolvimento econômico com a capacidade biofísica do território, num contexto de maior qualidade de vida. E a este processo complexo queremos aportar uma pedrinha de areia com o EIMA 8.
Entre os debates propostos pelo EIMA 8 serão discutidos os maiores desafios e oportunidades para o desenvolvimento sustentável da atualidade. Quais são os maiores objetivos e expectativas para o evento? O senhor acredita que este encontro poderá acelerar “a cooperação para um futuro sustentável” entre países ibero-americanos? Em quais aspectos?
Mendéz de Vigo: No momento atual, frente a uma situação de crise do próprio sistema, não é válido repetir o que já sabemos fazer, temos que buscar novas soluções com planejamentos diferentes. Nestes momentos de criatividade, o trabalho conjunto, as alianças e os debates são mais importantes do que nunca, porque as propostas mais avançadas sairão da fronteira do conhecimento. Por isso, esperamos que um espaço de diálogo como o EIMA 8 – para o qual estão convidados todos os países ibero-americanos, com representantes de governos, universidades, empresas, ONGs – sirva para gerar essas alianças tão necessárias para nosso futuro.
A sétima edição do EIMA foi realizada no Brasil, em Foz do Iguaçu, em 2009. Em 2010, na décima edição do Conama, em Madri, o Brasil foi o primeiro país estrangeiro a participar como convidado, pelo chamado Fórum Hispano-Brasileiro de Desenvolvimento Sustentável. Desta cooperação entre Brasil e Espanha, quais parcerias obtiveram os melhores resultados? Como vê o relacionamento entre esses países daqui para frente, em termos de cooperação pelo desenvolvimento sustentável?
Mendéz de Vigo: A relação com Brasil tem sido muito especial, talvez por razões históricas. Nunca existiu tantos canais de colaboração hispano-brasileiras, e acredito que o Brasil foi o primeiro país convidado para o Conama, o que é muito simbólico, já que foi só alguns meses depois da histórica Cúpula da Terra, no Rio de Janeiro, em 1992, que se celebrou o primeiro Congresso Nacional de Meio Ambiente (Conama) na Espanha. No marco do Fórum Hispano-Brasileiro de Desenvolvimento Sustentável, que teve mais de 1.100 assistentes, aconteceram mais de 30 reuniões bilaterais, entre administradores, empresas, ONGs e universidades, e foram assinados dois convênios de colaboração, e seis instituições programaram visitas ao Brasil durante o primeiro trimestre de 2011, para consolidar distintas colaborações.
Qual é a sua opinião sobre o momento econômico do Brasil? Como estamos, ao seu ver, em relação às metas de sustentabilidade, à transição para a economia verde e às preparações para a Rio+20?
Mendéz de Vigo: O atual momento econômico para o Brasil é um momento de grandes oportunidades e de grandes desafios. Oportunidades para desenvolver um grande país: infraestruturas de todos os tipos, incluídas as de meio ambiente; o desenvolvimento de moradias que uma parte importante da população demanda; a gestão racional da água; o desenvolvimento energético na geração e distribuição da energia elétrica; a extração de matérias-primas; o setor de bens e equipamentos; o desenvolvimento das energias renováveis; etc. Mas também um grande desafio que consiste em não repetir os erros cometidos pelos países mais desenvolvidos, que no seu desenvolvimento hipotecaram o meio ambiente. Nos tempos que vivemos, em que se sobrepõem uma grande crise do modelo econômico com crises financeira, energética, ambiental e os grandes problemas sociais de erradicação da pobreza, a transição para uma economia verde deve ser parte de uma grande política transversal que abranja as demais políticas setoriais. Sem esta transição, o momento econômico que vive o Brasil pode se transformar em negativo. Tudo isso será tratado na conferência Rio+20. Será uma grande oportunidade para que o Brasil lidere, junto com outras potências econômicas, em especial com a União Europeia, as propostas e políticas para essa transição para uma economia verde.
De acordo com a sua experiência, qual é a melhor forma para incentivar os cidadãos, líderes empresariais, instituições governamentais e não governamentais a participar mais ativamente dos debates e também colocar em prática o modelo de desenvolvimento sustentável? Qual setor considera ser mais estratégico ou “o motor” da grande mudança? Existe um público-alvo para o EIMA 8?
Mendéz de Vigo: Em cada país, o setor estratégico, que pode servir de motor para a mudança, será diferente, mas seja qual for o setor, a dimensão energética estará ligada indiscutivelmente. Na Espanha, a reabilitação de prédios com critérios ambientais e sociais pode oferecer um impulso a esta economia verde. No Brasil, o desenvolvimento de infraestruturas ligadas aos grandes eventos que vão acontecer pode ser o caminho. Todos os setores serão multidisciplinares, como também é o público-alvo do EIMA 8. Todos os atores envolvidos nesse processo de transição para a sustentabilidade estão convidados: as empresas, os governos, as ONGs, as universidades e os centros de pesquisa.
No seu ponto de vista, o que falta para engatilhar a ética da cidadania na produção econômica e nos mecanismos de cooperação internacional?
Mendéz de Vigo: Fundamentalmente, é uma questão de liderança e de educação. Precisamos de líderes comprometidos em todos os âmbitos, que gerem a corrente de confiança necessária para se conseguir as mudanças perseguidas e a implicação da cidadania no processo, a qual será favorecida com políticas de informação, sensibilização e participação, finalmente por meio de uma educação integral onde a variável da sustentabilidade está presente.