Beirute, Líbano, 17/5/2011 – Enquanto aumenta a violência dos levantes populares na Síria, floresce o mercado negro de armas leves e médias no Líbano. “Os preços triplicaram em menos de dois meses”, afirmou Wael, um vendedor de armas local cujo nome foi mudado para proteger sua identidade. Segundo os comerciantes libaneses, os sírios cruzam a fronteira para o país vizinho a fim de comprar armas desde o final de janeiro, quando o país viveu os protestos pela democracia que receberam uma sangrenta resposta do governo.
Temendo que a onda de violência na Síria chegue até seu território, os libaneses também começaram a comprar armas leves. Desde o começo dos levantes, dezenas de soldados e centenas de civis morreram. Os ativistas dizem que os mortos chegam a 800. Porém, as autoridades sírias culpam “os grupos armados”, grupos salafistas e uma conspiração do Ocidente.
A agência oficial de notícias da Síria, Sana, citou uma fonte militar dizendo que o Exército e as unidades de segurança continuam perseguindo “organizações terroristas armadas”. No dia 11, “dezenas de integrantes de organizações adquiriram uma enorme quantidade de armas e munições variadas em Baba Amr, na província de Homs, e na zona rural de Deraa. Dois militares foram martirizados e outros cinco ficaram feridos nos enfrentamentos”, informou a agência em seu site.
Os ativistas negam ter comprado armas, culpando pelas mortes de soldados membros dos serviços secretos de inteligência, que supostamente fuzilaram os efetivos que se negaram a disparar contra os manifestantes. “Não estamos armados. Isto é absurdo”, disse à IPS um ativista sírio que não quis se identificar.
O panorama sírio, em geral, se mostra turvo em meio a acusações e contra-acusações na falta de uma cobertura da mídia, enquanto a maioria dos jornalistas estrangeiros tem sua entrada proibida no país. Mas, no vizinho Líbano, os que vendem armas destacam que muitos sírios as compram para se defender. Também admitem que algumas vendas parecem ser parte de um esforço concertado e mais estruturado.
“Entretanto, é extremamente difícil saber qual segmento da sociedade estes compradores representam, já que mantêm sua identidade em segredo”, explicou Wael. “Os moradores locais também compram armas por medo das tensões sectárias, consequência da desestabilização do regime de Bashar Assad”, afirmou Brahim, outro vendedor de armas que conversou com a IPS preservando sua identidade. Embora não esteja claro quem exatamente está por trás da compra, a carestia de armas deixa claro que, de fato, existe uma demanda maior.
Nas ruas de Beirute o preço de um rifle AL-47 passou de US$ 850 para US$ 1,45 mil, enquanto um M4, que antes custava US$ 5,8 mil, agora é vendido a US$ 7,5 mil. Um rifle M16 sai por US$ 2,5 mil, o que representa aumento de 50% em relação ao preço anterior. Trata-se de uma arma padrão do Exército dos Estados Unidos, muito usada durante a Guerra do Vietnã (1965-1975). Por outro lado, o Exército e a Marinha empregaram no Iraque e no Afeganistão a carabina M4 como arma básica.
A metralhadora PKC agora é comprada por US$ 4,2 mil. Há poucos meses custava US$ 3,3 mil. O lança-granadas Energa, que antes valia US$ 80, agora custa US$ 350. O preço de um rifle B7 passou de US$ 700 para US$ 1 mil. “Um Kalashnikoff, que há alguns meses oscilava entre US$ 1 mil e US$ 1,2 mil, agora é vendido por US$ 1,6 mil em Beirute e por US$ 2 mil na cidade libanesa de Trípoli. O custo das munições também aumentou drasticamente”, disse Brahim.
Desde o fim da Guerra Civil, em 1990, a instabilidade do Líbano se traduziu em grandes somas de dinheiro para os vendedores locais de armas. Segundo Brahim e Wael, o mercado está controlado por partidos políticos que usam sua influência e sua ampla rede de aliados para proteger os contrabandistas e evitar que sejam levados à justiça. Cada partido político depende, em geral, de um comprador principal, que possui todos os contatos necessários no exterior e conhece os detalhes do negócio.
Brahim admitiu que os embarques de armas para o Líbano aumentaram significativamente nos últimos meses, e que tradicionalmente as que entram no país procedem, via contrabando, do Iraque e da Síria, através da permeável fronteira. “À luz dos recentes acontecimentos regionais, parece que os partidos políticos libaneses decidiram permitir o comércio de armas leves e médias, enquanto proíbem a venda de armas de fogo mais pesadas, como canhões e foguetes”, afirmou Wael. Envolverde/IPS