Casablanca, Marrocos, 11/8/2011 – A participação das mulheres ao lado dos homens nos protestos iniciados em 20 de fevereiro no Marrocos mostra uma nova etapa da emancipação feminina, segundo observadores e ativistas. No entanto, alertam que ainda falta muito por fazer devido à tradicional grande disparidade de gênero. “Já esperamos muito. As mulheres participam para dizer que é hora de haver justiça”, disse a ativista Safaa Ferradi à IPS.
Por sua vez, Rabah Nouami, líder do movimento 20 de Fevereiro, de Casablanca, explicou que “a grande maioria das integrantes de nosso movimento tem formação acadêmica. É reconfortante ver que a maioria das porta-vozes do movimento são mulheres. Entretanto, ainda não têm influência no processo de decisão”, acrescentou. As mulheres continuam sendo vítimas de violência e discriminação, apesar dos esforços do Estado e da sociedade civil para combater o problema.
Os marroquinos sofrem quatro formas de violência: “física, sexual, psicológica e econômica”, revela um estudo da estatal Alta Comissão de Planejamento. O novo código de família deste país de 32 milhões de habitantes, que entrou em vigor em 2004, estabelece que as mulheres têm direito de se divorciar e receberem pensão alimentícia, bem como de se casar sem permissão paternal. Porém, não reconhece a igualdade com os homens com relação à herança.
O problema não é só o texto escrito, “mas sua execução”, disse à IPS a escritora dedicada a temas femininos, Fatima Bouhraka. “A maior resistência é cultural. É o homem que manda”, afirmou. No entanto, há outros fatores que reforçam a cultura, “como a pobreza e a ignorância dos direitos e deveres”, disse Taoufiki Belaid, membro da organização de direitos humanos Anistia Internacional, com sede em Londres. As mulheres vítimas de violência, bem como seus agressores, “ignoram seus direitos e deveres”, explicou.
Abderrahim Messoudi, da Associação de Direitos Humanos do Marrocos, que organiza painéis de conscientização em universidades, disse à IPS que o problema é a pouca participação feminina nessas atividades. A indiferença das mulheres quanto às iniciativas da sociedade civil deriva da percepção de que são tendenciosas, afirmam algumas ativistas. “Não há uma verdadeira sociedade civil. Todo mundo tenta manipular a causa feminina segundo seus próprios interesses”, disse Ferradi.
Contudo, não há coincidências a respeito. “A sociedade civil conseguiu em poucos anos o que os partidos políticos não fizeram em décadas”, disse Bouhraka. Mas, é preciso separar as duas coisas, acrescentou. “Quanto mais independente for uma organização, mais confiança vai inspirar”, ressaltou.
O descontentamento no Marrocos com os partidos políticos não é novo. Nas últimas eleições gerais, de setembro de 2007, participaram 37% dos habilitados a votar. As novas normas eleitorais exigem que as mulheres ocupem pelo menos 30% das 326 cadeiras da assembleia legislativa. Mas não é suficiente para as defensoras dos direitos humanos. “O parlamento e o governo continuarão tendo maioria de homens”, ressaltou Bouhraka.
As mulheres representam apenas 25% da população economicamente ativa, segundo estudo da Alta Comissão de Planejamento. A quantidade de analfabetas é desproporcional: mais de 50,8% das marroquinas não sabem ler nem escrever. A violência e a discriminação social levaram as mulheres a protestarem aproveitando o contexto da Primavera Árabe. “Reclamamos liberdade, igualdade e dignidade humana”, disse Ferradi. “Nossas exigências são iguais para homens e mulheres”, explicou Nouami.
A nova Constituição marroquina, aprovada em 1º de julho, estipula a promoção da igualdade de gênero. Porém, “no Marrocos, os textos são uma coisa e a realidade é outra”, disse Bouhraka. “Há mãos discretas que detêm leis que favorecem o país e a população”, acrescentou. Envolverde/IPS