Os problemas daqui são os mesmo de lá. Só não os conhecemos

Antes mesmo de iniciar o terceiro leilão para a concessão do tão “esperado” primeiro trem-bala brasileiro, o governo já sabia que havia apenas um consórcio interessado. E após virem à tona os escândalos relacionados ao metrô paulista, o governo preferiu não dar continuidade à licitação.

Atualizado em 02/10/2013 às 10:10, por Ana Maria.

Acela Express: uma versão do TGV francês projetado para operar nos Estados Unidos. Foto: http://pt.wikipedia.org/

Antes mesmo de iniciar o terceiro leilão para a concessão do tão “esperado” primeiro trem-bala brasileiro, o governo já sabia que havia apenas um consórcio interessado. E após virem à tona os escândalos relacionados ao metrô paulista, o governo preferiu não dar continuidade à licitação. E assim começam as reclamações: “no Brasil, nada sai do papel”, “se fosse em outro País, já estaria funcionando”. Será?

Nos Estados Unidos, o trem-bala que ligaria São Francisco a Los Angeles não sai do papel há décadas. Uma das diferenças em relação ao nosso é que o projeto teve o aval da população, que estava ciente de que o trem-bala não era autossustentável – ou seja, mesmo após sua conclusão, será necessário subsídio governamental contínuo. Além isso, existe também a preocupação de o orçamento aumentar durante a construção, bem como a possibilidade de superfaturamento. A China vive situação semelhante e com outro agravante: vários representantes do governo foram afastados por acusações de corrupção. Até mesmo na Europa (onde achamos que tudo é muito correto) foram identificados casos de corrupção durante a construção de trens, prova de que isso não acontece apenas no Brasil.

A gestão desse tipo de transporte é outro fator que merece cuidado. O Japão levou mais de 40 anos para aumentar a velocidade de seus trens-balas de 210 km/h para 350 km/h, enquanto a China levou menos de sete anos nesse processo – e o que aconteceu? Diversos acidentes com mortes nos trens chineses. É importante que saibamos obedecer às condições de segurança necessárias e que tenhamos empresas responsáveis por trás disso. Se estamos pouco preparados para arcar com o risco da corrupção, será que conseguiremos arcar com outros aspectos?

Juntos, esses fatores revelam que a corrupção é uma questão inquietante e que se insere em diferentes áreas, dentro e fora do governo. Quanto a isso, a percepção mundial é clara: 54% das pessoas consultadas pela  Global Corruption Barometer acreditam que o governo é grande parte ou inteiramente executado por grandes entidades que atuam em prol de seus próprios interesses. Mas não é só aqui que o governo inspira pouca confiança. Em países como Grécia, Rússia e Ucrânia, mais de 80% das pessoas acreditam que quem dita as regras e ações dos governos são grupos que têm pouco (ou nenhum) interesse no benefício e bem-estar dos cidadãos.

Mobilizações como as que estão acontecendo no Brasil podem fazer governantes e entidades detentoras de poder reverem suas atitudes e tomarem providências quanto a esse tema. Em outros países, não são apenas a cultura da honestidade, leis claras e esforço público para criar um sistema de informações eficiente os responsáveis pelo baixo índice de corrupção. Isso se dá, principalmente, em decorrência de uma vigilância intensiva contra a corrupção. Portanto, não tem segredo! É preciso vigiar e punir os corruptos até que consigamos esquecer o “jeitinho brasileiro” e alcancemos uma sociedade responsável. Com certeza são nesses momentos de mobilização que pessoas realmente engajadas no bem comum aparecerão e pregarão bons ideais. Temos que acreditar.

* Fernanda Pinheiro Monteiro é consultora de sustentabilidade da Keyassociados.


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