Nações Unidas, 7/1/2015 – Em um artigo satírico do Wall Street Journal intitulado Um Olhar Pouco Sério Sobre o Próximo Ano, Hugo Rifkind prevê que o preço do barril de petróleo cairá tanto que as pessoas acabarão comprando o barril para usar seu conteúdo. Este cenário talvez seja improvável, mas a forte queda nos preços do chamado ouro negro, que esta semana caiu para US$ 50 em Nova York, gerou boas e, em sua maioria, más notícias.
Nos Estados Unidos, a queda dos preços foi considerada um estímulo inesperado mas bem-vindo para a economia em recessão. Para o presidente norte-americano, Barack Obama, “o baixo pereço do petróleo traz esperanças”, dizia a manchete de um jornal diário norte-americano. O semanário britânico The Economist calculou que uma redução de US$ 40 no preço mudaria cerca de US$ 1,3 trilhão das mãos dos produtores para as dos consumidores.
Mas, no Sul em desenvolvimento, a situação atual ameaça minar as economias dependentes do petróleo na África, América Latina, Ásia e Oriente Médio. A contínua baixa, de aproximadamente US$ 107 por barril em junho de 2014 para os US$ 50 atuais, raspou o poder aquisitivo e prejudicou algumas das moedas do mundo, incluindo o real brasileiro, o rublo russo, a rúpia indonésia, o bolívar venezuelano, a naira nigeriana, o peso chileno, a lira turca e o ringgit malaio.
Mais cedo ou mais tarde, é provável que a queda do preço do petróleo também reduza o gasto militar e o florescente mercado de armas no Oriente Médio, avaliado em milhares de milhões de dólares. Para os pacifistas, isso poderia ser um sinal positivo na campanha mundial pelo desarmamento, em sua maioria de armas convencionais.
Tradicionalmente, o aumento da renda procedente do petróleo determinou a compra de armas das seis monarquias do Golfo Arábico: Arábia Saudita, Bahrein, Emirados Árabes Unidos, Kuwait, Catar e Omã. As exceções no Oriente Médio são Egito e Israel, que dependem em grande parte das subvenções militares dos Estados Unidos, gratuitas e não reembolsáveis.
Pieter Wezeman, pesquisador do Instituto Internacional de Estocolmo para a Investigação da Paz (Sipri), disse à IPS que a redução da renda com petróleo influirá, sem dúvida, no gasto militar dos países do Oriente Médio, como ocorreu no passado. A importação de armas pela Arábia Saudita teve seu ápice na década de 1990, mas depois caiu rapidamente, em parte devido à redução da renda fiscal derivada do preço mais baixo do petróleo, acrescentou.
O maior gasto militar do mundo corresponde aos Estados Unidos, com US$ 640 bilhões, seguido por China com US$ 188 bilhões, e Rússia, com US$ 88 bilhões, segundo os dados divulgados em 2013 pelo Sipri. Mas Wezeman alerta que é muito cedo para ter certezas a respeito, já que os Estados em questão tendem a ser muito reservados e pouco democráticos sobre os assuntos militares e seus planos de aquisição de armas. “Podem decidir reduzir o gasto em outros setores, se os baixos preços do petróleo os obrigarem a reduzir o gasto total do governo”, ressaltou.
Segundo estimativas do Fundo Monetário Internacional, a Arábia Saudita possui US$ 750 bilhões em reservas de divisas.
Nicole Auger, analista da Forecast International, empresa de informação sobre o mercado da defesa, afirmou à IPS que o gasto projetado para o quinquênio 2015-2019 na defesa do Oriente Médio mostra um taxa anual de crescimento de 3,48%. Este número é inferior ao do quinquênio anterior, quando chegou a 8,45%. “Parte dessa redução é atribuída à queda esperada nos preços do petróleo”, explicou.
Para Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Kuwait e Catar, essa tendência será apenas um problema que poderão suportar comodamente durante vários anos, “por isso não espero nenhuma mudança significativa em suas tendências com o gasto de defesa”, acrescentou a especialista. Segundo Auger, a Arábia Saudita continuará dominando o mercado de armas do Oriente Médio, já que seu orçamento de defesa é quase quatro vezes maior do que o do país que a segue nesse gasto na região.
“Não vejo uma mudança importante nas tendências do gasto em defesa de Irã e Iraque, porque seguramente serão os mais prejudicados” pela queda dos preços do petróleo, apontou Auger. Devido a outras fraturas regionais e internas, os dois vizinhos terão que manter seus níveis de defesa como medida de precaução, acrescentou. O Irã sofre sanções internacionais por seu programa nuclear e se sente ameaçado, e reduzir seu gasto em defesa só o deixaria mais vulnerável desde seu ponto de vista, pontuou.
Para Wezeman, a importância que tem o mercado do Oriente Médio para as empresas fica claro na venda de armas para a Arábia Saudita, que por si só representou, em 2013, 20% das vendas da BAE Systems, a terceira produtora de armas do mundo. E a segunda maior produtora de armas, Boeing, sofrerá a redução das vendas de aviões de combate para seu principal cliente, os Estados Unidos, e depende cada vez mais das exportações, acrescentou o pesquisador do Sipri.
Se as vendas para o Oriente Médio paralisarem ou diminuírem, as empresas terão que competir para conseguir contratos em outras partes do mundo onde o gasto militar esteja em crescimento e dependendo menos do preço do petróleo, como ocorre na Ásia, opinou Wezeman. Envolverde/IPS