Mais de seis meses depois do acidente nuclear na usina de Fukushima, radiação ainda contamina solo e florestas do país.
Suba a montanha até o vilarejo de Iitate, e os níveis de radiação nos contadores aumentam oito vezes – mesmo com as janelas do carro fechadas. “Não se preocupe, tenho vindo aqui há meses e ainda estou vivo”, brinca Chohei Sato, chefe do conselho do vilarejo, enquanto abre a janela do carro e respira fundo. Depois, para na estrada, sai do carro, e enterra o contador na grama. Os níveis voltam a dobrar.
Iitate está localizada a 45 km da usina nuclear Fukushima Dai-ichi, atingida por um tsunami no dia 11 de março. Nas montanhas acima da cidade, as florestas estão assumindo as cores do outono, mas sua beleza é enganadora. Toda vez que uma lufada de vento bate, Sato diz que partículas invisíveis de césio radioativo se soltam das árvores e voam sobre o vilarejo. Os níveis de radiação nas montanhas são tão altos, que os moradores de Iitate não se atrevem a chegar perto delas. Sato não conseguiu enterrar os ossos de seu pai, que ele mantém numa urna em uma fazenda abandonada, por conta dos perigos de subir ao cemitério que fica no alto das montanhas.
A cidade teve o azar de ser atingida por um vento carregado de partículas radioativas (que incluía partículas de plutônio) com uma força muito maior do que a que todos imaginavam após o desastre nuclear. Praticamente todos os seis mil moradores foram retirados da cidade, um tanto tardiamente, já que o governo precisou de meses para decidir que algumas vilas fora do raio de 30 quilômetros da usina precisavam de atenção especial. Agora, o mesmo governo oferece um exemplo que mostra o quão difícil será a recuperação do desastre.
O alcance da radiação
Isso acontece principalmente por causa da enorme disseminação da radiação. Recentemente, o governo declarou que precisaria interditar uma área de cerca de 2,419 quilômetros quadrados de solo contaminado – uma área maior que a Grande Tóquio, muito além da zona oficial de restrição, de 30 quilômetros. Além da limpeza nas áreas urbanas, isso envolveria a remoção de cerca de cinco centímetros de terra fértil das fazendas locais, além de todas as folhas mortas nas florestas cobertas de césio.
No entanto, a experiência de Iitate sugere que o governo pode estar subestimando a tarefa. Os moradores do vilarejo removeram os cinco centímetros de terra fértil, mas, como partículas radioativas continuam a voar das árvores, o nível de radiação no local permanece alto. Sem que as florestas sejam derrubadas, Sato acredita que o risco de contaminação será permanente, e até agora ninguém decidiu onde a terra contaminada será descartada.
O segundo problema é a saúde infantil. No dia 30 de setembro, o governo suspendeu um alerta de evacuação para comunidades num raio entre 20 e 30 quilômetros de distância da usina. A meta era parcialmente mostrar que as autoridades estavam conseguindo manter o problema sob controle.
Mas essas áreas continuam afetadas por pontos de concentração radioativa, incluindo escolas e parques públicos, que deverão ser limpos antes que a confiança da população seja reconquistada. Pais dizem que estão particularmente preocupados com suas crianças, porque os efeitos da radiação nos mais jovens ainda são pouco claros. Além disso, as partículas de césio tendem a ficar nos gramados, o que aumenta o risco de contaminações entre os bebês e as crianças pequenas. Em Iitate, Mihori Takahashi, mãe de duas crianças, acredita em apenas metade do que dizem os médicos, e diz que não quer que suas crianças retornem. Esta pode ser uma verdadeira maldição para o vilarejo, na medida em que “o renascimento de Iitate depende do retorno das crianças”, diz Sato.
Tradução: Opinião e Notícia.
* Publicado originalmente no The Economist e retirado do site Opinião e Notícia.