Passados seis meses do novo governo, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) finalmente retomou as discussões sobre o desenvolvimento da estratégia nacional para o REDD+: redução de emissões de desmatamento, degradação florestal e reconhecimento do papel do manejo florestal, conservação e aumento de estoques de carbono florestal.
Esta iniciativa é importante para avançar na redução da principal causa de emissões de gases do efeito estufa (GEE) no Brasil: o desmatamento. As mudanças de uso da terra e florestas contribuem com 61% das emissões de GEE no país, de acordo com dados do último inventário nacional, divulgado em 2010 pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). Além disso, a redução de desmatamento no país representa a maior parte do compromisso voluntário de redução de emissões de GEE nacionais de 36,1% e 38,9%, em relação às emissões projetadas para 2020. Pelo Decreto 7.390/2010, essa meta, para ser alcançada, dependerá principalmente da redução de 80% do desmatamento na Amazônia em relação à média verificada entre 1996 e 2005, e de 40% do desmatamento no Cerrado em relação à média verificada entre 1999 e 2008.
O avanço de ações de REDD+ no Brasil dependerá do comprometimento de diferentes esferas de governo (federal, estaduais, municipais), além do engajamento do setor privado, academia e de organizações da sociedade civil. No entanto, até o momento não existe um posicionamento claro entre esses atores sobre como o REDD+ será implementado. Esta lacuna pode ser resolvida com o desenvolvimento de um marco regulatório para alavancar ações e investimentos para REDD+.
Várias frentes de debate
Nesse sentido, desde 2010, houve quatro principais frentes de discussão relacionadas a esse marco regulatório no Poder Legislativo, Poder Executivo, nos Estados da Amazônia e na sociedade civil. Primeiro, a Câmara dos Deputados discutiu o Projeto de Lei 5586/2009 com alguns representantes de ONGs, do setor privado e de governos estaduais. Esse PL pretendia criar um regime nacional de REDD+. No final de 2010, ele foi arquivado e reapresentado pela deputada Rebecca Garcia, em 2011, sob o número 195/2011. O senador Eduardo Braga também apresentou o mesmo texto no Senado (PL 212/2011), numa estratégia para adiantar a análise do mesmo, caso ele seja aprovado na Câmara. No entanto, ao menos em 2010, esse PL não contava com apoio do governo federal.
Ainda em 2010, o MMA convocou diversos setores do governo e da sociedade civil para a formação de Grupos de Trabalho sobre o regime nacional de REDD+. A discussão foi dividida em três grupos que trataram de aspectos institucionais, repartição de benefícios e de financiamento para REDD+. Paralelamente, o MMA formou um Painel de Especialistas em REDD+, com o objetivo de oferecer subsídios ao regime nacional sobre o assunto. Este painel concentrou-se na discussão de aspectos de financiamento e de repartição de benefícios.
A nova equipe que assumiu a Secretaria de Mudança do Clima no MMA ainda está avaliando os resultados dos GTs e do Painel para indicar como os produtos serão utilizados.
A terceira frente de discussão tem ocorrido nos Estados da Amazônia, mais especificamente no Acre, Amazonas e Mato Grosso. O Acre aprovou uma lei estadual de pagamento por serviços ambientais (PSA), que inclui REDD+. Amazonas e Mato Grosso já colocaram em consulta pública suas minutas de projeto de lei sobre PSA e REDD+.
Finalmente, organizações não governamentais, setor privado e movimentos sociais organizaram um processo para elaboração de Princípios e Critérios de REDD+ no Brasil. Este processo teve como objetivo oferecer insumos a diversas iniciativas de REDD+, incluindo um possível marco regulatório.
Essas quatro frentes demonstram que já existe base para desenvolvimento e discussão de uma estratégia nacional de REDD+. Além disso, elas indicam que esse tema deve ser tratado com urgência para evitar que os Estados criem uma salada de regras com risco de não serem compatíveis com o marco legal federal. Esta situação de conflito entre lei federal e leis estaduais pode, por exemplo, limitar investimentos em REDD+, principalmente pelo setor privado.
Falta estratégia nacional
O MMA já anunciou que vai desenvolver a estratégia nacional de REDD+ até o final de 2011, com a participação de outros ministérios e com consultas públicas. Uma das vantagens é que a nova equipe que está tratando do tema participou de algumas das quatro frentes de discussão iniciadas em 2010 e possui conhecimento acumulado sobre REDD+.
Nessa retomada do debate, um tema ainda polêmico, principalmente entre os ministérios, é a possibilidade ou não de geração de offsets (neutralização) com REDD+, ou seja, utilização de redução de emissões no Brasil para cumprimento de metas de redução de emissões em outros países.
Essa discussão, que já começa a reaparecer nas reuniões de governo em 2011, deve passar por dois aspectos-chave. Primeiro, a definição do que significa ter uma meta voluntária, ou seja, se o Brasil poderá ou não repassar as reduções obtidas com REDD+ para outros países, antes de reduzir 36,1% e 38,9% de suas emissões projetadas para 2020. Segundo, a definição de como vai funcionar o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões previsto na Lei de Política Nacional de Mudança do Clima, mas ainda sem regulamentação. Esse mercado poderá, por exemplo, permitir o uso de reduções de emissões excedentes ligadas a REDD+ para cumprimento de metas de outros setores dentro do país (como energia, transporte, siderurgia, mineração e outros), a fim de atingir a redução de 36,1% e 38,9%.
O desafio está posto e vários países estarão observando como o Brasil desenvolverá sua estratégia nacional de REDD+ e qual será o resultado desse processo. A regulamentação de um mercado nacional de emissões pode ser uma solução intermediária para alavancar o REDD+ no país, em curto e médio prazos. Porém, muitas discussões ainda devem ocorrer nesse segundo semestre de 2011, antes da definição de uma visão de governo sobre o tema. Estados, setor privado, sociedade civil e principalmente aqueles que dependem da floresta esperam contribuir e se beneficiar com o resultado desse processo.
* Brenda Brito é mestre em Ciência do Direito pela Stanford University, coordenadora do Programa de Mudanças Climáticas e secretária executiva do Imazon.
** Publicado originalmente no site Ecopolítica.