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Sem lugar para refugiados sírios

Beirute, Líbano, 26/5/2011 – Moradores da cidade síria de Tell Jalaj cruzam a fronteira para o Líbano fugindo da violência que nas últimas semanas sacode o país, mas enfrentam um futuro incerto. A cidade está a poucas centenas de metros da região libanesa de Wadi Jaled, onde há 17 aldeias espalhadas perto do Rio Kabir, que corre ao longo da fronteira. “Naturalmente, estamos contentes por alojá-los, mas tememos que em poucas semanas tenhamos um verdadeiro problema humanitário”, disse à IPS o ex-prefeito da aldeia de Bayouk, Mahmoud Jazaal.

As manifestações sírias pedindo democracia, que começaram há dois meses, foram reprimidas duramente pelo governo do presidente Bashar Assad, cuja família está no poder há mais de 30 anos. Cerca de cinco mil pessoas fugiram para o Líbano desde que o conflito começou em Tell Jalaj, disse Jazaal, sendo que o pequeno povoado de Bayouk, com 1.400 habitantes, recebeu aproximadamente 600 pessoas, cerca de 120 famílias sírias.

“Sem dúvida, a quantidade total de refugiados é maior, muitas das pessoas que chegaram a Trípoli, na região norte, não estão registradas”, disse à IPS o legislador Jaled Daher. Debaybiyeh e outras aldeias, localizadas a 20 quilômetros de Trípoli e perto da cidade síria de Halat, abrigam perto de 400 famílias de refugiados. “A região, simplesmente, não tem os meios nem a capacidade para atender as necessidades de tanta gente”, afirmou Jazzal.

O Norte é pobre. Cerca de 17% da população é indigente, segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. O ex-prefeito lamentou que a ajuda só tenha sido suficiente para uns poucos dias. “O Ministério de Trabalho Social oferece rações às famílias com dez integrantes que não alimentam mais do que duas pessoas. Precisamos de mais”, insistiu Jazaal.

O ministro interino de Assuntos Sociais, Salim Sayegh, informou que sua pasta analisa a possibilidade de alojar um número muito maior de refugiados, bem como usar escolas e outros prédios municipais do Norte para esse fim. “Já há problemas de saneamento devido ao grande número de pessoas. Vivem dezenas de pessoas em uma casa. Além disso, muitas têm doenças graves e a clínica mais próxima fica a 40 quilômetros”, disse.

O abrasador verão que está para começar só vai piorar a difícil situação dos refugiados, disse Daher. Para os sírios que encontraram refúgio em povoados libaneses, as cada vez piores condições de vida não são nem de perto um assunto prioritário. Suad, uma mulher de mais ou menos 30 anos, cruzou o Rio Kabir a pé com seus três filhos. “Fugimos dos disparos de franco-atiradores. Minha mãe foi ferida no braço. Agora está em um hospital libanês”, disse à IPS por telefone desde a localidade onde reside.

Várias pessoas viram muitos corpos jogados nas ruas e contaram sobre bairros bombardeados. Os refugiados descrevem a presença de homens vestidos de preto mascarados que lutavam junto dos soldados. Eles os chamam de “shabiha”. Segundo Suad, “integrantes do quarto regimento do Exército enviaram aluitas armados das aldeias vizinhas para atacarem nossas casas. Não podemos voltar”.

É difícil verificar a quantidade de refugiados de forma independente porque as autoridades sírias proibiram a presença de jornalistas estrangeiros. Outro problema dos refugiados é seu status legal no Líbano. Alguns, inclusive, foram detidos pelas autoridades. As forças de segurança libanesas prenderam nove homens sírios e um menino no dia 15 por entrarem no país ilegalmente, afirmaram. “Conheço 15 casos de refugiados detidos, muitos estão feridos e sob custódia em hospitais”, disse Daher.

O Exército libanês, que reforçou sua presença na fronteira, informou que deteve três soldados sírios considerados desertores, e ignorou o fluxo de refugiados. “Não cremos que mulheres e crianças sejam uma ameaça à segurança, mas os desertores são outro assunto”, disse uma fonte militar. “Temos de entregá-los à Síria, pois não estão qualificados para o status de refugiado segundo o acordo assinado pelos dois países. Não queremos que pensem que interferimos em seus assuntos internos”, acrescentou a fonte. Envolverde/IPS