Berlim, Alemanha, 23/3/2012 – Quase todo o socialismo europeu apoia seu correligionário François Hollande em seu caminho para chegar ao governo da França, com o desejo de que uma vitória sobre o presidente Nicolas Sarkozy crie um movimento que acabe com as atuais políticas de austeridade conservadoras na região.
As últimas pesquisas alentam a esperança de que o candidato do Partido Socialista ganhe as eleições presidenciais francesas, dia 22 de abril, com um possível segundo turno em 5 de maio. Hollande obteve 55% de adesões entre os entrevistados sobre intenção de voto para um eventual segundo turno, conforme os dados divulgados no dia 19.
Dirigentes de quase todos os partidos socialistas e social-democratas europeus se reuniram, no dia 17, em Paris, para apoiar Hollande. Todos consideram de suma importância as eleições presidenciais na França para definir o futuro social e econômico do continente no médio prazo. O apoio unânime ao candidato socialista, que declarou que seu “verdadeiro adversário são as finanças”, coincide com a volta do tema da justiça social na Europa como um assunto mais urgente do que nunca.
O desemprego dos jovens bateu recorde na Grécia e na Espanha, afogadas pelas dívidas, e em Portugal a mortalidade de idosos atingiu máximos históricos. Stefan Ulrich, correspondente na França do jornal alemão Dei Sueddeutsche Zeitung, escreveu, ao comentar a cúpula do final de semana: “A Europa esqueceu suas próprias crianças. Por isso, a esquerda acredita que chegou a hora”.
Além disso, esses três países do Mediterrâneo, aos quais se soma a Itália, sofrem uma grave recessão, agravada pelos programas de austeridade impostos pela União Europeia (UE) e pelas instituições financeiras internacionais. A incerteza fiscal e a que pesa sobre o crescimento fazem com que seja muito pouco provável que estas nações aumentem seus orçamentos e as capacidades econômicas, ao mesmo tempo em que reduzem suas dívidas.
O contexto macroeconômico também reflete a crescente desigualdade de renda no continente. Os salários dos grandes empresários continuam sendo descomunais em comparação com o de um empregado médio da UE. No entanto, os impostos pagos pelas grandes companhias chegaram a um ponto historicamente baixo, especialmente os bancos e os fundos de investimento. Na Alemanha, por exemplo, a imprensa local revelou há pouco que Martin Winterkorn, diretor-geral e presidente da Volkswagen, recebeu 17,4 milhões de euros (US$ 23 milhões) no ano passado.
Neste contexto, o programa de Hollande de aumentar os impostos para os setores acomodados, impor normas mais rígidas para as instituições financeiras privadas e aumentar o gasto público para promover o emprego juvenil e melhorar a educação, se assemelha ao New Deal social-democrata para a Europa. Por New Deal ficou conhecida a política implantada na década de 1930 pelo presidente dos Estados Unidos na época, Franklin D. Roosevelt (1882-1945), para sair da chamada Grande Depressão.
“As eleições presidenciais da França são um ponto de inflexão na política europeia”, declarou o esquerdista primeiro-ministro italiano, Massimo D’Alema, durante o encontro. “Primeiro tomaremos a França e depois a Europa”, previu, por sua vez, Johannes Swoboda, líder austríaco do grupo social-democrata do Parlamento Europeu. “Juntos mudaremos a Europa”, insistiu Sigmar Gabriel, presidente do Partido Social-Democrata alemão.
O apoio da esquerda europeia a Hollande é uma reação ao expressado pelos conservadores a Sarkozy. Seu objetivo é mudar os programas de austeridade, especialmente o chamado pacto fiscal imposto pelos governos do Mediterrâneo, para, supostamente, “dominarem” suas crises de dívida soberana. A chanceler da Alemanha, Angela Merkel, foi a que melhor expressou o apoio do bloco conservador a Sarkozy, em uma entrevista realizada em Paris e divulgada pela televisão: “Apoio qualquer coisa que fizer”, afirmou.
Merkel e Sarkozy, junto como o Fundo Monetário Internacional e a UE, foram artífices dos severos programas de austeridade impostos a Grécia, Espanha e Portugal nos últimos dois anos. Também tiveram um papel decisivo na redação e implantação do chamado pacto fiscal europeu. Hollande é o dirigente socialista que criticou com maior insistência esses programas.
Em sua campanha eleitoral prometeu renegociar o pacto fiscal, que prevê um limite para a dívida pública da UE, integrada por 27 países, sem aumentar a renda mediante uma reforma impositiva. Em um discurso programático pronunciado em janeiro, Hollande chegou a dizer que seu “verdadeiro adversário político era o mundo das finanças, que há 20 anos controla nossa economia, nossa sociedade, nossas vidas”.
Nessa oportunidade também denunciou o estilo neoliberal convencional de reativar a economia, que está em problemas desde que surgiram os primeiros sinais da crise financeira, em 2007. Hollande acrescentou que o único resultado tangível das várias cúpulas globais e europeias, além de agravar as lamentáveis condições de vida dos pobres, foi que “os bancos privados, os primeiros a serem resgatados pelo Estado, agora mordem a mão que lhes deu de comer”.
Além de novas regras para os bancos e os fundos de investimento, Hollande prometeu um imposto sobre a riqueza de 75% para reativar o emprego entre os jovens e a educação, e para reverter o aumento para se aposentar, uma reforma patrocinada por Sarkozy.
Os partidos social-democratas de oposição na Alemanha e na Itália se beneficiarão, de fato, de uma vitória eleitoral de Hollande. Nos dois países, as eleições gerais estão previstas para 2013, e terão que competir com os atuais chefes de governo. Merkel mantém um grande nível de popularidade após seis anos governando a Alemanha, apesar de numerosos contratempos com seu programa político e econômico, ou das duras reações contra figuras políticas de sua escolha.
Além disso, o Partido Social-Democrata deste país não se recuperou da perda de popularidade que sofreu durante seu governo (1988-2005), quando implantou cortes radicais nos programas de bem-estar e de pensões, bem como uma enorme desregulamentação no mercado de trabalho. Estas medidas, que aumentaram as desigualdades de renda, levaram numerosos cientistas sociais a qualificarem a situação de “oligarquização da sociedade alemã”.
D’Alema, que provavelmente encabeçará a coalizão opositora de esquerda na Itália nas eleições do próximo ano, também deverá enfrentar o atual primeiro-ministro, Mario Monti, que, apesar dos programas de austeridade impostos desde o último outono boreal, goza de importante apoio popular. Uma vitória de Hollande na França, mais uma possível vitória do Partido Social-Democrata na Alemanha, em eventual aliança com o Partido Verde, e um êxito da coalizão de esquerda na Itália em 2013, significará que os países mais importantes na união monetária europeia deixarão de ser governados por conservadores.
Os três países poderão unir forças com outros governos de esquerda da região, como Bélgica, Dinamarca, Áustria, Eslovênia e Eslováquia, para criar certo tipo de equilíbrio ou de frente unida contra os governos conservadores do resto da Europa, especialmente Grã-Bretanha, Finlândia, Irlanda, Holanda, Polônia, Portugal, Espanha e Suécia. Envolverde/IPS