Se os ativistas criarem seu próprio plano de ação para salvar a Terra, os governos não vão precisar negociar regras comuns para nações e comunidades desiguais em riqueza e capacidade técnica.
Nações Unidas, 14 de novembro de 2011 (Terramérica).- A menos que a sociedade civil organizada lance seu próprio plano de ação na Cúpula da Terra, a Rio+20, que acontecerá em 2012 no Rio de Janeiro, a conferência será pouco mais que um luxuoso debate. Isto porque os delegados governamentais não abordarão o problema de reorientar a economia mundial, tarefa que a Organização das Nações Unidas (ONU) considera essencial para enfrentar a crescente crise de sustentabilidade ambiental.
O informe, que no começo deste ano foi apresentado pelo secretário-geral, Ban Ki-moon, ao comitê organizador da Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), diz que, para tornar sustentáveis os modelos de consumo e produção, as políticas públicas devem ir “muito além” de corrigir os preços.
Entretanto, Ban não disse quais medidas específicas são necessárias. De fato, em nenhuma parte da enorme quantidade de documentos que a ONU produziu desde que convocou a primeira Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano, em junho de 1972, em Estocolmo, é possível encontrar uma única análise sobre esse tema.
A Agenda 21, o volumoso plano de ação adotado na Cúpula da Terra de 1992 no Rio de Janeiro, tampouco aborda o assunto, e a Comissão sobre o Desenvolvimento Sustentável, que vigiou sua implantação por duas décadas, não o considerou. O Estudo Econômico e Social Mundial que a ONU publicou este ano estima em US$ 72 trilhões o custo de fazer verde a economia mundial, sem detalhar como.
Estas lacunas refletem uma inquestionável realidade política contemporânea: o poder das corporações, que dominam a economia verde e que estabeleceram os atuais modelos de produção e consumo com o objetivo de maximizar seus ganhos e opor-se aos acordos que tentarem restringir seus efeitos sociais e ambientais negativos.
Entre as décadas de 1970 e 1980, a ONU tentou sem sucesso negociar um código de conduta para as corporações transnacionais. Na década posterior, tentou um enfoque mais brando, convidando-as a se integrarem ao Pacto Mundial para o cumprimento voluntário de uma série de padrões ambientais e de direitos humanos. Menos de cinco mil das 60 mil corporações com lucros anuais superiores a US$ 1 bilhão uniram-se ao Pacto Mundial. E mesmo este minúsculo número mascara seu verdadeiro impacto, já que inclui empresas pequenas e médias, muitas de países em desenvolvimento.
Durante este prolongado ponto morto, os problemas ambientais adquiriram proporções de catástrofe. A contaminação e a perda de habitat levam espécies à extinção a um ritmo que não se via desde o desaparecimento dos dinossauros. Na última década, condições meteorológicas extremas, que os cientistas associam com o aquecimento global, causaram desastres naturais sem precedentes em todo o mundo.
A menos que se freie o aquecimento global, os cientistas projetam mudanças significativas em chuvas e secas, com importantes consequências para a produtividade agrícola. Se nada for feito para evitar o aquecimento do planeta, o mundo poderá ter uma era de guerras pela terra que destruiriam todo sinal de legalidade e ordem internacional.
Apesar destas perspectivas aterradoras, poucos governos estão dispostos a enfrentar os interesses corporativos. Neste cenário, a sociedade civil organizada é a que pode elaborar uma estratégia de saída segura. Conhece a natureza e o alcance dos problemas ambientais, e a internet lhe deu uma capacidade sem precedentes para criar redes mundiais.
Se o ativismo combinar esses elementos com a capacidade local para a ação efetiva –o mais simples seria aliar-se a pequenas e médias empresas–, poderia criar um mecanismo poderoso e flexível, capaz de traçar o mapa dos problemas ambientais, controlar seu desenvolvimento e fazer-lhes frente, promovendo ao mesmo tempo atividades econômicas amigáveis com a natureza nos âmbitos regional e local. Assim, se moveria gradualmente a economia mundial dos enormes intercâmbios internacionais, que desperdiçam gigantescas quantidades de energia e recursos naturais, para modelos de atividade regional e sub-regional muito mais eficientes.
Semelhante mudança teria impactos mínimos na criação de riqueza e postos de trabalho. De fato, como as empresas médias e pequenas são muito mais intensivas em mão de obra do que os monstros que hoje controlam a economia mundial, veríamos uma ascensão do emprego, da demanda e de um crescimento socialmente justo. Os governos não precisariam negociar regras comuns para nações e comunidades terrivelmente desiguais em riqueza e capacidade técnica.
Se as decisões e as medidas ficassem completamente nas mãos de autoridades nacionais e locais, a rede mundial se converteria em um poderoso mecanismo de solidariedade internacional, transferência de tecnologia e apoio financeiro, coordenando ações onde fosse necessário e divulgando as melhores práticas. Precisamos ir à Rio+20 preparados para acordar um manifesto que recolha estes princípios e um plano de ação detalhado com o rascunho a seguir.
Plano de ação
No contexto dos objetivos e valores já expressos, os ativistas presentes na conferência Rio+20 acordam:
1. Rede – Os ativistas criarão uma rede eletrônica mundial organizada em uma estrutura de acesso simples (local, nacional, regional, mundial) para facilitar a informação compartilhada, o debate interativo e a ação concertada;
2. Organização – Os ativistas trabalharão com empresários que estiverem à frente de empresas pequenas e médias para criar organizações comunitárias para a ação cooperativa. Estas organizações serão as unidades básicas da rede mundial e terão dois objetivos principais: proteger o meio ambiente e acelerar o crescimento econômico nos planos local, sub-regional e regional;
3. Inspeção e controle – A rede compartilhará os melhores conhecimentos disponíveis nas agências nacionais e internacionais, e o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente desempenhará um papel de coordenação. Os ativistas iniciarão uma pesquisa ambiental mundial alimentada com contribuições comunitárias, criando um sistema de controle permanente para dar informes de situação em tempo real às autoridades nacionais, regionais e mundiais;
4. Análise – Com base na informação coletada, um grupo especialista governamental que trabalhará com a rede criará um plano técnico de medidas preventivas e corretivas para todos os problemas ambientais mundiais. O plano será implantado mediante a ação comunitária, onde for possível, e os governos e agências internacionais darão capacidade financeira e técnica;
5. Educação e mobilização – As organizações comunitárias e suas redes se dedicarão a educar e mobilizar apoio popular para a ação ambiental
Estes passos deveriam criar um aparato mundial capaz de fiscalizar os danos causados pela ação humana e de assumir sua remedição. Esse processo deveria reorientar toda a gama de atividades econômicas para modelos amigáveis com o meio ambiente, e criar e sustentar o apoio da opinião pública para uma ação permanente.
* Bhaskar Menon tem quatro décadas de experiência na cobertura da Organização das Nações Unidas e edita www.UNdiplomatictimes.com.
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Stakeholder Forum, em inglês
Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.