Tóquio, Japão, 25/4/2011 – O devastador terremoto e tsunami de 11 de março colocaram em relevo o papel crucial das organizações não governamentais japonesas, que tradicionalmente carecem de peso político. “Milhares de pessoas uniram-se aos nossos protestos contra a energia nuclear nestas semanas posteriores ao desastre. Isto mostra uma enorme mudança em relação ao passado, quando lutávamos para obter atenção do público”, disse Sawako Sawaii, porta-voz da não governamental Rede Cidadã de Informação Nuclear (CNIC).
A crescente popularidade da CNIC agora é a força motora por trás das manifestações habituais em todo o país contra a Companhia de Energia Elétrica de Tóquio, que operava a central nuclear de Fukushima, danificada pelo terremoto. “Suponho que a tragédia fez o público despertar para o papel crucial que tem a sociedade civil”, disse Akiko Nakajima, especialista em construções pós-desastres na Universidade Wayo de Mulheres. “Com a rápida erosão da confiança no governo depois do acidente nuclear, as pessoas já não estão contentes com os funcionários” que estão no poder, afirmou.
O avanço da sociedade civil no Japão enfrenta uma longa história de conservadorismo, que priorizou a harmonização social acima dos interesses individuais, criando uma sociedade baseada em normas rígidas que forçaram as pessoas a se conformarem com as regulações oficiais, explicou Akiko. Entretanto, como agora o Japão se esforça para frear a contaminação radioativa dos reatores nucleares que os funcionários governamentais haviam prometido que seriam a toda prova, a fragilidade do velho sistema ficou exposta, acrescentou.
O movimento antinuclear japonês abre caminho de maneira dinâmica. O jornal Asahi informou na semana passada que 41% dos entrevistados por telefone são contra, ou querem redução, a energia nuclear. Isto supõe um drástico aumento em relação aos 28% registrados em pesquisa feita em 2007. Os dados também revelaram que apenas 5% querem aumento da energia nuclear, muito menos do que os 13% anteriores.
As incursões das redes sociais na sociedade japonesa se fortaleceram especialmente depois do terremoto de 1995 em Kobe, quando os ativistas ganharam o respeito do público por seu trabalho voluntário na ajuda às vítimas, disse Fumihiro Maruyama, do Centro de Pesquisas em Educação, da Universidade Nacional. O desastre causado pelo terremoto e tsunami do mês passado deixou clara a importância do contato entre as pessoas, afirmou.
“Organizações da sociedade civil preparam alimentos, ajudam os idosos a caminharem ou tomarem banho nos centros para desabrigados, que passaram a um primeiro plano por seu crucial papel. Os funcionários do governo simplesmente não podem enfrentar a situação sem essa ajuda”, disse Fumihiro. Segundo os especialistas, a catástrofe afetou as comunidades agrícolas e pesqueiras, integradas por pessoas mais velhas cujos filhos vivem nas grandes cidades. A comunidade rural envelhecida depende cada vez mais do apoio alheio.
“Já não existe a sociedade japonesa tradicional, onde a norma era as grandes famílias se ajudarem entre si. Há muita necessidade da ação dos voluntários. Os conselhos locais não estão contra as mudanças simplesmente porque têm de aceitar a realidade”, disse Fumihiro. Outro marco do poder da sociedade pôde ser observado no dia 20. A filial da Rede de Mães Lactantes em Koriyama, Fukushima, deu sua primeira entrevista coletiva para lançar uma convocação nacional a fim de pressionar o governo japonês a iniciar o controle da contaminação radioativa no leite materno.
A organização responde a uma ansiedade pública cada vez maior em torno dos níveis de radiação no ar, na água e nos alimentos por causa do vazamento nos reatores, explicou à IPS a porta-voz da entidade, Kikuko Murakami. O governo determinou que escolas e jardins de infância reabrissem hoje, argumentando que não há riscos para a saúde humana.
“Contudo, com a notícia de que continua o vazamento de radiação, o governo deve fazer mais. Uma de nossas reclamações é que organizações sem vínculos com o governo realizem controles, bem como compromissos para garantir a evacuação das mães lactantes depois que uma análise de seu leite mostrou maior contaminação radioativa”, disse Kikuko.
Se forem atendidas essas reclamações, os ativistas estarão iniciando, ou pelo menos assentando, as bases para novas condições sem precedentes na política nuclear do Japão. Entretanto, Sawako está encantada com o estado de ânimo público, e também acredita que resta um longo caminho pela frente. “Nosso desafio é manter esta crescente mudança no público, que pode enfraquecer com o passar do tempo”, afirmou.
Sawako acrescentou que os ativistas tiveram que enfrentar empresas poderosas e ricas e entidades governamentais que impulsionaram uma retórica segundo a qual a energia nuclear é imperativa para que o Japão reduza seus gases-estufa, além de ajustar-se a um país que depende do petróleo estrangeiro. “Agora estamos lutando para que as empresas de energia usem novas estratégias para aplacar a ansiedade pública prometendo o uso tecnologias sofisticadas que garantem a segurança”, ressaltou. Envolverde/IPS