Dehradun, Índia, 8/10/2013 – Em Uttarajand, Estado indiano ao pé da Cordilheira do Himalaia, que foi vítima de mortais inundações em junho, conta-se a história de um menino que todos os dias ia ao heliporto esperar pela volta de seu pai, que, na realidade, morrera no desastre. Há muitos casos como o seu, disse à IPS Ray Kancharla, da organização Save the Children.
Os socorristas que fazem os trabalhos de busca e resgate sempre estão apurados e não têm tempo de controlar quantos membros de uma família conseguiram localizar e quantos estão perdidos. Somente retiram os sobreviventes que podem ver e os levam para diferentes abrigos. A reunificação das famílias passa a ser trabalho de outras entidades.
As inundações de junho mataram pelo menos mil pessoas e deixaram milhares de famílias desabrigadas. As crianças são as mais vulneráveis nestes casos. Junto com as mulheres, os velhos e os doentes, exigem atenção especial nas zonas de desastre. Quando sobrevivem, não podem enfrentar as consequências e lhes custa encontrar os socorristas ou chegar até onde está a ajuda, seja alimento ou abrigo. A separação familiar é um trauma particular para as crianças.
Em janeiro de 2010, um terremoto atingiu Papua Nova Guiné, pequeno Estado insular do Oceano Pacífico, e todas as vítimas mortais registradas foram crianças, porque somente os adultos haviam recebido treinamento para reduzir o risco de desastres, o que lhes permitiu saber que quando o mar recua pressagia um tsunami mortal. Por esse motivo “não morreu nenhum adulto”, já que todos “fugiram para terrenos mais altos”, disse Aloysius Laukai, da rádio New Dawn FM.
“Traçar o mapa dos frágeis, dos doentes e dos idosos é muito importante em qualquer área propensa a desastres”, resaltou à IPS Aapga Singh, da organização não governamental HelpAge India. “Não é útil só para resgatar essas pessoas com eficácia durante as emergências, mas também para proporcionar-lhes alívio. As pessoas vulneráveis ficam para trás ou são as últimas a serem resgatadas”, pontuou Singh após as inundações em Uttarajand.
Há crianças separadas de seus pais em cada calamidade natural. Depois do tsunami asiático de dezembro de 2004, uma menina de sete anos se perdeu de sua família e só conseguiu reencontrá-la no ano passado, em Sumatra, na Indonésia. A memória do público é curta, mas o trauma dos sobreviventes pode durar uma vida inteira. Ativistas pedem que as lições aprendidas sejam documentadas e tornadas públicas para evitar que os desastres caiam uma e outra vez em zonas afetadas por catástrofes.
As separações familiares foram inúmeras depois do tsunami asiático e de outros desastres naturais na Índia, como as inundações de Kosi (2008), Assam (2012) Uttarajand (2013), o ciclone Aila (2009, que também afetou Bangladesh) e o superciclone em Orissa (1999).
O trauma infantil se manifesta de várias formas. “Chupar o dedo, molhar a cama, aferrar-se aos pais, ter alterações do sono, perder o apetite, ter medo do escuro, adotar condutas mais infantis e se afastar de amigos e costumes”, afirmou Murali Kunduru, da organização não governamental Plan India. Para tratar crianças que perdem o apetite, traumatizadas pela separação de sua família, é crucial que as medidas alimentares considerem seus costumes e alimentos preferidos. Além da comoção que causa a separação e da batalha que é travada para não sucumbir às calamidades, mulheres e crianças sofrem especialmente falta de água e de saneamento.
“Sem alimentos adequados, crianças e adultos perdem imunidade e ficam predispostos a contrair diarreia, cólera, febre tifoide, infecções respiratórias, dermatológicas e oculares, cuja ocorrência é provável quando os desastres alteram o fornecimento de água e o saneamento”, destacou Kunduru. As mães que amamentam devem ser alojadas em abrigos com privacidade adequada e sensibilidade de gênero. Também são necessárias instalações apropriadas, que devem ser previstas na fase de construção, para abrigar quem tem deficiências físicas.
Devido às inundações, o turismo de Uttarajand ficou tão prejudicado que as pessoas que dele viviam tiveram que procurar emprego em cidades maiores nas planícies. “Os desastres também afetam a educação. Quando os adultos migram em busca de trabalho, os adolescentes ficam encarregados das famílias e é comum as crianças, especialmente os meninos, abandonarem a escola para ganhar a vida. Isso pode ter um impacto na educação, por toda a vida”, disse Shejar Ambati, da Aide et Action.
Como as mulheres saem de casa para complementar a renda familiar, a alimentação infantil também sofre. A exclusão agrava os danos das catástrofes, insistem os especialistas. Por isso, recomendam, as bases de dados sobre população, padrões de consumo, nível de vida e índice de desenvolvimento humano devem ser parte dos planos de resposta aos desastres naturais. Envolverde/IPS