Na era das manifestações planejadas pela internet, sem intermédio de partidos ou entidades sindicais, a convicção de ter abandonado o pragmatismo da política parecia ser o tom almejado por Marina Silva ao anunciar oficialmente a saída do PV. Com futuro incerto, a ex-senadora e ex-ministra do Meio Ambiente terá tempo (e apoio), até 2014, para montar o um movimento em sua inspiração para supostamente inaugurar no País uma “nova maneira de fazer política”.
A descrença de um eleitorado jovem, desligado das formas tradicionais de representação e cada vez mais ligados em debates das redes sociais, é a isca para angariar apoio a um movimento até o momento sem nome, sem sede e sem discurso claro. No QG do grupo, uma escola de dança na Vila Madalena, em São Paulo, Marina defendeu a necessidade de se fazer uma política impulsionada por sonhos, sem a “burocracia” do que chama de “partidos cartórios”. Pudera: acabava de perder a queda de braço para o que havia de mais tradicional e fisiológico no agora antigo partido, personalizado no seu presidente, José Luiz Penna.
“Queremos anunciar do ponto de vista estético uma nova maneira de fazer política”, afirmou Maurício Brusadin, um dos principais apoiadores do grupo, ao discursar no evento. Esse “ponto de vista estético” parecia inspirar a geografia da sala, com os políticos de renome sentados em meio círculo – o que não impediu que um palanque fosse colocado especialmente para Marina.
Em sua oportunidade, a ex-presidenciável – capaz de obter 20 milhões de votos nas eleições presidenciais de 2010 e forçar o segundo turno em meio a troca de acusações que atingiram José Serra (PSDB) e Dilma Rousseff (PT) – não conseguiu esclarecer nenhum plano prático.
Em meio a uma decoração turquesa (aquele azul misturado ao verde e que não é nem uma cor nem outra), ela disse não saber se vai se candidatar ou se vai criar um novo partido. Também não conseguia sorrir nem se emocionar. No momento, diz ela, o que importa é construir essa nova política, sem recair nas práticas da política padrão. Ela chegou vestida com cores sóbrias, coberta por um xale marrom, que tirou ao subir no palanque.
A internet e a juventude são as grandes apostas desse movimento. Talvez seja por isso que Eduardo Rombauer, 31, apoiador do grupo de Marina, tenha sido um dos primeiros a discursar. Romabauer reafirmou sua descrença em partidos, se disse contra o monopólio de alguns sobre a política e assumiu sua devoção à ex-senadora.
Devoção que se via pelo tom religioso conferido ao evento, no qual discursaram a pastora Valnice Milhomens, representando a ala evangélica do grupo, o padre Afonso, deputado estadual de São Paulo pelo PV, que se disse apaixonado por Marina, e as principais figuras do grupo marineiro: Alfredo Sirkis (que preferiu ficar no PV), Ricardo Young (que saiu junto com ela) e algumas presenças “virtuais” – casos de João Paulo Capobianco e Fernando Gabeira, que fizeram suas falas por meio de vídeo e pelo Skype.
Em seu último discurso como filiada do PV, Marina inovou no “marinês”. Disse que não era hora de ser pragmático, mas sim “de ser sonhático e de agir pelos nossos sonhos”. No novo grupo, o racha é definido como um “transbordar”. Marina tentou esclarecer as quatro possibilidades para quem era do PV: se desfiliar, manter-se com postura crítica, se licenciar ou manter-se acriticamente.
Só não é possível dizer se o plano colocado em prática no ato de quinta-feira vai torná-la uma opção viável para 2014 ou se vai simplesmente dispersar o eleitorado que forçou o segundo turno em 2010.
* Publicado originalmente no site da revista Carta Capital.