TERRAMÉRICA - Desperdício da riqueza dos desertos

O México ainda não possui projetos rentáveis de jojoba. Foto: Desert Whale Jojoba Company.

A jojoba e o guaiúle são apenas dois exemplos de arbustos mexicanos com valiosas propriedades que não são aproveitadas.

Cidade do México, México, 3 de outubro de 2011 (Terramérica).- O deserto do norte do México possui espécies vegetais pouco estudadas que podem fornecer soluções sociais, econômicas e ambientais. O guaiúle (Parthenium argentatum Gray), um arbusto nativo do Deserto de Chihuahua, ao longo da fronteira entre o México e os Estados Unidos é uma fonte de látex natural, alternativa ao extraído da seringueira (Hevea) e livre de seus efeitos alergênicos para a manufatura de uma ampla variedade de objetos na medicina, como luvas e cateteres.

A jojoba (Simmonsdia chinensis), originária do também fronteiriço Deserto de Sonora e do Deserto de Mojave, no sul dos Estados Unidos, é a única planta que produz cera líquida ou éster, empregada em cosméticos, lubrificantes, plásticos e biodiesel. As histórias dos dois arbustos são muito diferentes. A produção de jojoba experimentou uma relativa prosperidade, e o guaiúle foi desprezado depois de sua explosão comercial na primeira metade do século passado.

“Depois de um intenso esforço realizado nos anos 1970 e 1980 para levá-lo à sua comercialização, o guaiúle ficou arquivado devido ao boom do petróleo. Atualmente não é explorado. É um potencial que está ali, e são necessários recursos estratégicos de longo prazo”, disse ao Terramérica o pesquisador Enrique Campos, do Centro de Pesquisa e Assistência em Tecnologia e Projeto do Estado de Jalisco, no oeste mexicano. Na década de 1980, Campos liderou o projeto e a construção de uma instalação para extrair e processar o látex no Centro de Pesquisa em Química Aplicada (CIQA), localizado na cidade de Saltillo. Porém, a iniciativa não foi em frente.

O arbusto ficou conhecido em 1911, quando o norte-americano Francis Ernest Lloyd, professor de fisiologia das plantas do Alabama Polytechnic Institute, publicou o livro “Guayule: a Rubber Plant of the Chihuahua Desert (Guaiúle: uma Planta de Látex do Deserto de Chihuahua), depois de explorar a região para a Continental-Mexican Rubber Company e a Intercontinental Rubber Company. Segundo a mexicana Comissão Nacional para o Conhecimento e Uso da Biodiversidade (Conabio), destaca-se por sua capacidade de conservar o solo, controlar a erosão e melhorar a fertilidade.

A jojoba, segundo a Conabio, tem valor para a restauração de terras degradadas. A Biblioteca Digital da Medicina Tradicional Mexicana atribuiu às suas sementes e flores, quando fervidas, faculdades para acalmar a tosse, e ao fruto triturado, untado no couro cabeludo, a propriedade de deter a queda do cabelo. As duas plantas eram utilizadas pelos povos indígenas pré-hispânicos. No norte, os chichimecas recorriam ao látex do guaiúle para os equipamentos do jogo de bola, e os seris, que são de Sonora, usam as sementes da jojoba em ritos ancestrais e para curar feridas e batidas.

Em uma pesquisa de 2003, “Guaiúle: Relação entre Produção de Biomassa, Síntese de Látex e Condições Climáticas”, os pesquisadores Diana Jasso e Raúl Rodríguez, da estatal Universidade Autônoma Agrária Antonio Narro, e José Angulo, do CIQA, destacaram a importância da relação entre a temperatura ambiente e as chuvas na síntese da borracha contida no látex. “Os baixos níveis de chuvas aumentaram o acúmulo de látex, enquanto os níveis altos de chuva não o melhoraram. Contudo, a precipitação alta também melhorou a produção de biomassa”, diz o estudo.

Os principais produtores de jojoba são Argentina, Israel, Estados Unidos, Austrália, Peru e México. Segundo a Conabio, alguns projetos de produção de jojoba fracassaram no México pela duplicidade de funções dos órgãos envolvidos e a confusão que tais situações geraram entre os produtores. Entretanto, “os mercados terão que se desenvolver para que o preço das sementes possa permanecer relativamente constante e com um retorno econômico para os agricultores, antes que esta planta possa ser produtiva”, declarou ao Terramérica o diretor do Centro Agrícola de Maricopa, da estatal Universidade do Arizona, Robert Roth.

Esta instituição estuda a jojoba e o guaiúle, entre outras espécies. De fato, no sul dos Estados Unidos ambas são estudadas com maior profundidade, embora ainda não haja um desenvolvimento em grande escala. Apenas uma propriedade produtora de jojoba está em atividade, depois que foram plantados centenas de hectares a partir da crise do petróleo de 1973.

Diante desse cenário, Campos afirma que “muitos recursos nessa região devem ser vistos à luz de novos avanços científicos, em questões de genética, agronômicos e processos industriais. Se deveria começar essas avaliações preliminares e, nos casos em que fosse interessante, buscar a forma de iniciar projetos estratégicos”. Para Roth, “o primeiro a ser desenvolvido é um mercado onde o óleo possa ser vendido. Este mercado tem de ser grande o suficiente para que o plantio de jojoba não ultrapasse a demanda.

* O autor é correspondente da IPS.

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Biodiversidade – Cobertura especial da IPS, em espanhol

Centro de Pesquisa e Assistência em Tecnologia e Projeto do Estado de Jalisco, em espanhol

Centro de Pesquisa em Química Aplicada, em espanhol e inglês

Guaiúle (Parthenium argentatum Gray): uma Planta de Látex do Deserto de Chihuahua, em inglês

Comissão Nacional para o Conhecimento e Uso da Biodiversidade, em espanhol

Universidade Autônoma Agrária Antonio Narro, em espanhol

Guayule: Relação entre Produção de Biomassa, Síntese de Látex e Condições Climáticas, pdf em espanhol

Centro Agrícola de Maricopa – Universidade do Arizona, em inglês

Biblioteca Digital da Medicina Tradicional Mexicana, em espanhol

Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.