O Peru está embarcando em um esforço para aperfeiçoar o sistema que avalia os impactos ambientais das futuras atividades econômicas, com a mineração como protagonista estelar.
Lima, Peru, 30 de julho de 2012 (Terramérica).- Uma avaliação aleatória do governo do Peru sobre 205 estudos de impacto ambiental aprovados entre 2001 e 2010 comprova que 86% deles careciam de informação completa sobre como receberam luz verde das autoridades. Em 60% dos 205 casos analisados, a informação incompleta corresponde à difusão e participação da sociedade civil, 74% sobre admissibilidade dos estudos, e 95% a respeito da forma como foram aprovados os termos de referência para realizá-los.
Esses estudos de impacto ambiental são uma parte, representativa de diferentes atividades produtivas, dos 2.360 que o Estado aprovou entre janeiro de 2001 e novembro de 2010 e que em 62% correspondem a setores de mineração e energia, segundo informou em maio o vice-ministro de Gestão Ambiental do Ministério do Meio Ambiente, Mariano Castro, em uma reunião no Congresso. A sociedade civil apresenta propostas para enfrentar este problema, enquanto o governo assegura que fará mudanças.
De janeiro de 2006 até este mês de julho, 211 pessoas morreram e 2,7 mil ficaram feridas em conflitos sociais, a maioria de caráter ambiental, segundo a Defensoria do Povo. Em um ano de governo de Ollanta Humala, completado no dia 28, foram registrados 15 mortos e 430 feridos. Diante das críticas, que se intensificaram com as cinco mortes nas manifestações no começo deste mês contra o projeto de exploração de ouro Conga, o mandatário anunciou uma nova relação com a indústria mineradora, fonte primordial de divisas para este país.
O Conga, projeto da empresa de capitais transnacionais Yanacocha, na região de Cajamarca, gerou tamanho mal-estar pela suposta ruína que causaria a quatro lagos, que obrigou o governo a contratar uma perícia internacional dos estudos de impacto ambiental. Esta análise concluiu que apenas dois dos quatro lagos próximos que desapareceriam seriam esvaziados para extrair ouro, e os outros seriam usados como depósito de dejetos.
Não havia um estudo hidrológico e hidrogeológico detalhado, fundamental para prevenir vazamentos tóxicos da atividade de mineração, não incluía uma análise integral das microbacias que poderiam sofrer alterações, nem informou-se sobre o Conga a todos os povoados que seriam afetados. Organizações da sociedade civil entregaram ao Ministério do Meio Ambiente propostas para melhorar o mecanismo de avaliação ambiental estatal. A Sociedade Peruana de Direito Ambiental (SPDA), por exemplo, acaba de publicar um livro da advogada Isabel Calle no qual apresenta sete recomendações.
Uma delas é criar um órgão técnico, vinculado ao Ministério, que revise e aprove os estudos ambientais dos projetos em todos os setores da economia. Atualmente, cada pasta tem uma unidade encarregada, tanto para aprovação dos estudos ambientais como para promover os investimentos em seu setor. “Lamentavelmente, a população não confia na imparcialidade do Estado e considera que estes Ministérios sempre estarão do lado das empresas”, declarou Isabel ao Terramérica. “Contudo, se esta revisão passar para as mãos do Ministério encarregado da proteção do meio ambiente, poderá ser um bom sinal”.
A criação deste organismo foi discutida em uma comissão multissetorial, instalada no começo deste mês para melhorar as condições ambientais e sociais em que se desenvolvem as atividades produtivas, e que deve entregar no começo de agosto uma proposta de reforma, informou ao Terramérica o vice-ministro.
Mariano e a SPDA concordam que a passagem desta função estratégica para o Ministério de Meio Ambiente deve ser gradual, para não sobrecarregá-lo de trabalho. “Na medida em que estas recomendações forem integradas e servirem para reduzir os danos e aproveitar melhor as oportunidades, todos ganharão”, afirmou o vice-ministro. “Uma reforma melhorará a qualidade da decisão, ajudará a gerar confiança e reduzir a intercerteza e os conflitos”.
As empresas não se opõem às mudanças, desde que se respeite o prazo de 90 dias para aprovar os estudos de impacto ambiental, opinou o gerente de responsabilidade e meio ambiente da filial peruana da empresa canadense Barrick Gold, Gonzalo Quijandría. “Os organismos podem nos fiscalizar, mas que demonstrem sua qualidade técnica. Para as companhias é importante que qualquer nova ação não gere atrasos”, ressaltou ao Terramérica.
Um aspecto fundamental são os termos de referência: as especificações técnicas, os objetivos e a estrutura que deve ter cada estudo de impacto ambiental. A SPDA propõe fiscalizá-los mais estreitamente. Também sugere que o estudo de linha de base (a medição inicial de todos os indicadores que possam ser alterados pelo projeto produtivo) inclua informação sobre áreas de contingências, existência de ecossistemas frágeis, identificação de medidas de prevenção, mitigação e correção de potenciais danos e um plano de inclusão social e de compensação ambiental, entre outros aspectos.
O plano de inclusão social, segundo a SPDA, deve permitir que empresas e Estado executem planos conjuntos para garantir à população pobre que vive nas zonas mineradoras o acesso a serviços básicos e a emprego. Em uma reunião de julho de 2010, funcionários da Direção de Assuntos Ambientais da Mineroção disseram a empresários que vários estudos contratados de consultorias continham parágrafos inteiros copiados de outros documentos, o que indica pouca seriedade na avaliação de possíveis impactos, revelou uma pesquisa do IDL-Repórteres, um grupo independente de jornalistas.
Gonzalo admitiu que há estudos “de todo tipo”, mas as empresas estão dispostas a melhorar a qualidade, pontuou. Entretanto, “mesmo se tivermos um estudo feito por um prêmio Nobel, a população terá desconfiança, porque está induzida politicamente”, observou. Isabel acredita que devem ser fixados requisitos para os técnicos que elaboram os estudos, cuja infração dê lugar a sanções que podem chegar à suspensão do projeto, se forem comprovadas irregularidades como plágio ou falta de previsão dos danos. A SPDA também sugere um fundo para que a população contrate assessoria técnica, e um único caminho para solicitar todas as permissões, autorizações e demais trâmites com certificação ambiental.
Outras sugestões são facultar ao governo regional em questão entregar opiniões técnicas sobre os estudos de impacto ambiental e coordenar as diferentes instâncias do Estado para evitar que se sobreponham, em um mesmo lugar, direitos e concessões em ecoturismo, conservação ou usos florestais. Segundo o vice-ministro Mariano, é necessário atualizar o marco regulatório, os padrões de qualidade ambiental e os limites máximos permissíveis de certas substâncias em alguns setores, estabelecer protocolos e metodologias, e uniformizar critérios de revisão e aprovação.
Nem tudo deve recair sobre os estudos de impacto, afirmou ao Terramérica a gerente de Responsabilidade e Meio Ambiente da Sociedade Nacional de Indústrias, Cecilia Rosell. Deve-se considerar outras ferramentas que existem para a gestão ambiental e social, enfatizou. Para Manuel Glave, pesquisador principal do centro de estudos Grupo de Análise para o Desenvolvimento, as mudanças devem estar inseridas em um plano de ordenamento territorial, porque o que está em jogo é o acesso e o uso dos recursos naturais.
* A autora é correspondente da IPS.
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Sociedade Peruana de Direito Ambiental, em espanhol e inglês
Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.