TERRAMÉRICA – Guardiões da floresta seca
Aplaudidos inclusive por incrédulos, 16 camponeses conservam 2.400 hectares de floresta no Norte do Peru. Picota, Peru, 18 de abril de 2011 (Terramérica).
Aplaudidos inclusive por incrédulos, 16 camponeses conservam 2.400 hectares de floresta no Norte do Peru.
Pablo é o presidente da Associação Floresta do Futuro Olhos D’Água, criada em abril de 2006, que agora conta com 16 membros que decidiram privilegiar a proteção florestal em lugar de continuar cortando árvores para cultivar. A Associação foi a primeira a conseguir uma concessão de conservação privada e comunitária em San Martín. Sua luta, que começou em 2003, foi premiada por organizações não governamentais e aplaudida por muitos moradores, inicialmente incrédulos.
Nos últimos 50 anos, a conservação das florestas coube ao Estado, mas em 2000 a Lei Florestal de Fauna e Flora Silvestre estabeleceu que a sociedade civil também podia assumir a tarefa. Paulatinamente, as pessoas se organizaram em algumas regiões para aproveitar esta lei, como os agricultores de Picota. A moeda tem dois lados: cada ano o país perde 150 mil hectares de floresta pelo desmatamento da Amazônia. No entanto, quase 994 mil hectares são protegidos sob diferentes instrumentos, uma superfície maior do que a do Lago Titicaca.
“Quando chegamos, encontramos motosserras, máfias que queriam nos prejudicar e que nos denunciaram”, conta ao Terramérica Pablo, que entre 2007 e 2009 teve de enfrentar uma denúncia perante a promotoria do município de Pucacaca, ao qual pertence a floresta. Com apoio da não governamental Sociedade Peruana de Direito Ambiental (SPDA), Pablo e outros dirigentes puderam se livrar da denúncia e continuar trabalhando na conservação. Somente em maio de 2010, a Associação obteve a concessão pelo prazo de 40 anos.
Cinco dos 25 governos regionais têm competência para outorgar concessões florestais. San Martín foi o primeiro a fazê-lo e optou por projetos de conservação não madeireiros. “Estes agricultores trabalham pensando em proteger as cabeceiras de bacia”, disse ao Terramérica o biólogo Miguel Tang, da Associação Amazônicos pela Amazônia (Ampa). “É um grupo valioso que dedica seu tempo e renunciou ao cultivo em uma floresta para conservá-la. Creio que é o primeiro caso nacional”, acrescentou. Os agricultores migraram para a Ilha Falingahua, a uma hora da Olhos d’Água de furgão, onde plantam coco. Antes a caminhada podia demorar até quatro horas.
“Tentamos proteger a floresta de muitas formas: com a inscrição nos registros públicos, fixando marcos, com equipes de companheiros que cuidam dela, e conversando com as pessoas para que entendam que sem a floresta não teremos água nem vida”, conta Pablo. Em grupos de três, percorrem diariamente a floresta. Já colocaram 200 marcos de cem quilos para delimitar o território e evitar a entrada de lenhadores ou de empresas que plantam milho nos arredores. A floresta sofre várias ameaças. Quando a Associação começou sua tarefa, encontrou 60 hectares desmatados que se recuperaram de forma natural.
O nome deste hábitat se deve aos pequenos poços de água nas partes altas desta floresta encravada em um lugar onde o recurso hídrico é escasso. “Quando o macaco bugio (Alouatta seniculus), que tem cor laranja e é grande, começa a rugir, a floresta treme, mas se grita é porque vai chegar chuva”, conta Pablo. Seu paraíso também tem sapinhos coloridos, muitos insetos e uma grande variedade de árvores. “Há muita riqueza aqui, mas falta pesquisa”, acrescenta. Segundo pesquisas preliminares para elaborar o plano-piloto da região, Olhos d’Água tem árvores do tipo maçaranduba (Manilkara bidentata), endêmica das florestas secas, e janitá (Brosimum alicastrum), cujos frutos são como nozes pequenas de alto valor protéico.
Arnaldo Paredes, de 46 anos, acompanha o Terramérica na expedição e reconhece as pegadas dos animais, por exemplo, de uma anta que esteve ao pé de uma janitá. Os associados estão construindo um local para abrigar pesquisadores e visitantes e também um auditório. “E não estamos sozinhos”, ressaltou Pablo. Desde 2009, recebem recursos da embaixada da Finlândia e apoio das autoridades locais, bem como assessoria técnica da SPDA e da Ampa.
O que fizeram sozinhos foi decidir como gastar. Em lugar de comprar uma caminhonete com os quase US$ 28,8 mil entregues, em 2010, pela embaixada finlandesa, compraram um furgão que não custou mais do que US$ 5 mil. Dessa forma, puderam investir na fabricação dos marcos, em telefone celular (fundamental para uma comunicação rápida na guarda de uma área), e em um computador para redigir e guardar os projetos.
* O autor é correspondente da IPS.
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Lei Florestal e de Fauna Silvestre, pdf em espanhol
Sociedade Peruana de Direito Ambiental, em espanhol e inglês
Associação Amazônicos pela Amazônia, em espanhol
Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.




