TERRAMÉRICA - Novos problemas para os corais

Nos arrecifes de Bonaire, entre 20% e 30% de sua superfície ainda se mantém original. Foto: Living Oceans Foundation/IPS

O excesso de dióxido de carbono está afetando a acidez dos oceanos, que já absorveram cerca de um terço de todas as emissões humanas desse gás de efeito estufa.

Cairns, Austrália, 23 de julho de 2012 (Terramérica).- A maior parte dos corais do mundo prospera em zonas marinhas pouco profundas, às quais chega a luz que precisam para crescer. Contudo, o acelerado aumento do nível do mar, pelo derretimento dos gelos polares, porá fim a essa vantagem. Medições feitas em regiões tropicais revelam que a elevação de seus mares (de 3,3 milímetros ao ano) está ocorrendo em um ritmo mais acelerado do que o do crescimento de muitos corais nos últimos dez mil anos, indicam pesquisas divulgadas no XII Simpósio Internacional sobre Arrecifes de Coral.

A maioria dos corais só prospera em águas pouco profundas, às quais chega abundante luz solar. O Mar do Caribe teve, alguma vez, 60% de sua área coberta por corais, que hoje ocupam apenas 10% dela, disse o professor emérito Jeremy Jackson, do Instituto de Oceanografia Scripps da Califórnia, em seu discurso no Simpósio, que aconteceu entre os dias 9 e 13 deste mês, na cidade australiana de Cairns. “Os corais são ecossistemas cruciais e ameaçados”, ressaltou. A elevação do mar é apenas uma dessas ameaças, além da sobrepesca, da contaminação e do branqueamento provocado pelo aquecimento global, acrescentou.

Uma peça colorida de coral é formada por milhares de diminutos animais, pólipos, que criam ao seu redor esqueletos calcários com forma de taça, usando cálcio da água do mar. As cores são dadas pelas microalgas que vivem em simbiose com eles. Geração após geração, os pólipos coralinos vivem, constroem uma parte do esqueleto que depois será arrecife e morrem. Esse habitat que criam é para eles mesmos e para cerca de 30% de todas as espécies que habitam os oceanos.

Quando os corais sofrem temperaturas muito altas ou contaminação, começam a ficar descoloridos pela morte das algas, se tornam vulneráveis às doenças e morrem se o branqueamento durar muito tempo. Os corais fracos ou mortos se quebram e seus escombros são arrastados pelas ondas e por tempestades.

É possível que a Jamaica seja o país do Caribe onde os arrecifes tenham se deteriorado mais. Subsistem apenas entre 5% e 10%, por culpa da contaminação e da pesca excessiva. “Isto acontece pelo fato de a população ser muito pobre”, pontuou Jeremy. Entretanto, cada ilha é diferente. As também caribenhas Bonaire e Curaçao mantêm entre 20% e 30% de sua superfície original, que poderia ser aumentada com bom manejo, criação de áreas proibidas para pesca, redução da contaminação procedente da terra e acesso controlado de turistas, destacou.

“Os arrecifes proporcionam proteção costeira, alimentos, turismo e outros serviços importantes, e perdê-los terá enormes consequências para a sociedade humana”, disse Roberto Iglesias Prieto, pesquisador do Instituto de Ciências do Mar e Limnologia da Universidade Nacional Autônoma do México. Um estudo feito em Belize estima que, sem arrecifes para proteger as comunidades costeiras, as tempestades poderiam causar prejuízos de até US$ 240 milhões. Cerca de um bilhão de pessoas dependem direta ou indiretamente dos arrecifes para seu sustento, e mais de dois bilhões têm nos pescados e mariscos sua principal fonte de proteínas.

“Com exceção de uns poucos pontos muito isolados, a qualidade dos arrecifes coralinos se deteriorou em todo o mundo, e continuará em declínio”, indicou Roberto. “Perder os benefícios e serviços proporcionados pelos arrecifes será uma tragédia para a humanidade”, declarou ao Terramérica. Há consenso entre os cientistas de que é quase certo que esses serviços vitais se perderão, a menos que sejam tomadas medidas urgentes para reduzir as emissões de dióxido de carbono que esquentam e acidificam os oceanos.

“Quando o explorador britânico James Cook navegou por Cairns, há menos de 300 anos, a atmosfera continha 280 partes por milhão (ppm) de dióxido de carbono. Agora, são 392 ppm”, disse a cientistas Janice Lough, do Instituto Australiano de Ciências Marinhas. Nos oceanos tropicais, a maioria das espécies vive em águas que apresentam variação de temperatura muito reduzida, entre dois e três graus. Se as temperaturas sobem mais e por períodos prolongados, algumas não resistem e nem sempre podem ir para outra parte, acrescentou Janice. “Pequenas mudanças podem ter grandes impactos”, explicou ao Terramérica.

Em muitos arrecifes tropicais, o crescimento e a reprodução de peixes diminuem quando a temperatura da água aumenta apenas dois ou três graus, afirmou Philip Munday, pesquisador da Escola de Biologia Marinha e Tropical da Universidade James Cook, da Austrália. Uma mudança aparentemente pequena, mas inesperada, é que o excesso de dióxido de carbono está afetando a acidez dos oceanos, que já absorveram cerca de um terço de todas as emissões humanas desse gás de efeito estufa. Embora esse mecanismo ajude a reduzir o aquecimento do clima mundial, o excesso de dióxido de carbono está alterando a composição química dos oceanos, fazendo com que suas águas sejam 30% mais ácidas.

Philip também descobriu que a maior acidez oceânica afeta de modo surpreendente o comportamento dos peixes. “A acidez que estimamos haverá antes do final deste século afeta o sistema nervoso central de algumas espécies, alterando seus sentidos do olfato e da audição e suas reações”, explicou. Nessas condições, o colorido peixe palhaço (Amphiprion ocellaris), famoso por causa do filme Procurando Nemo, fatalmente se sentirá atraído pelo cheiro dos predadores, acrescentou. Estas “deficiências sensoriais” dos peixes de arrecife e dos grandes predadores marinhos vão se manifestar quando houver na atmosfera entre 600 e 850 ppm de dióxido de carbono, que é o esperado para antes do final deste século se não forem adotadas medidas para reduzir as emissões, concluiu Philip.

A velocidade destas transformações dos oceanos é a maior já enfrentada pela capacidade de adaptação das espécies, segundo mais de 2,5 mil cientistas marinhos afirmam na Declaração de Consenso sobre Mudança Climática e Arrecifes de Corais, divulgada no Simpósio. No entanto, há “lampejos de esperança”, por exemplo em Bonaire, Curaçao e outros lugares onde se pôs em prática um bom manejo dos arrecifes e foram reduzidos os impactos sobre estes sistemas, enfatizou Jeremy. “Felizmente, as ações positivas para a sociedade humana (como reduzir as emissões) também são boas para os arrecifes”, observou.

* O autor é correspondente da IPS.

 

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XII Simpósio Internacional sobre Arrecifes de Corais, em inglês

Declaração de Consenso sobre Mudança Climática e Arrecifes de Corais, em inglês

Instituto de Ciências do Mar e Limnologia da Universidade Nacional Autônoma do México, em espanhol

Instituto Australiano de Ciências Marinhas, em inglês

Universidade James Cook, em inglês

Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.