O mundo em desenvolvimento chega à conferência de Durban com as credenciais de ter contribuído de modo substancial para reduzir a contaminação que causa a mudança climática.
Berlim, Alemanha, 28 de novembro de 2011 (Terramérica).- Os argumentos de alguns países industrializados, que acusam as nações em desenvolvimento de não agirem de maneira consequente na redução de emissões que provocam a mudança climática, são falsos, segundo estudos de renomadas instituições acadêmicas. Os países em desenvolvimento (particularmente os de economia em forte crescimento, como China e Índia) reduziram, desde 1990, suas emissões de dióxido de carbono de maneira considerável e se comprometeram com reduções futuras proporcionalmente maiores do que fizeram as nações desenvolvidas.
Estes dados constituem novas bases de negociação para a 17ª Conferência das Partes (COP 17) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática, que acontece entre 28 de novembro e 9 de dezembro na cidade sul-africana de Durban. O informe Comparison of Annex 1 and Non-Annex 1 Pledges Under the Cancún Agreements, preparado por Sivan Kartha e Peter Erickson, do Instituto Ambiental de Estocolmo (SEI), analisa quatro estudos das promessas de redução de emissões de gases-estufa de países industrializados (listados no Anexo 1 do Protocolo de Kyoto) e de nações em desenvolvimento.
O informe, apresentado em junho, conclui que “existe amplo consenso de que os compromissos dos países em desenvolvimento implicam mais mitigação do que os dos países desenvolvidos”. Em entrevista ao Terramérica, Sivan, pesquisador decano de manejo de riscos climáticos do SEI, disse que esta conclusão “se aplica a todos os estudos e a todos os casos analisados, apesar da diversidade de suposições e de metodologias empregadas para quantificar as promessas de redução”.
Além disso, segundo Sivan, as reduções reais de emissões de nações industrializadas são consideravelmente menores do que as promessas, pois estas incluem regras de medição que distorcem os resultados, como duplicações, transferência de emissões do mundo industrial para países em desenvolvimento por intermédio de importações de bens manufaturados, e falsas estimativas sobre o uso da terra e do desmatamento. O pesquisador alertou ainda que as promessas globais de redução de gases-estufa, acordadas nas conferências de Kyoto (1997), Copenhague (2009) e Cancún (2010), “são insuficientes para limitar o aquecimento global a dois graus centígrados. É muito provável que com tais promessas a temperatura suba até cinco graus”.
Os resultados do segundo estudo “Fair Shares: Crediting Poor Countries for Carbon Mitigation”, jogam por terra “o ponto de vista condicional sobre o conflito Norte-Sul que domina as negociações climáticas mundiais, porque mostra que as nações em desenvolvimento, queiram ou não, participam de maneira crucial da mitigação do carbono”. O autor, David Wheeler, especialista em economia ambiental do Centro para o Desenvolvimento Global (CGD), disse ao Terramérica que, segundo suas estimativas, “47% do crescimento mundial da energia de baixa intensidade de carbono, desde 1990, corre por conta dos países em desenvolvimento. Sem os investimentos desses países em energia limpa as emissões globais seriam muito superiores”.
Para David, tais investimentos permitiram economizar 1,6 gigatoneladas (1,6 bilhão de toneladas) anuais de gases-estufa até 2008, enquanto as reduções obtidas pelo mundo industrializado alcançaram 1,3 gigatoneladas. A China reduziu 442 milhões de toneladas, enquanto as reduções correspondentes aos Estados Unidos foram de 329 milhões de toneladas, explicou David. Sivan, que participa da COP 17, ponderou que o mundo em desenvolvimento deveria continuar, em essência, as políticas praticadas desde 1990, mas “melhorando sua coordenação, tentando alcançar unanimidade e melhor cooperação em dois aspectos principais”.
“O primeiro é a efetividade ambiental. Todos os países em desenvolvimento deveriam apoiar, em Durban, a aprovação de um regime internacional suficientemente ambicioso para frear a mudança climática”, propôs Sivan. Trata-se de apoiar com energia a proposta que coordenaram em outubro o Grupo Africano, os Pequenos Estados Insulares, os Países Menos Adiantados e a Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América.
“Esse regime teria que ir além das promessas feitas na conferência de Copenhague, que nos colocam no caminho de um aumento de até cinco graus, e muito além da posição do Grupo dos Oito, que implica risco de 50% de que o aquecimento global exceda os dois graus Celsius”, alertou Sivan. O G-8 é integrado por Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Grã-Bretanha, Itália, Japão e Rússia. O objetivo de Durban deve ser o de manter a elevação da temperatura média abaixo de 1,5 graus, acrescentou.
O segundo aspecto é da igualdade, segundo Sivan. “Os países do Basic (Brasil, África do Sul, Índia e China) reiteraram que o regime internacional para reduzir as emissões de gases deve ser equitativo para que funcione”. Estes países trabalham em um documento que apresentarão em Durban e “que proporciona uma base de dados reais para negociar a contribuição de cada Estado para deter a mudança climática”, destacou.
“Um acordo coerente dos países em desenvolvimento”, sobre o que cada Estado, industrializado ou não, deve fazer, tanto em reduções nacionais, como em acesso a meios financeiros e tecnológicos para permitir um regime internacional de mitigação, “representaria um avanço formidável a respeito do impraticável esquema de promessas e revisões de Copenhague e Cancún”, concluiu Sivan.
* O autor é correspondente da IPS.
LINKS
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Clima: Cada vez mais quente – Cobertura especial da IPS, em espanhol
Comparison of Annex 1 and Non-Annex 1 Pledges Under the Cancun Agreements, pdf em inglês
Rio+20, em inglês
COP-17, em inglês e francês
Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.