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Trabalhadoras domésticas do Paquistão querem regulamentação do setor

Aasia Riaz, de 24 anos, é uma dos 8,5 milhões de trabalhadores domésticos do Paquistão e ganha 8.500 rúpias (US$ 82) por mês. foto: Zofeen Ebrahim/IPS
Aasia Riaz, de 24 anos, é uma dos 8,5 milhões de trabalhadores domésticos do Paquistão e ganha 8.500 rúpias (US$ 82) por mês. foto: Zofeen Ebrahim/IPS

 

Karachi, Paquistão, 11/2/2015 – A paquistanesa Sumaira Salamat, de 40 anos e com três filhos, trabalha diariamente das 10h às 14h30 em três casas diferentes, nas quais realiza distintas tarefas domésticas, como varrer, tirar o pó, lavar pratos e roupas, entre outras, ganhando três mil rúpias (US$ 29) por mês. Ela é uma das 8,5 milhões de mulheres que no Paquistão trabalham no serviço doméstico e que diariamente realizam centenas de tarefas em casas e apartamentos para mantê-los limpos e em ordem.

Quase todas as famílias de classe média do país contam com algum tipo de serviço doméstico. Mas as condições de trabalho das empregadas não estão claras, não têm horário fixo nem benefícios, nem aposentadoria ou contrato. São comuns os abusos, e as leis que regem o trabalho em casas particulares são imprecisas, segundo especialistas.

Mas as coisas começaram a mudar. A criação do primeiro sindicato de trabalhadores do serviço doméstico e vários projetos de lei no parlamento dão esperanças de que em breve as condições de trabalho mudem.

Salamat vive na cidade de Lahore, capital da província de Punjab, de onde conversou por telefone com a IPS sobre os quatro anos de luta para garantir alguns direitos básicos às empregadas domésticas. “Só no último ano e meio essas mulheres se deram conta do significado de se converter em uma força unida”, explicou.

Segundo Salamat, “queremos que nos reconheçam como trabalhadoras, igual aos nossos companheiros nas fábricas e nos hospitais. Também gostaríamos de ter uma aposentadoria, mas, sobretudo, queremos melhores salários e condições adequadas de trabalho”.

Muitas são enganadas com a promessa de uma vida boa e um salário decente, mas o que encontram quando começam a trabalhar é muito diferente. “Quando nos entrevistam nos apresentam um cenário muito promissor”, contou Sonam Iqbal, solteira, de 22 anos, que faz trabalhos domésticos desde os 15. “Mas aos poucos aumentam seu trabalho e nem mesmo podemos protestar”, acrescentou.

O diretor do Departamento de Trabalho, Tahir Manzoor, não se atreveu a dar nem mesmo um número conservador da quantidade de trabalhadoras domésticas no Paquistão. “São bastante invisíveis, estão isoladas e distribuídas entre milhares de casas e apartamentos”, afirmou.

O Escritório de Estatística do Paquistão diz que a maioria dos 74% da população economicamente ativa no setor informal se dedica a tarefas domésticas, o que inclui homens e menores, embora os especialistas concordem que a maior parte é de mulheres rurais sem formação que emigram para as cidades em busca de trabalho. Mas suas esperanças de um futuro melhor se frustram quando se dão conta de que sua renda está abaixo do salário mínimo de dez mil rupias (US$ 97) mensais, como na província de Sindh, com 30 milhões de habitantes.

O ministro de Coordenação Provincial apresentou em janeiro uma reforma à Lei do Salário Mínimo para Trabalhadores Não Capacitados, de 2015, que se for aprovada o aumentará dos atuais US$ 87 para US$ 116 ao mês em todas as províncias. Mas não há garantias de que seja aplique às trabalhadoras domésticas, pois não existe um mecanismo para fiscalizar sua implantação. De fato, salvo pela menção das trabalhadoras domésticas em duas leis, não há nenhuma específica que proteja seus direitos no Paquistão, afirmou Zeenat Hisam, pesquisadora do Instituto de Investigação e Educação Trabalhista.

As duas leis que as mencionam são o Decreto de Segurança Social de Empregados Provinciais, de 1965, que estabelece que “as empregadas do serviço doméstico devem pagar” por sua assistência médica, e a Lei de Salário Mínimo, de 1961, que cobre os trabalhadores domésticos. Porém, “o governo nunca notificou o salário mínimo aplicável às trabalhadoras domésticas no âmbito dessa lei nos últimos 53 anos”, afirmou Hisam na entrevista à IPS.

Em dezembro, a Federação de Trabalhadores do Paquistão formou o primeiro sindicato de trabalhadores do setor, com 235 filiados, dos quais 225 são mulheres. A entidade foi registrada no contexto da Lei de Relações Industriais de Punjab, de 2010, e do projeto Igualdade de Gênero para um Emprego Decente, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), financiado pelo governo do Canadá.

“A OIT trabalha com o Paquistão para conseguir mudanças em leis e políticas de acordo com o Convênio sobre as Trabalhadoras e os Trabalhadores Domésticos de 2011” (número 189), pontuou Razi Mujtaba Haider, oficial de programa da organização. Ratificado por 17 países, o Convênio garante os direitos fundamentais de trabalhadores domésticos, como emprego seguro e decente. Com cerca de 52,6 milhões de pessoas empregadas no trabalho doméstico no mundo em 2010, o documento alcança uma enorme força de trabalho dispersa em todo o planeta.

Segundo Manzoor, o Departamento de Trabalho se concentra “em várias áreas construindo as capacidades dos trabalhadores domésticos para que tenham poder de negociação, elaborando um formulário de contrato entre empregado e empregador, fixando um salário por hora para deter a exploração, dando benefícios e segurança social e, o mais importante, limitando o trabalho infantil, especialmente de meninas de 14 anos ou menos”.

No Paquistão, um menor é “uma pessoa com menos de 14 anos”, mas não declara o trabalho doméstico como perigoso. A assembleia de Punjab está por aprovar a Lei de Proibição do Emprego Infantil, de 2014, que, se espera, limitará o uso de menores no serviço doméstico.

Segundo a imprensa local, Hamza Hasan, responsável de investigação e comunicações da Sociedade para a Proteção dos Direitos da Infância, afirmou que, entre 2010 e 2013, “foram denunciados 51 casos de tortura de menores trabalhadores domésticos em diferentes partes do país, que deixou 24 meninas e meninos mortos”. Só em 2013, morreram oito meninos e meninas que prestavam serviços domésticos por esgotamento ou abuso, destacou. Envolverde/IPS