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Túnel de La Línea, megaobra em risco de erupção

Vista aérea do vulcão Machín. O anel externo é a cratera, com três domos. Foto: Serviço Geológico Colombiano/Observatório de Manizales
Vista aérea do vulcão Machín. O anel externo é a cratera, com três domos. Foto: Serviço Geológico Colombiano/Observatório de Manizales

 

Finca Galícia, Cordilheira Central, Colômbia, 23/10/2013 – O túnel do Alto de la Línea, na Cordilheira Central da Colômbia, habilitará um eixo logístico estratégico para esse país e a vizinha Venezuela, mas poderia afundar no desastre se o vulcão Machín entrar em erupção. A complexa obra de engenharia inclui dois túneis principais unidirecionais, de 8,8 e 8,6 quilômetros, além de 21 túneis curtos e 29 viadutos, que somam 6,8 quilômetros. O primeiro túnel principal deverá estar pronto no segundo trimestre de 2014. Ainda não foram definidas as empresas que assumirão as obras do segundo.

No entanto, no departamento de Tolima a estrada passa a seis quilômetros de um morro quase despercebido, o vulcão Machín, um dos mais perigosos do país, que teve seis ou sete erupções em dez mil anos, a mais recente há cerca de 800 anos. “Os vulcões mais explosivos ficam calados por muito tempo”, disse Marta Calvache, diretora do Serviço Geológico Colombiano (SGC).

O Serviço Geológico, fez, em 1998, o primeiro mapa de ameaça vulcânica do Machín, que ampliou em 1999, em 2000 e em 2003, pela última vez. Nele recomenda considerar a ameaça ao se decidir temas “estratégicos” como “os planos viários de médio e longo prazos, especialmente os terrestres”. Há 15 quilômetros em linha reta entre La Línea e o Machín. Se este entrar em erupção, “o túnel ficará sem estrada”, afirmou à IPS a geóloga Calvache.

Mais de cem estações de monitoramento controlam este vulcão 24 horas por dia. Em 2008 foi emitido um alerta amarelo permanente. Qualquer erupção menor do Machín será maior do que a do vulcão Ruiz, que fica 45 quilômetros a nordeste, que em novembro de 1985 lançou 0,3 quilômetros cúbicos (Km³) de material e arrasou a pequena cidade de Armero, matando 22 mil de seus 28 mil habitantes e deixando mais de cinco mil feridos.

“As erupções normais do Machín podem ser de vários quilômetros cúbicos, e as grandes são de, aproximadamente, 20 Km³”, detalhou Calvache. E acrescentou que, se a próxima for grande, “afetará toda a parte central do país”, incluindo áreas dos departamentos Tolima, Quindio, Vale do Cauca e Cundinamarca, habitadas por aproximadamente um milhão de pessoas. Nas erupções do Machín “ocorrem grandes fluxos piroclásticos (mistura de gases vulcânicos e materiais sólidos quentes). Ninguém sobrevive a um fluxo piroclástico, e a bacia ficará totalmente alterada”, afirmou.

“Essa mudança, em termos humanos, pode-se dizer que seria para sempre. O ser humano é que teria que se adaptar. O vulcão está mudando. O que não sabemos é se essa mudança o levará a uma erupção ou se é apenas uma coceguinha e voltará a ficar tranquilo por muitos anos”, ressaltou a geóloga. “Ao que parece, as autoridades apostam na segunda hipótese. No estudo de impacto ambiental do túnel, o Machín não é mencionado como fator de risco para a obra”, disse o ambientalista Néstor Jaime Ocampo, da Fundação Ecológica Cosmos, com sede em Armênia, capital de Quindio.

Um eixo estratégico

Em 2005, o governo do presidente Álvaro Uribe (2002-2010) declarou “estratégica” a passagem de La Línea. Trata-se de um ponto nevrálgico do corredor viário para o comércio externo entre a principal cidade fronteiriça com a Venezuela, Cúcuta, no nordeste, e o único porto colombiano no Pacífico, Buenaventura, no oeste. Esse eixo passa pela zona central e mais rica do país, a andina, onde fica Bogotá.

Acima, um dos 29 viadutos que fazem parte das obras de modernização da passagem La Línea. Foto: Constanza Vieira/IPS
Acima, um dos 29 viadutos que fazem parte das obras de modernização da passagem La Línea. Foto: Constanza Vieira/IPS

 

“Todo carregamento que chega a Bogotá vindo do Pacífico entra por aqui. São milhares de toneladas transportadas diariamente, tanto importações quanto exportações”, disse à IPS o diretor da Sociedade Colombiana de Engenheiros (SCI), Luis Orlando Muñoz. “Esta é a coluna vertebral do país em matéria de sistemas rodoviários”, ressaltou. E a obra é mais ambiciosa.

“O que se está construindo é um corredor viário moderno entre Caracas e Buenaventura”, isto é, a saída da Venezuela para o Pacífico, apontou Ocampo. É que o corredor liga o Golfo da Venezuela, no Mar do Caribe, e o Equador, no Pacífico, e faz parte dos planos da Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA). Como quase todas as estradas colombianas, a que liga Cúcuta e Buenaventura tem apenas uma faixa em cada sentido na maior parte de seus 1.020 quilômetros.

Ao subir a Cordilheira Central, a via avança em zigue-zague entre florestas de névoa alto-andinas, palmeiras de cera (Ceroxylon quindiuense), sietecueros (Tibouchina lepidota), pastagens e precipícios. Os caminhoneiros têm respeito por La Línea. Neblina, fortes declives e curvas fechadas fazem com que a velocidade média seja de 18 quilômetros por hora. A IPS demorou seis horas para percorrer os 38 quilômetros entre Ibagué e essa passagem.

A necessidade de controlar o trânsito nessa estrada movimentada e estreita e a miséria deram lugar à pouco comum ocupação de semáforos humanos: homens e mulheres com roupas esfarrapadas que avisam por meio de bandeiras, lanternas e apitos que, atrás da próxima curva um caminhão articulado vem na contramão. Impossível esses veículos não invadirem a pista contrária ao fazerem as curvas em La Línea. Os motoristas agradecem jogando algumas moedas.

O túnel economizará cerca de dez quilômetros de percurso e uma subida de 840 metros, reduzindo em 87% o tempo médio que os caminhões levam para passar La Línea (80 minutos) e em 72% para veículos leves (meia hora). Espera-se que a velocidade média aumente para 60 quilômetros por hora e os acidentes diminuam em 75%, segundo a Câmara Colombiana de Infraestrutura.

O tormento de cruzar La Línea

Quase 80% da carga doméstica colombiana passa pelas estradas do país, segundo o Ministério do Transporte, mas a infraestrutura viária tem atraso de “pelo menos 30 anos”, disse à IPS a presidente da SCI, Diana Espinosa. A engenheira atribui isso à falta de uma política de Estado e à “destinação de recursos para financiar a guerra (interna contra guerrilhas esquerdistas), que está provocando muito atraso na área da infraestrutura”.

Na última década multiplicou o tráfego de caminhões de carga, evidência da força do comércio exterior, ou, mais precisamente, das importações. O volume das compras externas supera em três vezes as exportações, segundo o Conselho Nacional de Política Econômica e Social, autoridade nacional de planejamento. Por isso, o primeiro túnel principal será para o tráfego de Buenaventura para Bogotá.

“As pessoas preferem risco conhecido do que solução a se conhecer”, indicou à IPS o especialista em desastres Gustavo Wilches-Chaux para explicar porque, apesar da tragédia de Armero, ninguém está pensando em trasladar Cajamarca, o povoado mais próximo de Machín, com dez mil habitantes e situado em uma planície de cinza vulcânica de suave inclinação.

Ao contrário, entre Cajamarca e La Línea avança o megaprojeto de mineração a céu aberto La Colosa, a cargo da empresa sul-africana AngloGold Ashanti. “Ao insistir nessa obra e nas atividades econômicas nessa via, como La Colosa, estamos convocando mais dezenas de milhares de pessoas a virem viver em uma zona de ameaça vulcânica”, advertiu Ocampo.

“Somente a interrupção de meses dessa estrada seria uma catástrofe, praticamente causaria o colapso do comércio exterior do país”, enfatizou Ocampo. Por isso, prosseguiu, “tudo isso não é para nossa comodidade, para que demoremos menos 25 minutos para ir de Armênia a Ibagué. Isso é para a comodidade das multinacionais. E a nós caberá pagar um pedágio alto para passar por esse túnel”. Envolverde/IPS

Cenário em caso de erupção do vulcão Machín

• Um milhão de vítimas diretas

• Retirada permanente do território e recolocação

• O oeste e o centro do país ficariam sem comunicações

• Desapareceriam três abastecedores agrícolas: Cajamarca, parte do Quindio e o distrito de irrigação de Tolima

• Cidades e povoados vizinhos ficariam cobertos por uma camada de cinza de pelo menos meio metro de espessura.