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Um banco suíço, a corrupção e a desigualdade na África

Os vendedores ambulantes da África refletem a desigualdade de renda que impera no continente, em grande parte devido à corrupção. Foto: Jeffrey Moyo/IPS
Os vendedores ambulantes da África refletem a desigualdade de renda que impera no continente, em grande parte devido à corrupção. Foto: Jeffrey Moyo/IPS

 

Harare, Zimbábue, 26/2/2015 – A revelação do dinheiro ilícito de origem africana escondido em um banco suíço confirmou que a corrupção é a raiz de grande parte da desigualdade na renda que afeta o continente. Afirma-se que as contas secretas no banco privado HSBC, reveladas pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação, contêm mais de US$ 100 bilhões, parte deles procedentes da África, onde se encontram alguns dos países mais pobres do mundo.

Por exemplo, 57 clientes ugandenses do HSBC tinham pelo menos US$ 159 milhões. O Banco Mundial calcula que Uganda perde anualmente mais de US$ 174,5 milhões com a corrupção. Não é crime os africanos terem contas bancárias na Suíça. Mas os órgãos fiscais começam a perguntar se foram pagos os impostos correspondentes às quantias depositadas.

Na África do Sul, o diretor do Serviço de Impostos, Vlok Symington, informou que seu escritório está canalizando a informação. “Os primeiros indícios são de que alguns desses titulares de contas podem ter usado suas contas do HSBC para evitar obrigações fiscais locais ou internacionais”, afirmou o funcionário ao jornal South Africa Sunday Times.

“A desigualdade de renda começa com nossos líderes políticos e empresários ricos corruptos que, com grande frequência, são os proprietários ilegais dos recursos do continente”, afirmou Claris Mdhuku, diretor da Plataforma para o Desenvolvimento da Juventude, uma organização independente do Zimbábue.

Os diamantes, por exemplo, que são a fonte de riqueza de muitos comerciantes, costumam ser extraídos pelos mais pobres dos pobres, tratados como escravos em países africanos assolados pela guerra, apesar do Sistema de Certificação do Processo de Kimberley, que foi adotado em 2003 para impedir o comércio dessas pedras preciosas procedentes de países em guerra.

“É um caso de cobiça e corrupção”, afirmou Ernst Mudzengi, analista político do Zimbábue. “A África tem políticos parasitas que se preocupam principalmente com o poder político e o beneficio econômico para si mesmos, enquanto os africanos a pé permanecem na periferia da pobreza”, destacou à IPS.

Os especialistas em desenvolvimento atribuem as desigualdades da renda à flexibilidade das leis contra a corrupção no continente. “Os países africanos não têm leis anticorrupção sólidas, e os políticos e os ricos acumulam demasiado poder, que excede inclusive os poderes da polícia, dando-lhes a liberdade de acumular riqueza de um dia para outro, por qualquer meio, sem serem interrogados”, explicou Nadege Kabuga, especialista em desenvolvimento de Ruanda, de sua capital, Kigali.

“Escandaliza a forma como grandes bancos como o HSBC criaram um sistema de lucro à custa das pessoas comuns empobrecidas, que fica ainda pior pela assistência dada a numerosos milionários da África, em particular, para evitar o pagamento de impostos”, afirmou Zenzele Manzini, economista independente de Mbabane, capital da Suazilândia.

“Muito frequentemente, os diretores públicos, os ministros e seus secretários são os portadores do governo, concedendo a si mesmos enormes benefícios, enquanto os empregados de menor escalão permanecem presos na periferia, sem benefícios adicionais além dos magros salários que recebem mensalmente”, declarou à IPS um alto funcionário do Ministério do Trabalho do Zimbábue, que pediu para ficar no anonimato.

“Como podemos evitar isso, em primeiro lugar?”, questionou Koen Roovers, da Coalizão pela Transparência Financeira, uma aliança mundial entre organizações da sociedade civil e governos. Para deter a fraude é preciso melhorar a capacidade do Sul em desenvolvimento, ressaltou. “A magnitude do problema é importante. A organização humanitária britânica Christian Aid calcula que a África subsaariana necessitaria cerca de 650 mil funcionários fiscais para alcançar a média mundial”, acrescentou.

Os Estados ricos prometeram ajuda aos países pobres para gerar a capacidade que necessitam, mas ainda não cumpriram seus compromissos. Investigadores da Integridade Financeira Mundial, uma organização sem fins lucrativos com sede nos Estados Unidos, disseram que os países em desenvolvimento perderam quase US$ 1 trilhão pelos canais ilícitos. Sem medidas claramente definidas para frear as desigualdades na renda, os economistas dizem que a África poderia caminhar para um grau de pobreza ainda maior de suas populações pobres.

“A África enfrentaria a pobreza perpétua em meio à crescente desigualdade na renda porque os governos aqui não têm as instituições nem o conhecimento para identificar e deter a lavagem de dinheiro por parte das pessoas e dos políticos corruptos que evadem impostos”, afirmou Kingston Nyakurukwa, economista independente do Zimbábue.

Os “delinquentes e os que os habilitam são criativos, por isso a única forma de evitar escândalos no futuro é lançando uma luz sobre aquilo que os delinquentes e os que fogem do fisco tentam ocultar. Por isso são necessários os registros online, e os bens de todas as pessoas e entidades jurídicas deveriam ser públicos”, afirmou Nyakurukwa. “Se fizermos vista grossa a essas lacunas legais, o desenvolvimento econômico para todos continuará sendo minado pelos atores ilegais que buscam tirar proveito delas”, acrescentou. Envolverde/IPS