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Uma favela dentro de outra se desenvolve no Quênia

Em 2009, cerca de cinco mil pessoas do assentamento irregular de Kibera foram reassentadas em Kensup, em Soweto Oriental, uma área de Kibera, na capital do Quênia, que também virou favela. Foto: George Kebaso/IPS
Em 2009, cerca de cinco mil pessoas do assentamento irregular de Kibera foram reassentadas em Kensup, em Soweto Oriental, uma área de Kibera, na capital do Quênia, que também virou favela. Foto: George Kebaso/IPS

 

Nairóbi, Quênia, 24/7/2014 – No limite leste do assentamento informal de Kibera, na capital do Quênia, um grupo de meninos e meninas se reúne carregando grandes baldes amarelos para pegar água em uma torneira em mau estado. As altas torres cinza e bege de Soweto Oriental se elevam sobre eles. Uma garota coloca o recipiente sobre sua cabeça e volta para seu apartamento.

Ali a espera sua mãe, Hilda Olali, de 49 anos, que está varrendo o chão. Mas já está cansada. Sua família de cinco membros não tem água corrente nem eletricidade em seu apartamento de três cômodos. “Logo que chegamos desfrutávamos da vida. Mas agora está difícil porque ficamos semanas sem água e tenho que comprá-la. Mas não posso pagar”, contou à IPS.

Debaixo da janela da cozinha o lixo se acumula há seis meses. O mau cheiro rançoso dos restos impregna o apartamento o dia inteiro. Olali pensa em regressar a Kibera e trocar sua moradia de tijolo e cimento por sua velha choça de lata e barro. “No assentamento as coisas eram baratas. Quando viemos nos trouxeram como se tivéssemos condição de comprar coisas caras”, afirmou.

Há 12 anos, o Programa de Melhora do Assentamento de Kibera (Kensup) lançou seu projeto-piloto neste populoso bairro pobre. Muitos moradores sentem que o governo e o Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat) os abandonou tão logo abriram suas portas para o que a agência multilateral deu assistência.

Em 2009, quase cinco mil residentes de Kibera foram reassentados em Kensup, na área conhecida como Soweto Oriental. Os 17 prédios de cinco andares concentram 1.800 famílias. Estima-se que em Kibera vivam entre 800 mil e 1,2 milhão de pessoas, o que o converte em um dos maiores assentamentos da África. “Pediram que mudássemos, fomos um pouco obrigados. Kensup trasladava tudo e acertou o transporte. Antes tinha sete cômodos, aqui só tenho três”, lamentou Olali.

Segundo a ONU, as cidades concentram metade da população mundial. Dos 43 milhões de habitantes do Quênia, 40% residem em áreas urbanas. Mais de 70% dos 3,1 milhões de moradores de Nairóbi vivem em 200 bairros informais que viraram favelas. A falta de assentamentos acessíveis nesta cidade converte Kibera em um lugar atraente para viver.

Godwin Oyindo, de 24 anos, acaba de concluir seus estudos universitários e é muito amigo de um dos filhos de Olali. Foi criado em Kibera e tinha esperança de que o projeto de moradia mudasse a vida de seus moradores. “O projeto de melhoria foi criado para atender algumas coisas em Kibera, a segurança da posse, a moradia das pessoas, a acessibilidade aos serviços e também para gerar atividades econômicas. Um dos objetivos é uma sociedade sem favelas”, disse à IPS.

Em 2003, o governo do Quênia e a ONU-Habitat começaram a colaborar para melhorar a moradia e a qualidade de vida da população de Nairóbi, mas também de Mombasa, Mavoko Kisumu e Thika. Kensup deveria melhorar a vida de 5,3 milhões de pessoas que moram em assentamentos irregulares até 2020.

A ONU-Habitat aderiu com seu Programa Participativo de Melhoria de Assentamentos, colaborando com o Kensup com assessoria técnica e experiência. O responsável da área da agência da ONU, Joshua Mulandi Maviti, disse que foram cumpridos os objetivos de todos os projetos. “Kibera era o objetivo de nosso trabalho com o Ministério”, explicou à IPS. “Mas também coordenamos projetos de infraestrutura, posse da terra e de água, e saneamento em diferentes lugares do Quênia, em Mombasa, Kisumu e Mavoko”, acrescentou.

Justus Ongera, de 24 anos, divide um quarto com sua irmã mais nova em um apartamento de dois quartos em Soweto Oriental, que compartilham com uma família. Ongera acredita que tem de falar com as pessoas sobre como melhorar a situação do saneamento. “Logo que mudamos retiravam o lixo a cada duas semanas. Agora apodrece ao sol durante seis meses. É um grave problema de saúde. É preciso fazer alguma coisa”, afirmou à IPS.

Após 12 anos, a ONU-Habitat terminou seus contratos com o Kensup quando estes concluíram seu período, explicou Maviti. Mas isso não significa que terminou a relação, acrescentou. “Nem o governo nem o Ministério se comunicaram conosco pelos problemas que sofrem os moradores de Soweto Oriental. Precisamos que nos comuniquem oficialmente para podermos ajudar”, acrescentou.

Por seu lado, Olali avalia a situação, se deve, ou não, se mudar com os três filhos novamente para o assentamento. Por não ter água corrente deve percorrer longa distância até Kibera para usar o serviço sanitário público. Isso lhe custa cinco xelins quenianos cada vez. “Tudo somado me sai mais caro”, disse Olali.

Funcionários do Ministério de Terras, Habitação e Desenvolvimento Urbano e o Kensup não quiseram dar declarações à IPS. Envolverde/IPS