Montevidéu, Uruguai, 22/1/2015 – Duas décadas depois da primeira Cúpula das Américas (1994), muitas coisas mudaram no continente, e para bem. Hoje em dia é possível um renovado diálogo hemisférico sem exclusões.
Em meados da década de 1990, essa primeira Cúpula de Miami era um momento de consensos importados, de modelos de desenvolvimento socioeconômico baseados exclusivamente no mercado e em sua suposta distribuição perfeita dos recursos por meio da mão invisível.
Oculta sob uma lógica de desenvolvimento, a maior onda de privatizações e desregulamentações tomou conta do continente. O papel do Estado se reduziu ao de facilitador de um processo baseado no princípio da sobrevivência do mais apto. Solidariedade, igualdade e justiça eram todos valores do passado, e a pobreza um dano colateral necessário.
Entretanto, esses valores sempre estiveram presentes entre os povos do hemisfério, os quais deram as costas a essas políticas e, em seu lugar, durante os últimos 15 anos, apoiaram energicamente as alternativas que combinam crescimento econômico com inclusão social, expandindo as oportunidades para todos os cidadãos.
O crescimento econômico acompanhou a inclusão social e somou milhões de pessoas à classe média, que hoje representa 34% dos latino-americanos, superando o número de pobres pela primeira vez na história.
Se isso foi possível é porque os governos adicionaram à mão invisível do mercado a mão muito visível do Estado.
E isso aconteceu no contexto da pior crise financeira mundial, que levou a uma recessão sem precedentes os Estados Unidos e a Europa, algo que esta última ainda se esforça em deixar para trás.
O crescimento com igualdade social resultou ser o novo consenso regional.
Hoje, isso é o que une a região.
Hoje, estão dadas as condições para se estabelecer uma cooperação mais realista nas Américas, onde todos os seus membros podem se associar em igualdade de condições, desde o mais poderoso até as menores ilhas do Caribe.
Hoje, ninguém tem o monopólio do que funciona ou não, nem ninguém pode impor modelos, porque as verdades estabelecidas colidiram com a realidade. Nos anos 1990, a exclusão social nas políticas nacionais e a exclusão das vozes em nível internacional eram as duas caras da mesma moeda, e isso já não é aceitável.
Hoje, todas as vozes contam, e se não o fazem, terão que fazê-lo. O poderoso clube do G8 se converteu no G20. Ainda assim não basta para incluir a nova realidade de nosso hemisfério.
Aos organismos existentes a região incorporou nesta última década a dinâmica União de Nações Sul-Americanas (Unasul) e a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), o que deixa a Organização dos Estados Americanos (OEA) como único lugar para o diálogo entre todos os países das Américas, sejam grandes, médios, pequenos, poderosos ou vulneráveis.
Mas os atores governamentais ou intergovernamentais por si só não são a única resposta aos problemas do mundo de hoje. Os atores não estatais do mundo não governamental, o setor privado, os sindicatos e as organizações sociais devem ser parte do processo.
Os líderes devem interpretar o momento com a finalidade de gerar uma agenda para o progresso, mas um progresso que seja tangível para as pessoas, para os cidadãos, aos quais prestamos contas.
Portanto, em um contexto econômico internacional mais incerto, devemos nos centrar em manter e ampliar nossas conquistas sociais, e um novo espírito de cooperação nas Américas pode ser fundamental para isso.
A Cúpula das Américas no Panamá, que acontecerá em abril, poderá ser o começo desse novo processo de fomento da confiança, no qual todos os países sentem que podem se beneficiar de um programa de cooperação. Este será um momento histórico porque desta vez não haverá exclusões.
A recente boa notícia de normalização das relações diplomáticas entre Estados Unidos e Cuba, e a participação desta última na Cúpula, representa um sinal positivo adicional. O Panamá merece o apoio de toda a região antes e durante a Cúpula.
Esta será uma grande oportunidade para fortalecer os valores democráticos, a defesa dos direitos humanos, a transparência institucional e as liberdades individuais, junto com um programa prático de cooperação para a prosperidade compartilhada nas Américas. Envolverde/IPS
* Luis Almagro é ministro das Relações Exteriores do Uruguai e candidato ao cargo de secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA).