Impossível não ficar emocionado quando se caminha neste parque suspenso – cheio de árvores, flores e gente –, que, até há pouco tempo, era um viaduto abandonado e sombrio, em via de ser derrubado.
Visitei na semana passada a segunda fase, recentemente inaugurada, do viaduto High Line, cujo projeto vem atraindo a atenção de arquitetos e urbanistas do mundo todo. Foi criado um sistema de águas que correm pelo solo, quase lembrando um córrego. Como fazia sol naquele dia, as crianças se banhavam deitadas no chão.
Os moradores das proximidades voluntariamente cuidam das flores e das árvores. A vida se propagou, reciclando o entorno do viaduto com novos ateliês, lojas, bares, restaurantes e edifícios. Tamanha foi a emoção coletiva com a obra que, em um dos prédios, pessoas imaginavam colaborar fazendo, ao anoitecer, um show gratuito: striptease na janela. Virou ritual, mas acabou proibido.
Imagine o nosso “minhocão” sem carros, tomado por jardins, surgindo uma floresta nessa cicatriz da cidade de São Paulo. É, certamente, o que os cariocas vão saborear com o fim de um viaduto ou, pelo menos, de parte dele na zona portuária, a ser convertido num parque.
Além de arquitetos e urbanistas, um novo profissional entra no debate sobre o efeito desse tipo de solução. Neurocientistas estão descobrindo como a cidade se processa no cérebro das pessoas e como o contato com a natureza produz reações surpreendentes
Está aí uma novidade a que os candidatos a prefeito devem prestar atenção.
Segundo cientistas, um simples passeio num parque, como o que eu realizei no “minhocão” nova-iorquino, é capaz de aumentar a capacidade de um indivíduo para solucionar problemas.
Submetidos a uma experiência comandada por neurocientistas, grupos foram convidados a realizar uma bateria de provas várias vezes num dia. Um deles, porém, era convidado, entre um exame e outro, a caminhar por um bosque. Os demais caminhavam apenas pela rua, sem tanta presença da natureza.
Nessa experiência, comandada por neurocientistas da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, constatou-se que o passeio entre as árvores estava associado a um desempenho melhor nos testes.
O resultado coincide com os de uma análise, divulgada no final do ano passado, feita com base em 25 estudos sobre a reação cerebral de pessoas que andam ou correm em ambientes verdes. Estes mostraram que, de modo geral, há redução da ansiedade, da depressão, do cansaço e da tristeza
Uma experiência feita em hospitais americanos testou a capacidade de recuperação de doentes. Os pacientes que tinham vista para alguma área verde, mesmo que não fosse muito ampla, tendiam a se recuperar com menos dificuldade do que aqueles privados de contemplar uma paisagem. Recuperaram-se mais rapidamente das cirurgias, tiveram menos dores e tomaram menos remédios.
Há um crescente número de descobertas sobre como funciona o cérebro de quem vive em centros urbanos muito agitados, revelando tendência maior à ansiedade, à depressão e até à esquizofrenia.
Na semana passada, um dado, obtido de pesquisas com ratos feitas pela Universidade de Ohio, nos Estados Unidos, demonstrou que o conflito entre o cérebro e as cidades é maior do que se pensava. Já se sabia da relação entre o infarto e a poluição. A situação é ainda pior: ratos submetidos à poluição demonstraram problemas de memória e aprendizagem, além de distúrbios como ansiedade e depressão.
Experiências como a de Nova York, entre tantas outras espalhadas pelo mundo, que tornam as cidades mais inteligentes, passam a ser vistas como uma espécie de remédio para a saúde mental. Transformam, em suma, venenos em terapia.
Por isso, há cidades norte-americanas experimentando chamar psicólogos e neurocientistas para ajudar no planejamento urbano.
PS – Muito mais ousado do que aquele viaduto-parque, um novo projeto vem sendo testado na cidade de Nova York. Como toda ideia ousada, está provocando muita polêmica. Estão formando profissionais com habilidade em gestão, mas sem formação em educação, para gerir escolas públicas. É mais uma tentativa de experimentar um olhar diferente para melhorar a gestão das escolas públicas.
* Gilberto Dimenstein é colunista e membro do Conselho Editorial da Folha de S.Paulo, comentarista da rádio CBN, e fundador da Associação Cidade Escola Aprendiz.
** Veja também no Portal Aprendiz – “Novas medidas cautelares do Código de Processo Penal podem inspirar mudanças no ECA“.
*** Publicado originalmente no Portal Aprendiz.