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Via de escape para deficientes em razão da guerra em Gaza

Samah Shaheen (direita), uma jovem deficiente de Gaza que aprende corte em madeira por computador no programa Irada. Foto: Khaled Alashqar/IPS
Samah Shaheen (direita), uma jovem deficiente de Gaza que aprende corte em madeira por computador no programa Irada. Foto: Khaled Alashqar/IPS

 

Gaza, Palestina, 20/1/2015 – Os ataques israelenses que a Faixa de Gaza sofreu nos últimos anos deixaram uma grande quantidade de jovens que devem enfrentar a barreira da deficiência física provocada pela agressão militar. As organizações de Gaza se esforçam para desenvolver programas de reabilitação que ajudem esses jovens a superar as condições políticas, econômicas e sociais adversas existentes neste território.

O programa Irada, que significa “vontade” em árabe, dá formação profissional a jovens de ambos os sexos que ficaram de alguma forma incapacitados pela guerra, com o objetivo final de ajudá-los a ganhar seu próprio sustento. Projeto da Universidade Islâmica de Gaza, o programa Irada tem por objetivo apoiar, capacitar e reintegrar os jovens fisicamente incapazes ao meio socioeconômico e impulsionar a confiança da comunidade nas habilidades desse grupo, até agora marginalizado.

Mais de 400 pessoas com todo tipo de problema já receberam reabilitação e treinamento. O diretor do programa, Emad Al Masri, disse à IPS que o conceito do projeto foi desenvolvido inicialmente para o grande número de jovens que ficaram incapacitados devido à guerra de Israel contra Gaza em 2008. O projeto recebeu apoio do governo da Turquia para a construção do prédio que abriga os programas de formação acadêmica e profissional do Irada.

Segundo Masri, a “ideia básica do projeto é ajudar as pessoas com deficiências físicas e reintegrá-las à comunidade para que sejam produtivas, e não sejam consideradas um peso”.

Samah Shaheen, de 33 anos e morador no acampamento de refugiados de Al Bureij, tem um problema físico que dificulta sua participação em atividades da comunidade. Aderiu ao Irada para ganhar experiência e aprender corte em madeira por computador. Esta mulher passou mais de seis meses em formação antes de pôr em prática seus conhecimentos na comunidade, com supervisão do projeto.

“Passei vários anos da minha vida sem trabalho devido à minha deficiência, e também porque não tinha experiência. Depois de entrar para o programa e aprender informática para corte e decoração em madeira consegui uma carreira, ganho bem e penso seriamente em abrir uma oficina graças à esmagadora demanda por móveis de madeira ornamentada que fiz”, contou.

Algo fundamental no Irada é o acompanhamento das pessoas que receberam formação, para garantir sua integração e participação no mercado de trabalho. Parte dessa etapa inclui a supervisão de sua evolução nas oficinas e fábricas onde trabalham, para lhes dar apoio profissional caso necessitem.

Devido ao seu sucesso, o Irada recebeu financiamento do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) para ajudar os formados pelo programa a criarem pequenas empresas, desenvolver sua independência econômica e melhorar seu perfil de produção.

“O Pnud destinou US$ 150 mil para criar centros de produção de móveis para o lar na Faixa de Gaza e ajudar 90 alunos com deficiência a gerirem suas próprias empresas, continuar com suas vidas e se reintegrar à sociedade de forma natural”, afirmou Tariq Sha’at, coordenador de organizações não governamentais da agência internacional.

Três alunas de informática da Universidade Islâmica de Gaza projetaram o primeiro aplicativo que permitirá a pessoas cegas escrever em braille em seus telefones celulares inteligentes em árabe. Com este grande avanço, deficientes visuais poderão baixar e instalar o aplicativo que lhes permitirá utilizar todas as funções do celular, como ligações e mensagens de texto. Também permite a pessoas com outros problemas físicos o uso de telefones inteligentes com grande eficácia.

“Este grupo de alunas prestou um grande serviço à comunidade das pessoas com deficiência visual, além de ganhar uma competição internacional que selecionou seu aplicativo com um dos cinco melhores projetos de desenvolvedores em informática entre 2.500” apresentados, disse Tawfiq Barhom, decano da Faculdade de Tecnologia da Informática da Universidade Islâmica de Gaza.

Agora as alunas trabalham para aumentar a quantidade de idiomas que o aplicativo permite e ampliar seu uso para mais pessoas em todo o mundo. Israa Al Ashqar, uma das estudantes da equipe, destacou à IPS que o projeto surgiu devido à marginalização que as pessoas cegas sofrem e ao seu crescente isolamento porque não podem utilizar as redes sociais e os aplicativos para telefones inteligentes.

“O aplicativo proporciona um teclado em braille para todos os programas utilizados pelo usuário cego nos telefones móveis, que lhes permitirá acessar redes sociais e se comunicar com sua comunidade de forma natural. Isto, por sua vez, aumentará as possibilidades de este grupo marginalizado se integrar à sociedade local e mundial”, acrescentou Israa.

Em conjunto, o programa Irada e o aplicativo em braille para os celulares representam uma tentativa séria das universidades e dos estudantes de Gaza para apoiar um setor importante da comunidade, que não sofreu apenas a guerra e o trauma, mas também a desesperança e o isolamento em sua própria sociedade. Envolverde/IPS