Assim como é recomendável consumir alimentos naturais, livres de agrotóxicos, para se ter uma boa saúde, é preciso ler e ouvir informações verdadeiras, livres dos “tóxicos da mídia”, para se ter uma boa compreensão da realidade.
No dia 11, estava almoçando, quando telefonou um jornalista, que se apresentou como pertencendo a um dos quatro maiores jornais brasileiros. Quem havia dado meu telefone a ele foi um amigo. Ele pedia que eu analisasse a 11ª rodada de licitações, recém-lançada pela ANP, porque seu jornal apresentaria, no dia seguinte, uma grande matéria com opiniões de diversas pessoas.
A imagem que tive, na hora, é que devia ser um jornalista novo que não conhecia os posicionamentos das diversas forças que atuam na questão. Por isso, resolvi alertá-lo que não gostaria que fossem publicados apenas trechos da minha opinião, pois ela conflitava com a que o jornal sempre publicava. Ele garantiu que isto não aconteceria, uma vez que eles respeitariam o que eu escrevesse.
Como estava desejoso em chegar próximo a leitores que normalmente não atinjo com meus artigos, resolvi atendê-lo. Dediquei umas duas horas para escrever um texto de 2.500 toques, conforme pedido, contendo minha opinião e o remeti. Enquanto escrevia, dei-me conta de que limitação do número de toques é mais usada para um artigo.
Resumindo a história, ele telefonou para mim, no fim da tarde, dizendo várias coisas. Que o artigo não seria publicado. Que ele tinha feito confusão, pois “era preciso um artigo que comentasse a rodada e não um que a condenasse”. Que estava desconcertado e me pedia desculpas pelo trabalho causado. Ao lhe perguntar se o editor não tinha gostado do meu texto, ele disse que o editor não tinha culpa alguma. Que ela era totalmente dele.
Obviamente, não acreditei nele e houve, sim, um veto ideológico ao artigo. Este jornalão não quer promover um debate rico de idéias. Mas não tomei nenhuma iniciativa. O rapaz devia ser principiante mesmo, pois se mostrava nervoso. Deixei para lá, uma vez que não queria entrar em discussão com alguém não responsável pela política do jornal. Mas este fato elucida bem a quem nossa mídia comercial serve, se alguém ainda tinha dúvida. A seguir, está o artigo que o jornalão não quis publicar.
Análise sobre a 11ª rodada
A 11ª rodada de licitações não pode ser analisada em um horizonte restrito. É preciso que a política para o setor de petróleo, na qual esta rodada se inclui, seja analisada. As áreas do pré-sal possuem um marco regulatório próprio, recém-aprovado. As áreas desta rodada são fora do pré-sal e, portanto, serão leiloadas sob os ditames da Lei 9478 de 1997.
Esta lei diz que a concessionária que descobrir petróleo é a proprietária da sua produção, tendo liberdade para dar a ela o destino que quiser. Ela retira do Estado o poder geopolítico e estratégico que o Brasil deveria possuir por ter muito petróleo em seu território. A garantia de suprimento de petróleo de Estados nacionais, durante prazo razoável, é um forte elemento de convencimento na discussão entre nações.
Além disso, as concessões têm a duração de 30 anos e resultam, quando empresas estrangeiras ganham os leilões, em menos compras locais, quase nenhum desenvolvimento tecnológico no país, pouca contratação de engenheiros brasileiros, enorme transferência de lucro para o exterior e baixa contribuição de tributos para o Estado, em comparação ao ganho auferido. No marco regulatório do pré-sal, este ponto é bem diferente.
O governo brasileiro deveria colocar como prioridade o petróleo ser uma alavanca para um novo surto de desenvolvimento. Portanto, os tempos das rodadas, as áreas de cada rodada, etc., não podem ser definidos sem a participação da sociedade. Nas audiências públicas da ANP, a Agência Nacional do Petróleo, não existe a isenção necessária para a sociedade ser ouvida e é por isto que só agentes econômicos participam delas. A velocidade de exploração do petróleo no país fixa a magnitude da compra de bens, engenharia e desenvolvimentos locais, a contratação de trabalhadores no país, principalmente de técnicos, a recuperação nos campos, etc.
Temos reservas da Petrobras que nos dão no mínimo 20 anos de abastecimento para o país. Assim, o petróleo deve ser visto como o derradeiro passaporte para nosso melhor futuro, e não como a fonte de uns simples trocados a mais e um grande solucionador de problemas alheios, como o abastecimento dos desenvolvidos e o aumento do lucro dos estrangeiros.
Recomendamos a paralisação de qualquer rodada de licitações até que um novo marco para áreas fora do pré-sal seja discutido com a sociedade. O fato de termos demorado três anos sem rodadas mostra que assumimos, em parte, as rédeas do processo. Para que serve existirem rodadas que não nos beneficiam?
* Paulo Metri é conselheiro da Federação Brasileira de Associações de Engenheiros.
** Publicado originalmente no site Agência Carta Maior.