Estudo realizado na Zona Leste de São Paulo mostra que crianças com o mesmo nível sociocultural apresentam desempenhos escolares diferentes de acordo com a localização da escola que frequentam.
Pesquisa
O estudo Educação em territórios de alta vulnerabilidade social na metrópole, uma iniciativa da Fundação Tide Setubal em parceria com a Fundação Itaú Social e o Unicef e coordenação do Cenpec, constatou que, quanto maior a vulnerabilidade social do território, menor o nível da qualidade de ensino ofertado e menor a aprendizagem dos alunos, dinâmica denominada ‘Efeito do Território’.
Realizado entre 2009 e 2010, a pesquisa analisou dados das 61 escolas públicas da subprefeitura de São Miguel Paulista, na Zona Leste da capital, que atendem 88 mil alunos. Os dados mostram que quanto mais vulnerável o território, menor o resultado das escolas na avaliação do Ideb.
O objetivo da pesquisa foi averiguar o ‘Efeito do Território’ nas oportunidades educacionais oferecidas às crianças, adolescentes e jovens da periferia das metrópoles. “As metrópoles apresentam o seguinte paradoxo: ao mesmo tempo em que possuem grande riqueza econômica, social e cultural, apresentam indicadores educacionais abaixo das cidades de médio porte” explica a superintendente do Cenpec, Anna Helena Altenfelder.
Segundo Antonio Batista, coordenador de pesquisa do Cenpec, “esse aparente paradoxo é decorrente – segundo as investigações existentes sobre o tema – da forte segregação espacial que marca as áreas metropolitanas e que tende a isolar parcelas expressivas da população de oportunidades sociais, educacionais e culturais. A segregação e o isolamento espacial se tornam, assim, também uma segregação e um isolamento sociocultural e educacional”.
Para a coordenadora da Fundação Tide Setubal, Paula Galeano a pesquisa também tem mérito de apresentar, sob diversas óticas, os mecanismos que geram as desigualdades. “A Fundação atua em territórios vulneráveis onde percebemos a reprodução das desigualdades, pelo precário acesso da população aos bens e serviços que não estão distribuídos de forma justa na cidade. Nosso papel é o de integrar ações e políticas na tentativa de romper este ciclo e promover o desenvolvimento”, conclui.
O que mobilizou as instituições envolvidas a desenvolver este estudo foi a possibilidade de contribuir para o debate público sobre as políticas educacionais. “São necessárias políticas específicas para escolas em territórios de alta vulnerabilidade, sobretudo quando atendem alunos com baixos recursos culturais, visando garantir a equidade”, afirma a diretora da Fundação Itaú Social, Valéria Riccomini.
São duas as evidências que comprovam o impacto da vulnerabilidade do território onde se localiza a escola sobre as oportunidades educacionais oferecidas aos estudantes:
Primeira evidência
O estudo constatou que, das 61 escolas pesquisadas, as localizadas em territórios de alta vulnerabilidade ficaram abaixo da média local do Ideb. Por outro lado, entre as que estão em regiões centrais, com mais recursos culturais, financeiros e sociais, quase todas estão acima da média do Ideb de São Miguel Paulista.
Segunda evidência
Outra evidência detectada é que alunos com o mesmo nível sociocultural têm desempenhos diferentes conforme o nível de vulnerabilidade do local onde se situa a escola. Foi observado que, dentre os alunos de quarta série com baixos níveis socioculturais que vivem em territórios de alta vulnerabilidade, 50% tiveram nível de proficiência abaixo do básico na Prova Brasil em Língua Portuguesa, em 2007. Este índice cai para 38% nas regiões mais centrais. Esta evidência expressa um princípio fundamental para a Educação que é de que todos os alunos podem aprender, desde que garantidas as condições para isto.
A pesquisa também procurou identificar os mecanismos e processos que produzem o ‘Efeito de Território’. Foram encontrados cinco mecanismos que afetam as escolas em territórios de alta vulnerabilidade: 1) isolamento da escola em relação a outros equipamentos públicos no território; 2) baixa oferta de Educação Infantil e creches no entorno; 3) escolas com tendência a concentrar alunos com baixos recursos socioculturais; 4) desvantagem em relação a outras escolas na concorrência por bons profissionais; 5) modelo escolar vigente inadequado às necessidades dos alunos que estudam nestas escolas com alta vulnerabilidade. “O modelo escolar que organiza o funcionamento das escolas exige um repertório que os alunos com baixos recursos não possuem. A escola precisa estar preparada para atender o aluno real” explica o pesquisador do Cenpec e coordenador da pesquisa, Maurício Érnica.
Segundo a diretora da Fundação Itaú Social, Valéria Riccomini, o resultado da pesquisa indica que é necessário e urgente desenvolver políticas públicas específicas para escolas que estejam localizadas em regiões de alta vulnerabilidade social. “Ao concluir que crianças com o mesmo nível sociocultural têm desempenhos diferentes, o estudo mostra que o território influencia de forma significativa as oportunidades de aprendizagem. Por isso, as políticas precisam considerar as desigualdades e as especificidades de cada comunidade”, afirma.
* Publicado originalmente no site Cenpec.