Nos 50 anos da criação da ONG, relatório Green Game-Changers mostra como algumas empresas geraram iniciativas de desmaterialização, restauração, energias renováveis e de baixo carbono para estimular transição para economia verde.
Atualmente, sustentabilidade, economia verde e outras expressões semelhantes são muito difundidas e pregadas por indivíduos, governos e empresas, mas pouco se faz para concretizar esses conceitos. Mas nos 50 anos de criação do WWF, um novo relatório da ONG revela como algumas companhias conseguiram implantar ações ‘verdes’ para incentivar uma economia mais sustentável. Apesar de poucas, essas iniciativas mostram que é possível tirar a sustentabilidade do papel e fazê-la se tornar realidade.
Relacionando o lançamento do relatório com o jubileu do órgão, o documento apresenta 50 empreendimentos verdes de algumas firmas e indivíduos, iniciativas baseadas nos pilares da desmaterialização (redução do uso de recursos naturais); da restauração (recuperação de biodiversidade, florestas, recursos hídricos e ambientes marinhos); da reutilização (resíduos de uma empresa se tornam o recurso de outra) e das energias renováveis e de baixo carbono.
Para muitas destas companhias, o risco dos negócios está cada vez mais ligado ao risco ambiental, e por isso, uma mudança radical é necessária na forma como fazemos nossos negócios.
“Se você simplesmente perseguir o crescimento por ele mesmo, sem pensar nos impactos mais amplos que isso traz, então, em última análise, isso não vai ser sustentável”, declarou Jeremy Darroch, CEO da Sky. “Precisamos crescer responsavelmente, precisamos crescer diferentemente”, concordou Paul Polman, CEO da Unilever.
Um dos exemplos de ação de desmaterialização é o da firma norte-americana NeighborGoods, uma organização que dirige um modelo de negócio no qual os participantes podem emprestar ou tomar emprestado recursos dentro de um grupo.
A ideia é simples: quantas vezes por mês você utiliza um cortador de grama ou uma furadeira? A maioria das pessoas não costuma usar esse tipo de item frequentemente, o que faz com que na maior parte do tempo o objeto fique parado, sem função. Neste sentido, o NeighborGoods incentiva as pessoas a comprarem esse tipo de material em grupo, e em vez de consumirem diversos itens, adquire-se um exemplar só.
“A NeighborGoods se conecta às pessoas para economizar dinheiro e recursos com a partilha de bens com seus amigos e vizinhos. Nossos membros estão partilhando mais de US$ 3,5 milhões em bens: tudo, de cortadores de grama a furadeiras, bicicletas e videogames. Partilhando recursos, nossos membros estão vivendo mais sustentavelmente e fortalecendo relações em suas comunidades locais”, explicou Micki Krimmel, fundadora e CEO da NeighborGoods.
Outro caso neste pilar é o da empresa de bebidas AmBev. Juntamente com a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) e o Centro Operacional de Desenvolvimento e Saneamento de Uberaba (CODAU), a firma lançou o esquema de recompensa do Banco CYAN, no qual os consumidores podem ganhar prêmios se diminuírem seu consumo de água. Atualmente o serviço atende mais de 23 milhões de pessoas no estado.
“Quando lançamos o Movimento CYAN em 2010, a meta era alertar a sociedade para discutir a importância do consumo racional de água. Com o Banco CYAN esperamos encorajar o uso consciente desse recurso, premiando os que reduzem o uso de água”, afirmou Ricardo Rolim, diretor de assuntos ambientais e sociais da AmBev.
“Desde a criação da Ambev, há 11 anos, nossa prioridade é embutir a sustentabilidade no coração de nossas operações e nosso impacto ambiental está caindo ano a ano. Agora queremos engajar pessoas a reduzir seus impactos também. Essa é a forma que trabalhamos para atingir nosso sonho e a melhor companhia de bebidas ajudando a criar um mundo melhor”, acrescentou.
Um terceiro exemplo de desmaterialização é o da plataforma australiana Swapstyle.com. A ferramenta criou um serviço de troca de roupas, acessórios, cosméticos e livros para estimular a reutilização e o não-desperdício destes produtos e a redução do uso de materiais, do consumo e do impacto ambiental. Hoje, a plataforma conta com mais de 40 mil membros.
“O resíduo criado pela indústria da moda é enorme. Vivemos estação por estação, às vezes usando um item só uma vez. Oferecemos às pessoas uma alternativa ambientalmente sustentável para o consumo, ajudando-as também a economizar dinheiro”, disse Emily Chesher, fundadora do Swapstyle.com.
“Recebemos e-mails de membros agradecidos a cada semana que nos contam quanto dinheiro eles conseguiram economizar trocando, o que significa muito considerando o clima financeiro atual. Desde 2002, mais de um milhão de itens foram trocados”, adicionou Chesher.
No campo da restauração, uma boa iniciativa é a da Aliança Global para o Sistema Bancário em Valores (GABV), organização que conta com diversos bancos que se propõem a financiar ações de desenvolvimento sustentável para pessoas, comunidades e meio ambiente. Para se ter uma ideia da dimensão da associação, ela detêm ativos no total de US$ 26 bilhões, atingindo 10 milhões de pessoas em mais de 20 países através de suas ações.
“No Banco New Resource estamos decididos a mudar as transações. Nossa missão é avançar sustentavelmente com tudo o que fazemos – os empréstimos que fazemos, a forma como operamos e nosso compromisso em colocar depósitos para trabalhar para o bem”, comentou Vincent Siciliano, presidente e CEO do New Resource, um dos bancos que participa da aliança.
No pilar das energias renováveis e do baixo carbono, um bom exemplo de ação é o da Companhia de Serviços de Energia Vale do Ouse (OVESCO), a primeira usina de energia renovável de propriedade comunitária. A usina, sustentada por 250 acionistas da comunidade, oferece retorno em investimento e gera energia para as residências e empresas locais.
“Esse é apenas o começo, queremos trabalhar com a comunidade do Distrito Lewes para instalar mais 200 kW de fotovoltaica (PV) no próximo ano em escolas, prédios comunitários e negócios locais. Visamos desenvolver o modelo de negócio da OVESCO para fornecer formas alternativas de gerar aquecimento e energia de baixo carbono e ver Lewes se tornar uma cidade alimentada por luz solar”, contou Chris Rowland, diretor da OVESCO.
Outro caso no campo das energias renováveis é o do e.quinox, projeto que desenvolveu uma solução de energia solar para comunidades rurais de Ruanda, que em sua maioria não estão conectadas a redes de energia. Com o quiosque de energia, diversas baterias são carregadas pela luz solar, podendo ser levadas para diversos lugares da comunidade sem haver necessidade de serem conectadas a uma rede.
“A missão da e.quinox é achar um desenho perfeito para a eletrificação rural que possa ser replicado em outras comunidades rurais. É um processo difícil, já que há particularmente muitas considerações, então há poucos ‘dados de mercado’ sobre essas áreas. É nossa crença que a abordagem financeiramente sustentável é a única forma de enfrentar esse difícil problema mundial moderno”, expôs Daniel Choudhury, vice-presidente da e.quinox.
Outro exemplo é um projeto europeu de rede de transporte que utilizará infraestruturas rodoviárias e ferroviárias preexistentes, ligadas a um circuito para troca e carregamento de baterias de veículos elétricos alimentado por energias renováveis. O projeto visa desenvolver esse circuito por toda a Europa, reduzindo significativamente as emissões de carbono.
“Acreditamos que uma rede de transporte multimodal, com nossa rede para bateria de carros elétricos como espinha dorsal, representa uma das maiores oportunidades de ajudar a Europa a atingir as metas de 2020. Estamos ajudando a substituir o uso de petróleo e emissões de CO2 prejudiciais por um melhor equilíbrio comercial e mais empregos verdes”, esclareceu Joe Paluska, vice-presidente de comunicação da BetterPlace, empresa que coordenará o projeto.
Ainda nesse pilar, a tecnologia que está sendo desenvolvida pela companhia Dyesol é bom exemplo de biomimetismo – ciência que estuda possibilidades de ‘imitar’ estruturas da natureza na tecnologia – aplicado às energias renováveis. Utilizando células solares que podem substituir vidros e telhados, a nova tecnologia realiza uma ‘fotossíntese artificial’, ajudando a aumentar significativamente a geração de energia solar.
“A ideia central é que não há necessidade de reinventar a roda. Depois de 3,8 bilhões de anos de evolução, a natureza já achou as soluções para os desafios de sustentabilidade que os humanos enfrentam”, sugeriu Janine Benyus, fundadora do Instituto de Biomimetismo e autora de Biomimetismo: inovação inspirada pela natureza.
Para o WWF, essas e outras ações indicam que as empresas estão cada vez mais preocupadas em assegurar a preservação do meio ambiente, investindo em empreendimentos que, além de sustentáveis, ajudam as companhias e iniciativas a ganharem mercado e se estimularem ainda mais ideias em benefício ambiental.
“Enquanto líderes de negócios lidam com formas para transformar seus negócios a fim de cooperar com os atuais desafios globais, novos modelos, serviços e alianças de negócios verdes estão surgindo pelo mundo”, concluiu Dax Lovegrove, diretor de negócios e relações industriais do WWF-Reino Unido.
* Publicado originalmente no site CarbonoBrasil.