As vias aéreas superiores são a porta de entrada de inúmeros agentes infecciosos e irritantes de nosso organismo, sendo a primeira linha de defesa do sistema respiratório a estes agressores. Nossas vias aéreas, constantemente expostas a altos níveis de poluentes inaláveis em nossa cidade, travam uma batalha diária para nos manter protegidos. A mucosa do nariz, da garganta e dos brônquios é intensamente inervada, ou seja, dotada de fibras nervosas.
A tosse e o espirro são resultados da irritação destas terminações nervosas por algum agente inalado ou pela inflamação desta mucosa. Tanto a tosse como o espirro são mecanismos de defesa das vias aéreas contra a entrada de partículas externas. Uma lesão nos brônquios, a secreção aprisionada nos seios da face ou até problemas cardíacos podem levar à tosse seca, ou seja, sem catarro.
Nesta situação, o paciente frequentemente visita a farmácia em busca de alívio imediato, sendo então apresentado a algum xarope. A composição dos xaropes varia, alguns são apenas à base de solução hipertônica de açúcar, outros têm substâncias que agem no sistema nervoso inibindo o reflexo da tosse, há os que apresentam corticóides e broncodilatadores na fórmula, além disso, a maioria contém corantes e aromatizantes.
Seja qual for sua composição, os xaropes quando utilizados como automedicação, sem o conhecimento da causa da tosse a ser aliviada, podem trazer efeitos colaterais de grande impacto. Dada a multiplicidade de aplicações, os xaropes não devem ser utilizados sem orientação médica. Longe de serem inofensivos, eles podem causar diminuição no fluxo respiratório, problemas cardíacos e sérias reações alérgicas. Exemplo destas situações de risco é o uso de xaropes com broncodilatadores em pacientes com doenças cardíacas.
Problemas no coração também causam tosse. Quando o sangue que vem dos pulmões não é bombeado adequadamente pelo coração doente, os pulmões ficam inchados e os bronquíolos se fecham. Daí a tosse, que pode ser seca ou acompanhada de uma secreção rósea e espumosa. Esta tosse piora ao deitar, pode acordar o paciente durante a noite e, em geral, é associada a falta de ar e até chiado. Estes pacientes podem apresentar aumento da frequência cardíaca e arritmias quando expostos a xaropes broncodilatadores.
Em caso de uso prolongado ou da administração de altas doses, estas medicações podem causar também alterações da pressão arterial e até angina e infarto. Importante lembrar um risco adicional no que diz respeito à automedicação com xaropes: a ocorrência de reações alérgicas aos corantes e aromatizantes da fórmula. Estas reações podem variar de simples prurido da pele a reações alérgicas generalizadas, com edema de face, broncoespasmo, edema de língua e da laringe e anafilaxia. Situações graves, que podem levar ao óbito. Quando a tosse é produtiva, ou seja, existe eliminação de catarro, é necessário redobrar a atenção. Caso este tipo de tosse dure mais de duas semanas, é preciso procurar um pneumologista que indicará uma radiografia do tórax para investigar os sintomas, prevenindo ou tratando no início males como pneumonia e tuberculose.
Pacientes fumantes ou asmáticos devem ter cuidado especial, pois são pacientes de risco para infecções mais graves. Além disso, os fumantes têm maior chance de desenvolverem neoplasia de pulmão e não devem negligenciar a ocorrência de tosse persistente. Outra situação a ser lembrada é a ação dos xaropes sedativos da tosse, que agem no sistema nervoso central causando sonolência e distúrbios de atenção, que podem resultar em acidentes de trabalho ou de trânsito. Além disso, o uso destas substâncias por longos períodos deve ser evitado a todo custo.
Sendo a tosse um mecanismo de defesa, que sinaliza para o organismo que algo está perturbando a integridade das vias aéreas, sua sedação com agentes centrais por longos períodos, pode mascarar doenças graves como a tuberculose e o câncer de pulmão. Evite a automedicação. Em caso de tosse persistente procure seu médico e siga suas orientações. Somente um estudo individualizado pode revelar a causa de sua tosse e possibilitar um diagnóstico precoce e tratamento adequado.
* Elnara Márcia Negri é pneumologista do Núcleo Avançado do Tórax do Hospital Sírio-Libanês.
** Publicado originalmente no site O que eu tenho.