Cerca de 3 mil pessoas do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) fazem passeata por ruas do centro do Rio em defesa da agricultura camponesa no país, durante a Rio+20. Foto: Marcello Casal

Nas manifestações pelas ruas do Rio de Janeiro e no colorido da Cúpula dos Povos as pessoas e as organizações da sociedade civil gritaram, desenharam e sonharam palavras de ordem contra quase tudo. Enquanto isso, no RioCentro sucederam-se enfadonhos discursos de chefes de Estado que, por horas, ocuparam a tribuna para ler textos que pereciam ter sido escritos pelo mesmo ghost writer. O colorido das ruas substituído pelo monocromático das gravatas em discursos acanhados, como a explicar porque não tinham a coragem de sonhar com um amanhã menos cinzento.

A Rio+20 vai entrar para a história como um vazio de coragem e o abandono das utopias. A ruptura entre as palavras de ordem das ruas e a ordem das palavras no documento final da conferência. No entanto, não é um fim de linha, nem para a ONU nem para a sociedade civil. O próprio secretário geral, Ban Ki-Moon considerou o documento acordado entre os países como tímido e as organizações sociais sabem
que há muito trabalho a fazer. Até 2014 devem ser definidos os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que precisam ser mais corajosos do que esse documento “sem conflitos” assinado no Rio de Janeiro.

No entanto, é sempre bom lembrar que os documento da Rio+20 representa apenas o piso, o mínimo que se pode fazer, mas não o máximo. O recado das ruas também foi confuso, sem nenhuma objetividade e, de forma generalizada, contra tudo e contra todos. É importante que se tenha em mente que cada governo individualmente, cada organização e cada pessoa pode avançar, ir além, trabalhar pelas utopias que sempre são as sementes de grandes realizações da humanidade.

A Rio+20 pode ser vista como um exemplo a não ser seguido. A ONU criada após a 2ª Guerra Mundial pode não ser mais o modelo de cooperação internacional que o século XXI necessita. Mas é o único modelo de multilateralismo que o planeta tem, portanto, é preciso apostar em sua capacidade de se renovar. Nos próximos anos outras conferências vão desafiar a capacidade da humanidade em resolver problemas comuns e não se deve desistir de buscar uma voz comum em harmonia com os desejos das sociedades.

O documento final da Rio+20 é uma afronta à capacidade humana de sonhar, mas é uma ode à necessidade de se caminhar unido. O esforço diplomático para redigir um documento para ser assinado por quase duas centenas de países é louvável, porque os interesses são os mais díspares possíveis, contemplando desde a falida aristocracia europeia aos novos-ricos dos BRICS, passando por Saint Kitts, uma ilhota do Caribe que é o menor país das Américas.

Mas a diplomacia adotou a técnica de retirar os pontos conflitantes, aparar as arestas, tirar as cores fortes, de forma que, no final, pouco restou do sonho de uma grande conferência sobre desenvolvimento sustentável. (Envolverde)

Dal Marcondes é jornalista especializado em jornalismo econômico, diretor e editor responsável da Envolverde – Revista Digital e presidente do Instituto Envolverde.