Rio de Janeiro, Brasil, 21/10/2011 – O Brasil quer participar do esforço internacional para ampliar o acesso a medicamentos e produzir seus próprios remédios, e começará por se converter no provedor mundial de medicamentos contra o mal de Chagas. O anúncio foi feito pelo ministro Alexandre Padilha na Conferência Mundial sobre os Determinantes Sociais da Saúde, inaugurada no dia 19, no Rio de Janeiro.
O Brasil vai duplicar a produção de medicamentos contra o mal de Chagas,respondendo à solicitação de organismos de cooperação multilateral. Segundo o ministro, “o país vai assumir o compromisso de garantir a produção mundial de medicamentos para o mal de Chagas. Isso só será possível devido à nossa estratégia de nos associarmos a laboratórios públicos e privados”.
No Brasil já são produzidos 1,2 milhão de comprimidos por ano, segundo a demanda inicial da Organização Pan-Americana de Saúde (OPS). “Estávamos por cumprir com toda a demanda solicitada, agora vamos elevar a produção em 113% e ainda assim entregar 225 mil comprimidos para a organização Médicos Sem Fronteiras, que nos fez um pedido urgente”, disse Padilha.
A produção do medicamento benznidazol chegará a 3,4 milhões de comprimidos ao final deste ano. Em 2008, o Brasil se colocou como único produtor mundial do remédio para tratar a doença, quando o laboratório Lafepe, de Pernambuco, adquiriu o estoque de matéria-prima do laboratório Roche, que deixou de fabricá-lo.
O mal de Chagas é uma doença parasitária, infecciosa e febril causada pelo Trypanosoma cruzi, transmitido por contato direto com excremento do inseto barbeiro. No Brasil foi interrompida a transmissão do inseto, mas ainda predominam casos crônicos. O mal está presente principalmente na América Latina. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), nos 21 países onde a doença é endêmica cerca de oito milhões de pessoas estão infectadas, o que significa uma queda pela metade dos infectados existentes em 1990.
O acesso aos medicamentos é central no direito à saúde, disse Padilha. “A associação com a indústria nacional é fundamental para sustentar o Sistema Único de Saúde (SUS),que é público e universal”, acrescentou. Segundo o ministro, o Brasil avançou nos últimos 23 anos com a criação do SUS, que estabelece o acesso universal e gratuito ao serviço de saúde.
“No entanto, ainda precisamos avançar muito na qualidade do atendimento, aumentar a capacidade de fiscalização e controle dos recursos na área. A redução de aproximadamente 40% dos casos de tuberculose nos últimos dez anos só foi possível pela redução da pobreza”, disse o ministro ao se referir à ascensão social de 36 milhões de brasileiros que saíram da miséria.
Entretanto, o Brasil ainda se expressa como um país extremamente desigual, e o acesso aos serviços de saúde reproduzem esta realidade. Outra medida para garantir a igualdade no acesso ao tratamento é ampliar a produção de remédios. Assim, Padilha aproveitou a ocasião para anunciar que a fabricação de remédios biotecnológicos, para tratar câncer e um conjunto de doenças infecciosas, terá uma série de regras para o registro e a produção. “A ideia é que possamos ter instrumentos mais claros para que a indústria os produza no Brasil”, destacou o ministro.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou dois compêndios que estabelecem regras para os produtos biotecnológicos que representam uma nova fronteira de medicamentos. Segundo Padilha, esta medida serve como estímulo importante para a produção nacional de produtos biotecnológicos, que permitirá reduzir os preços e ainda ampliar o tratamento e os cuidados com a população por meio do SUS.
Dos remédios usados pelo SUS, apenas 1% é de origem biotecnológica. Contudo, essa pequena proporção compromete 34% do orçamento do SUS. “Esta é uma nova fronteira de produtos para tratamentos mais eficazes e seguros”, disse o ministro. “Em recente negociação do Ministério da Saúde para incorporar medicamentos oncológicos, conseguimos reduzir quase à metade os custos. Quando começarmos a produzi-los no Brasil, vamos reduzir ainda mais o preço”, afirmou Padilha.
A Conferência Mundial sobre os Determinantes Sociais da Saúde, organizada pela OMS, é a maior realizada fora de sua sede, Genebra, nos últimos 30 anos. Até hoje estarão reunidos representantes de mais de 80 países analisando estratégias para enfrentar desigualdades sociais que geram graves consequências sanitárias para as populações. Ao final do encontro, será adotada a Declaração do Rio, que oficializará o compromisso político dos países signatários para ampliar o acesso aos serviços de saúde.
A diretora-geral da OMS, Margareth Chan, apontou o Brasil como o país mais adequado para realizar esta conferência, por ter superado muitas barreiras no acesso universal aos serviços públicos. “Sem um bom acesso aos serviços sociais, oportunidades de emprego, saúde, educação, água, saneamento, moradia adequada, se estes fatores não forem incluídos no desenvolvimento, observaremos uma desigualdade crescente dentro e entre os países”, afirmou Chan.
Diante dos graves efeitos da crise financeira mundial, a OMS pretende que os governos se comprometam a não realizar cortes na área da saúde. “Não devemos cometer os mesmos erros que cometemos na década de 1970. Naquela época tivemos múltiplas crises, do petróleo, alimentar e financeira. O resultado foi a redução dos investimentos em serviços sociais, de saúde e educação”, disse Chan.
Em 2008, quando a crise financeira explodiu, a OMS chamou a atenção dos Ministérios da Saúde sobre a importância de investimentos sociais anticíclicos. “Não temos autoridade para forçar nenhum país, mas procuro chamar a atenção para as desvantagens de reduções nos serviços sociais”, ressaltou Chan. Envolverde/IPS