Varsóvia, Polônia, 13/11/2013 – Não se nota, mas estes são dias atarefados na capital da Polônia. Enquanto era inaugurada a conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre mudança climática no Estádio Nacional, do outro lado do rio Vístula se reunia a extrema direita polonesa para sua marcha anual pelo Dia da Independência.
Exceto por um grande cartaz colocado no central Palácio Nacional da Ciência e da Cultura, uma das sedes da reunião, praticamente não há sinal que indique aos varsovianos que acontece em sua cidade a 19ª Conferência das Partes (COP 19) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática, que começou no dia 11 e termina no dia 22.
A Polônia é anfitriã da COP 19 porque foi o único país da Europa central e oriental que se mostrou interessado quando chegou a vez da região de definir a sede da conferência. Porém, está em dúvida a capacidade da Polônia de desempenhar um papel construtivo nas negociações, pois nos últimos tempos se caracterizou por criar obstáculos aos avanços da União Europeia (UE) para objetivos climáticos mais ambiciosos.
Na primavera boreal de 2012, a Polônia boicotou a adoção de um mapa do caminho do bloco para 2050, que buscava impor redução de 40% nas emissões de gases-estufa até 2030, de 60% até 2040 e de 80% até 2050, em relação aos volumes de 1990. Neste outono boreal, Varsóvia anunciou sua intenção de também impedir que a Europa fixe novos objetivos climáticos para 2030.
Um compromisso maior de redução de emissões pela UE poderia ser positivo para o progresso das negociações climáticas. A postura polonesa se explica com uma só palavra: carvão. Quase 90% da eletricidade consumida no país é gerada em centrais térmicas a carvão, o mais sujo dos combustíveis fósseis, e a política energética nacional não prevê nenhuma mudança significativa para reduzir o peso desta fonte.
Nada expressa melhor esta política do que a frase pronunciada pelo primeiro-ministro, Donald Tusk, em setembro, em uma zona mineira da cidade de Katowice: “O futuro da energia polonesa é marrom e negro, do carvão e do gás de xisto. Alguns querem que deixemos o carvão, mas a independência energética exige não só diversificação, mas também o máximo uso das fontes próprias”.
Em uma controvertida jogada, o Ministério da Economia está organizando, paralelamente à COP 19 e junto com a Associação Mundial do Carvão, a Cúpula Internacional Carvão e Clima. O Comunicado de Varsóvia, documento de autoria compartilhada entre o lobby do carvão e o Ministério, será entregue aos representantes da ONU durante a cúpula. Trata-se, na essência, de um chamado para destinar recursos públicos às tecnologias de “carvão limpo” para garantir um grande uso desse combustível fóssil em todo o mundo.
Apesar dessa tremenda adesão à agenda dos interesses carboníferos, o governo polonês insiste em dizer que não se opõe aos avanços nas negociações climáticas. “Não sou cético da mudança climática, sou cético de algumas propostas europeias para enfrentá-la”, publicou em sua conta no Twitter o ministro do Meio Ambiente, Marcin Korolec, pouco antes da COP 19.
As tentativas de Varsóvia de impedir que a UE apresente propostas climáticas mais ambiciosas são do agrado da extrema direita local e internacional, tal como ficou claro na “cúpula anticlima” organizada nesta capital pelo direitista Movimento Nacional Polonês (Ruch Narodowy), pelo sindicato Solidariedade e pelo norte-americano Comitê para um Amanhã Construtivo, que nega a existência da mudança climática.
Segundo pesquisa do Greenpeace, o Comitê recebe quase a metade de seu financiamento de um Fundo de Doadores que funciona como veículo secreto de dinheiro para grupos negacionistas. Entre 2002 e 2011 destinou US$ 146 milhões para este fim. Embora se ignore a identidade da maioria dos que colocam dinheiro nesse Fundo, o Greenpeace conseguiu estabelecer que recebeu recursos de duas fundações vinculadas ao barão do petróleo e da indústria química Charles Koch, famoso por ter em sua folha de pagamento personalidades céticas da mudança climática.
Na reunião de Varsóvia, Craig Rucker e David Rothbard, representantes do Comitê, argumentaram que a mudança climática não é causada pela atividade humana e que as políticas destinadas a enfrentá-la podem causar mais penúria aos pobres de todo o mundo. A extrema direita doméstica, representada pelo Movimento Nacional Polonês, expôs sua visão das políticas energéticas e climáticas desse país enfatizando a soberania, entendida como rejeição às propostas da UE e da ONU, e na exploração das jazidas locais de carvão.
“Estamos contra a descarbonização porque a economia polonesa se baseia no carvão e porque nos opomos às regulações climáticas na UE”, afirmou à IPS o especialista em energia Michal Putkiewicz, membro do Movimento Nacional Polonês. “Primeiro o governo assinou um pacote de medidas sobre energia e clima da UE e agora quer evitar que seja mais ambicioso. A política das autoridades polonesas agora é correta, mas acreditamos que devem ignorar qualquer regulação europeia sobre redução de emissões”, acrescentou.
O pacote de medidas sobre energia e clima da UE estipula que o bloco deve reduzir suas emissões em 20% até 2020, em relação aos volumes de 1990, dar às fontes renováveis 20% da matriz energética, e conseguir economia do consumo em 20%. Os dois maiores partidos poloneses, a governante Plataforma Cívica e o conservador Paz e Justiça, vêm se reprovando mutuamente pelo fato de o país ter se comprometido com esse pacote.
No dia 11, grupos direitistas que participavam da conferência anticlima aderiram à Marcha da Independência, organizada por dois setores influentes, a Juventudes Polonesas (M?odizie? Wszechpolsk?) e o Campo Nacional Radical (Obóz Narodowo-Radykalny), que em 2011 uniram forças para criar o Movimento Nacional Polonês.
Mais de dez mil pessoas participaram de uma manifestação que a cada ano ganha mais força. Houve choques entre alguns dos participantes e a polícia. Uma manifestação no centro de Varsóvia foi atacada por vários integrantes da Marcha da Independência e foi queimada uma bandeira com o arco-íris, que simboliza a diversidade.
“O negacionismo climático está se convertendo em um novo componente da identidade e do discurso do extremismo de direita na Polônia”, afirmou à IPS a ativista ecologista Michalina Golinczak. “Assim, o movimento polonês contra a mudança climática deveria colaborar não só com os sindicatos, mas com outros movimentos sociais progressistas, antifascistas, pacifistas, LGBT, feministas, etc., para repelir esse alarmante crescimento dos extremistas de direita”, acrescentou. Envolverde/IPS