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A América Latina precisa diversificar sua energia firme

Joyce Mendez - Enquanto Belém recebe a COP30, a atenção mundial se volta para a América Latina, uma das regiões com as matrizes energéticas mais “limpas” do planeta, e para a forma como ela responderá aos novos riscos climáticos. Mas, hoje, a energia renovável, especialmente a hidrelétrica, que transformou o continente em líder global em fontes renováveis, tornou-se vulnerabilidade.

Atualizado em 21/11/2025 às 14:11, por Redação Envolverde.

Foto de Jyce Mendez e o ODS 7

Joyce Mendez* - 

Cerca de 68% da capacidade instalada da região vem de fontes renováveis, e quase metade — mais de 45% — é gerada pela força da água. Mas o clima está mudando as regras do jogo: secas prolongadas, provocadas por El Niño e outros fenômenos, reduzem cada vez mais a eficiência das hidrelétricas e comprometem a distribuição. Aquilo que era uma vantagem estratégica tornou-se o elo fraco do sistema.

A alteração nos regimes de chuva tornou essas fontes menos previsíveis. Em 2021, o Brasil enfrentou a pior estiagem em 91 anos, levando reservatórios a níveis críticos. O país precisou importar energia e acionar emergencialmente térmicas fósseis, mais caras e mais emissoras, para evitar apagões. No mesmo período, o Chile recorreu ao gás argentino para compensar a falta de geração hidráulica. Esses episódios mostram que quando a chuva falta, a eletricidade também pode faltar.

Durante a COP30, esse risco ganhou uma dimensão adicional. Lideranças indígenas alertam para o fato de que fontes renováveis não são automaticamente sustentáveis e que a expansão de hidrelétricas, eólicas e solares, quando feita sem planejamento adequado, amplia conflitos e pressiona comunidades vulneráveis. Assim, além da variabilidade climática, emerge um segundo desafio: garantir que a transição energética reduza emissões sem aprofundar desigualdades.

E é justamente a demanda por baixa ocupação territorial que torna estratégicas as alternativas de geração de energia firme, aquela produzida de forma contínua, em qualquer condição climática.A energia nuclear, especialmente por meio dos pequenos reatores modulares (SMRs), apresenta vantagens estruturais que respondem a esses desafios: ajuda a diversificar a matriz, fortalece a resiliência dos sistemas elétricos e reduz a dependência hídrica. Além disso, possibilita a instalação em locais já antropizados, evitando deslocamento de famílias, reduzindo disputas fundiárias e oferecendo eletricidade estável.

Argentina, Chile, Colômbia e Brasil já estudam a aplicação desses pequenos reatores, e a experiência russa comprova sua viabilidade. Desde 2020, a usina flutuante Akademik Lomonosov abastece a cidade de Pevek, no Ártico, e em 2028 entrará em operação o primeiro SMR terrestre na Yakútia, com 55 MW de potência, baseado no reator RITM-200N.

A gigante russa Rosatom se apoia nesse know-how para propor, na América Latina, projetos completos que incluem tecnologia, engenharia, suporte regulatório, capacitação local e integração com renováveis. Integrados a solar, eólica e hídrica, e sustentados por gás de transição e baterias, os SMR podem fornecer a base firme que estabiliza o sistema, reduz a volatilidade de preços e assegura energia 24 horas por dia,mesmo durante secas severas ou ondas de calor.

A América Latina reúne todas as condições para liderar uma transição energética inteligente, que una sustentabilidade, segurança e inovação. Mas, para isso, precisa ir além da expansão das renováveis e construir uma base firme e previsível, que garanta energia constante na rede, sendo ambiental e socialmente responsável.

* Joyce Mendez Diretora do Observatório Latino-Americano de Geopolítica da Energia e ex-conselheira jovem para o clima do Secretário-Geral das Nações Unidas (2023–2024).       

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