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Erros cada vez mais profundos no Ártico

Nuuk, Groenlândia, 21/6/2011 – A capital da Groenlândia fica muito longe da minha cidade natal de Durban, na África do Sul, e chegar ao Mar Ártico é um longo caminho para um africano que faz campanha contra a mudança climática. Mas aqui estou, na prisão, com meu companheiro Ulvar Arnkvaern. Acabei na prisão por violar uma zona de exclusão e subir em uma plataforma petroleira de águas profundas no Ártico, a 120 quilômetros da costa da Groenlândia.

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Kumi Naidoo se apoxima da plataforma petroleira de Cairns, no Mar Ártico.
Trouxe comigo as assinaturas de 50 mil pessoas que pedem à Cairn Energy, dona da plataforma, que apresente um “plano de resposta a um vazamento de petróleo”, e pretendia pedir o fim imediato das perfurações. Dizem-me que desde minha detenção, no dia 17, mais de 20 mil pessoas assinaram a petição no site do Greenpeace.

Vim defender o frágil ambiente do Ártico. Sou o vigésimo-segundo ativista do Greenpeace a se oferecer como voluntário nas últimas semanas para subir a escada de 30 metros e chegar à plataforma em meio ao oceano. Vim colocar o corpo no protesto e a voz no pedido de cordura e de encerramento das perigosas perfurações petroleiras em águas profundas do Ártico. E, assim, sou um dos 22 ativistas detidos e presos na Groenlândia.

Como é possível que após o desastroso vazamento no Golfo do México, causado em 2010 pela explosão da plataforma da Deepwater Horizon, se permita perfurar a uma profundidade semelhante no Ártico, onde seria impossível realizar qualquer operação de limpeza? Depois do ocorrido no Golfo do México, seria lógico esperar maior transparência e controle público.

Mas a razão do secretismo de Cairn é óbvia: seria impossível fazer uma limpeza, o ecossistema ficaria dizimado, a pesca na Groenlândia destruída, e a companhia de US$ 10 bilhões iria à falência. Não é uma boa perspectiva para acender a febre petroleira, e um péssimo sinal para os capitalistas que esperavam obter altos lucros. Isto é motivo suficiente para substituir as perfurações em busca de petróleo no Ártico, mas há muitas outras razões para reclamar que o mundo olhe para além do petróleo.

A queima de combustível fóssil altera nosso clima e derrete os gelos do Ártico, alterando um dos ecossistemas mais isolados e hostis da Terra. A radical redução do gelo marinho no verão é uma dura advertência do aquecimento global. Mas a indústria do petróleo e os governantes endividados com ela veem o aquecimento no Polo Norte como se fosse um convite: “perfure, perfure”.

A mudança climática já está causando estragos no mundo, atinge de maneira pior e mais rápida os pobres. O Ártico não só é vítima, mas ao seu tempo refletirá e multiplicará as alterações. Como africano me preocupa o que acontece aqui porque os cientistas alertam que o aquecimento sem precedentes nesta zona pode ter consequências para as populações mais vulneráveis. Um Ártico mais quente pode mudar drasticamente os padrões climáticos de regiões situadas a vários milhares de quilômetros.

Em algum ponto devemos dizer basta. Digo que tem de ser aqui e agora, no gelo do Ártico, nas florestas do mundo e no desastre nuclear de Fukushima. Digo que tem de ser aqui e agora, quando alguém propõe gastar milhares de milhões de dólares em novas explorações de combustível fóssil, em lugar de destiná-los à pesquisa em eficiência energética e fontes renováveis, seguras e limpas.

Enquanto estou na prisão, uma perigosa plataforma de perfuração se aproxima cada vez mais do petróleo e do gás que busca, bem como da zona de vazamento, onde aumentam os riscos de uma explosão em águas profundas. Mas, ainda assim, não estamos mais perto de conhecer seu plano secreto de contingência e limpeza.

Quanto mais profundo perfura esta plataforma, mais o mundo se aproxima de um ponto sem retorno climático, um cenário no qual a queima de combustíveis fósseis criou tal caos que se desatam eventos extremos, aumenta drasticamente o nível do mar e eclodem conflitos e fomes.

A natureza nos fez uma advertência, e esta vem com um teste de inteligência no qual não podemos ser reprovados. A forma como respondermos aqui e agora marcará o mundo em que vivemos e nossos filhos herdarão.

Minha permanência em Nuuk será curta, logo estarei livre e me deportarão. Contudo, pensarei nesta cidade e na metáfora da perfuração profunda no Ártico quando regressar a Durban em novembro e quando fizer lobby e reclamar um acordo obrigatório, justo e ambicioso na 17ª reunião anual da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática.

Não sejamos estúpidos, digamos não ao petróleo do Ártico e sim a um mundo livre da ameaça de uma mudança climática catastrófica. Envolverde/IPS

* Kumi Naidoo é diretor-executivo do Greenpeace Internacional.