Por André Trigueiro*
O acordo do Clima aprovado em Paris neste sábado (12) não resolve o problema do aquecimento global, apenas cria um ambiente político mais favorável à tomada de decisão para que os objetivos assinalados formalmente por 195 países seja alcançado.
Como todo marco regulatório, o acordo estabelece apenas as condições para que algo aconteça, e, nesse caso, não há sequer prazos ou metas. As propostas apresentadas voluntariamente pelos países (INDCs) passam a ser consideradas “metas” que serão reavaliadas a cada 5 anos, embora a soma dessas propostas não elimine hoje o risco de enfrentarmos os piores cenários climáticos com a iminente elevação média de temperatura acima de 2ºC.
Sendo assim, o que precisa ser feito para que o Acordo de Paris faça alguma diferença para a Humanidade? A COP-21 sinaliza um caminho. Para segui-lo, é preciso realizar muito mais – e melhor – do que tem sido feito até agora. A quantidade de moléculas de C02 na atmosfera já ultrapassou as 400 ppm (partes por milhão), indicador que confirmaria – segundo o Painel Intergovernamental de Mudança Climática da ONU – a progressão rápida da temperatura acima dos 2°C.
Paris, por si, não muda essa realidade. Falta arregaçar a manga e transformar discurso em atitude. Como o acordo não obriga os países a realizarem “algo mais” além daquilo que alguns já se propuseram a fazer, há uma imensa lacuna que só poderá ser preenchida com firmeza, determinação e muita coragem para enfrentar, por exemplo, certos lobbies.
A decisão mais urgente deveria ser a eliminação gradual dos U$ 700 bilhões anuais em subsídios para os combustíveis fósseis. Sem essa medida, como imaginar que a nossa atual dependência de petróleo, carvão e gás (75% da energia do mundo é suja) se modifique no curto prazo?
Pra piorar a situação, apesar dos investimentos crescentes que acontecem mundo afora em fontes limpas e renováveis de energia (solar, eólica, biomassa,etc) nada sugere, pelo andar da carruagem, que testemunhemos a inflexão da curva de emissões de gases estufa. Segundo a vice-presidente do IPCC, a climatologista brasileira Thelma Krugg, a queima de combustíveis fósseis segue em alta e não há indícios de que isso se modifique tão cedo.
Estimular a compra de veículos automotores – com a redução do IPI, por exemplo – não é algo compatível com o Acordo de Paris, assim como a prorrogação do prazo para a existência de lixões no Brasil – a decomposição da matéria orgânica provoca emissões importantes de metano (CH4) que é um gás de efeito estufa – recentemente aprovada pelo Congresso. A recente elevação das taxas de desmatamento na Amazônia fez acender a luz amarela nas rotinas de fiscalização e punição dos criminosos. Como admitir que apenas 3% das multas aplicadas pelo IBAMA desde 2011 tenham sido pagas?
Enquanto o analfabetismo ambiental prevalecer no meio político, a situação não deverá mudar tão cedo. É preciso adequar as políticas públicas ao norte magnético apontado pela bússola de Paris. Em 2016 teremos eleições para Prefeitos e Vereadores no Brasil. Importante que os candidatos sejam cobrados sobre o que pretendem fazer, por exemplo, em relação à construção civil (compromissos efetivos em favor das construções sustentáveis, que são bem mais eficientes no consumo de energia), mobilidade urbana (estimular transporte público de massa, criar programas de carona solidária, abrir espaço para pedestres e ciclistas, etc), expansão ou proteção das áreas verdes (bom para a saúde e bom para o meio ambiente, porque cada jardim ou floresta tem a capacidade de estocar C02 a um custo baixíssimo), entre outras medidas urgentes.
Como promover tamanho freio de arrumação em um planeta tão acostumado a emitir gases estufa sem um novo projeto educacional? Desde cedo a garotada precisa entender o gigantesco desafio civilizatório embutido no combate ao aquecimento global. Compreender o senso de urgência em torno do assunto é algo extremamente importante para essas novas gerações que deverão crescer – se nada for feito – num planeta onde o desequilíbrio climático já tem provocado eventos extremos (furacões, tornados, tufões, tempestades mais violentos), mudança do ciclo das chuvas (com impactos vorazes sobre hidroeletricidade e produção agrícola), elevação do nível do mar, inundação das áreas costeiras, aumento das doenças transmitidas por mosquitos (inclusive aquelas veiculadas pelo Aedes Aegypti como o Zika vírus e a terrível microcefalia).
O Acordo do Clima é certamente um dos maiores e mais importantes da história da diplomacia mundial. Mas não nos iludamos. Tal como a Declaração Universal dos Direitos Humanos (adotada pela ONU em 1948) o Acordo sinaliza rumo e perspectiva, aponta o que é o certo, e se apresenta como um compromisso coletivo. Tornar o Acordo realidade exige atitude. Diária e obstinada. (Mundo Sustentável/ #Envolverde)
* André Trigueiro é jornalista com pós-graduação em Gestão Ambiental pela Coppe-UFRJ onde hoje leciona a disciplina geopolítica ambiental, professor e criador do curso de Jornalismo Ambiental da PUC-RJ, autor do livro Mundo Sustentável – Abrindo Espaço na Mídia para um Planeta em Transformação, coordenador editorial e um dos autores dos livros Meio Ambiente no Século XXI, e Espiritismo e Ecologia, lançado na Bienal Internacional do Livro, no Rio de Janeiro, pela Editora FEB, em 2009. É apresentador do Jornal das Dez e editor chefe do programa Cidades e Soluções, da Globo News. É também comentarista da Rádio CBN e colaborador voluntário da Rádio Rio de Janeiro.
** Publicado originalmente no blog Mundo Sustentável.