por Darlene Menconi, especial para a Envolverde – 

Empresas não têm filhos, sempre ouvi. Mas é lícito exigir das instituições públicas e privadas que facilitem o direito das crianças de terem pais

Eu cuidava da estratégia de comunicação de um grupo que reunia empresários e executivos que respondiam por quase metade do PIB nacional. Duas décadas de experiência na redação de grandes grupos de mídia me faziam transitar com grande compreensão por esse universo patriarcal.

Vi amadurecer o movimento de lideranças femininas. Até se transformar em semente de um dos mais organizados grupos da sociedade plural, com ramificações dentro e fora do Brasil.

Ali estava a geração de mulheres pioneiras em praticamente tudo. Desbravadoras, corajosas, generosas, elas aprenderam a navegar no universo machista dos negócios e da política, cada uma à sua maneira. E colocaram seu prestígio e influência na defesa da participação mais ativa e efetiva de mulheres nos cargos de liderança.

Para sensibilizar seus pares masculinos sobre a importância do equilíbrio entre trabalho, saúde e qualidade de vida, as mulheres líderes convidaram para o evento inaugural a médica pediatra Zilda Arns, eleita personalidade empresarial feminina daquele ano.

Quando me viu no auditório, 4 dias antes de dar à luz, a fundadora da Pastoral da Criança mudou a tema da palestra. Dedicou seu discurso à minha filha. Foi um fuzuê.

Era claro o desconforto provocado pela fala de Dra Zilda sobre o tabu da gravidez no mundo dos negócios e do poder.

No final da apresentação, ouvi um empresário branco, meia idade, heterossexual falar com certa irritação:

– Me fez perder tempo com assunto de gravidez. Quem ela pensa que é?

Contei para Dra Zilda. Ela apoiou os dedos longos em meu antebraço e disse, com a mesma voz calma e baixa do irmão, o arcebispo dom Paulo Evaristo Arns:

– Vai piorar muito quando sua filha nascer.

Como pode piorar, Dra Zilda, perguntei. Fazia poucos dias, me chamaram na agência para a qual eu prestava serviços e disseram:

– Não tem nada a ver com o fato de você estar grávida, mas a gente queria que você primeiro tivesse seu bebê e depois voltasse.

Empresas não têm filhos, sempre ouvi. Mas é lícito exigir das instituições públicas e privadas que facilitem o direito das crianças de terem pais. No mundo corporativo, me explicou Zilda Arns, as mulheres não têm o direito de serem mães. São pressionadas a abandonar a amamentação, que é uma forma de garantir a saúde física e emocional dos adultos de amanhã.

Naquele dia, fiz à Dra Zilda duas promessas que mudariam para sempre minha vida, e de minha filha. Amamentaria exclusivamente até Beatriz completar 6 meses e 1 dia. E lutaria pelo direito de outras mulheres fazerem o mesmo. É o que faço desde então, como consultora especializada em comunicação e sustentabilidade. E o que me levou a ser uma das coordenadoras do movimento apartidário Mulheres com Direito.

Depois de tantos anos lidando com organizações e profissionais, estou convencida de que as mulheres não chegam aos cargos de decisão porque quando estão no auge da carreira, são expulsas e impedidas de dar um salto para postos mais elevados. Coincidentemente, no exato momento em que muitas de nós se tornam mães.

As mulheres são punidas duplamente pela maternidade. Boa parte disso é porque os homens acreditam que filho é coisa de mulher. Não é. Em caso de separação litigiosa, então, a punição pode ser tripla.

O exercício da parentalidade responsável, com efetiva participação de pais e mães, e divisão equilibrada de responsabilidades na criação e educação dos filhos, pode criar um contexto sociocultural favorável à equidade de gêneros em todos os demais setores da sociedade.

É disso o que vamos tratar no 15º Encontro Mulheres com Direito: Parentalidade responsável e seu impacto na equidade de gêneros, no próximo sábado, dia 3 de agosto, em São Paulo.

Filho, no Brasil, é tido como sendo “coisa de mãe”. Está posto no pensamento coletivo, nas decisões machistas da Justiça que protege o patrimônio do pai, frequentemente negando ao filho o direito ao sustento.

Empresa não tem filhos, é verdade. Isso porque quem está no comando de empresas, instituições, do poder e da política são homens. Poucos são aqueles (eles existem) que exercem a empatia e conseguem entender as necessidades das crianças.

A consciência e a prática corporativa podem fazer grande diferença na mudança de jogo. E isso começa permitindo que os homens possam exercer o papel de pais. Porque se filho necessita da mãe nos primeiros meses, e toda criança tem o direito de ser amamentada exclusivamente até os 6 meses de vida, é importante saber que os pais são o sustentáculo moral das crianças.

Filho precisa de pai, mãe, tio, avós, irmãos. De amor e cuidado.

Cuidar de criança não é coisa de mulherzinha. É essencial para formar cidadãos seguros e para assegurar uma mudança nos vergonhosos índices de mortalidade materna e infantil. Maior participação paterna na vida familiar e doméstica pode se tornar uma iniciativa chave para a equidade de gêneros no mercado de trabalho.

No 15º Encontro Mulheres com Direito haverá participação de especialistas de diversas áreas, que tratarão da relevância da participação masculina no exercício da parentalidade. Outros temas são guarda compartilhada, alienação parental, paternidade como gatilho de transformação do homem e como antídoto ao machismo e à masculinidade tóxica.

Precisamos abrir espaço para que homens e mulheres possam exercer a paternidade. É necessário integrar todos para juntos mudarmos o desequilíbrio entre os gêneros e construirmos uma sociedade marcada pela efetiva equidade nas esferas privada e pública.

O evento do Mulheres com Direito é gratuito. Para participar, basta doar uma manta ou agasalho em bom estado para a Campanha do Agasalho 2019.

15º Encontro Mulheres com Direito: Parentalidade responsável e seu impacto na equidade de gêneros. 3 de agosto de 2019, 09h-12h30, New Empire of Business – São Paulo, SP

https://www.sympla.com.br/15-encontro-mulheres-com-direito-parentalidade-responsavel-e-seu-impacto-na-equidade-de-generos__586745

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