O “revogaço” ambiental que o brasil precisa
Por Marina Helou * e Marcus Eduardo de Oliveira ** – Derrotar o projeto fascista de Jair Bolsonaro, o pior presidente brasileiro de todos os tempos, foi o primeiro – e decisivo – passo para salvar a democracia e o projeto de nação.
Por Marina Helou * e Marcus Eduardo de Oliveira ** –
Derrotar o projeto fascista de Jair Bolsonaro, o pior presidente brasileiro de todos os
tempos, foi o primeiro – e decisivo – passo para salvar a democracia e o projeto de
nação. Agora, a partir de janeiro de 2023, a etapa seguinte: reconstruir ponto a ponto
o desmonte implantado em quatro anos de governo Bolsonaro, especialmente a política e a estrutura de governança ambiental brasileira, tema central de nossa discussão aqui.
Diríamos mais: é chegado o momento de reconstruir a política ambiental global, a
partir da necessária recuperação da Floresta Amazônica (e seu imprescindível papel na
manutenção de serviços ecológicos) e de práticas de desenvolvimento que dialoguem, protejam e respeitem o meio ambiente, com participação permanente com a sociedade.
Com efeito, talvez cada uma dessas ações interligadas – isto é, reconstrução e
desenvolvimento social, humano, econômico – sejam, entre tantas outras, as que mais
clamam urgência no futuro e tão desejado governo Lula 3.
No âmbito da questão ambiental, o compromisso-chave já está delineado: fazer um
amplo “revogaço” ambiental logo de início. Quer dizer, novas regulações, ajustes e mesmo revogação (reversão total) imediata. A começar por resgatar o espaço da sociedade civil no Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) – de 11 cadeiras existentes, a dupla Bolsonaro-Salles reduziu para apenas quatro.
E não é só isso. É preciso voltar a fortalecer os órgãos de proteção ambiental,
escandalosamente enfraquecidos durante o desgoverno dos últimos anos. É igualmente
importante suprimir de vez aquilo que os ambientalistas (vozes que foram abafadas
nesses últimos tempos) vêm chamando de “legado tóxico” da política ambiental de
Bolsonaro, o que inclui aumentar a proteção da biodiversidade e instituir uma nova relação com os povos originários e quilombolas. O outro nome disso, assim sabemos, é
prosperidade inclusiva, e tem a ver com novos valores e comportamentos.
Na prática, isso não é um mero detalhe. Estamos falando da saúde do planeta, de
manter a floresta em pé e de colocar em ação uma verdadeira e consistente política de
sustentabilidade, valor capaz de devolver o equilíbrio planetário.
Nessa mesma direção, urge revogar pelo menos 80 medidas antiambientais conduzidas por um governo marcado pelo desapego à realidade socioambiental. Por exemplo: Adote um Parque, política vazia que deixou a cargo do setor privado a gestão de unidades de conservação, mas que, na prática, não aconteceu. Importa ainda revogar em caráter de urgência normas que dificultaram a aplicação e a cobrança de
multas ambientais por parte do Ibama.
Outro exemplo é o Programa Lixão Zero, que, apesar de apoiar estados e municípios para a melhoria da gestão de resíduos sólidos, traz retrocessos imensos ao estimular a adoção de tecnologias obsoletas e poluentes, abandonadas na Europa e nos EUA, como a incineração dos resíduos para gerar energia.
De tal forma que esse “revogaço” ambiental marcará triunfalmente o início da nova
gestão Lula e Marina Silva (detalhe importante: enquanto escrevemos essas linhas, a
ex-Ministra ainda não foi oficialmente anunciada como titular da pasta que a
consagrou como uma das principais lideranças internacionais em matéria de meio
ambiente).
Ademais, no rol de mais ações esperadas, a atualização (leia-se, uma nova diretriz) do
ICMbio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) e do próprio Ibama
(Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e de Recursos Naturais Renováveis) contam
com atenção especial.
Ainda assim, a ação/tarefa que mais exige pressa diz respeito, sobretudo, a organizar
medidas de segurança humana, de combate às mudanças climáticas e de defesa da
maior floresta tropical do mundo, cuja criminosa destruição (queimadas e
desmatamentos que batem recordes ano após ano) está em crescimento desde 2017
— foi de 73% a taxa de desmatamento nos três primeiros anos do governo Bolsonaro.
Tema central, inútil dizer às claras que restaurar ecossistemas de alto carbono, como é
o caso de florestas, é de fundamental importância como iniciativa internacional para
mitigar as mudanças climáticas.
Para que se eliminem dúvidas, o que estamos dizendo
abertamente diz respeito à regeneração do planeta.
Sob esse nobre sentimento, recordemos a mensagem do Papa Francisco, anunciada
em abril de 2021, mas sempre atual: “é preciso cuidar da natureza para que ela cuide
de nós”. Por isso, vale observar com cuidado, organizar uma força-tarefa envolvendo outros ministérios, notadamente o da Agricultura e da Segurança Pública, e olhar com mais atenção para os outros biomas do País (especialmente o Cerrado e o Pantanal),
integra, de modo prático, um conjunto de ações que vise resgatar de vez o Brasil para
a condição que sempre ocupou e que foi perdida diante da chegada desastrosa de
Bolsonaro ao poder: protagonista da pauta ambiental global.
Está no radar das próximas ações propositivas retomar as negociações e “recuperar” o
colegiado (comitê e grupo técnico) que faz a gestão do Fundo Amazônia,
descongelando o montante de R$ 3,6 bilhões repassados por Noruega e Alemanha.
Não menos importante, é a questão urbana, das cidades, onde vivem mais de 80% da população brasileira. É nas cidades onde os efeitos negativos das mudanças climáticas serão mais sentidos – e, principalmente, pela população que já se encontra em situação de vulnerabilidade: quem vive nas regiões periféricas das grandes cidades.
Aliás, pelas mãos de Marina Silva, já foi encaminhado um pedido formal à John Kerry
(enviado especial dos Estados Unidos para o clima) para que o país liderado por Joe
Biden passe a contribuir com o Fundo. Dinamizar esse Fundo, bem sabemos, é tarefa-
chave. De 102 projetos apoiados pelo Fundo Amazônia (criado em 2008), apenas 47 já
foram concluídos. Há muito ainda por fazer e a hora é essa.
Por último, mas não por fim, superando desafios inéditos e sepultando de vez quatro
“trágicos” anos de escuridão de governo Bolsonaro, alimentado por uma militância
extremista que mais se assemelha a uma seita de lunáticos que ajudou a transformar a
pauta ambiental doméstica em agenda ideológica, o novo Brasil de Lula e Marina, e de
todos os brasileiros que sustentaram a frente ampla pela democracia, volta a ter
compromisso com a realidade, e, mais do que isso, volta a recuperar a imagem do país,
especialmente para a luta de todos: o desmatamento zero na Amazônia.
Justamente por isso, ao reinserir o Brasil na arena internacional, quem sabe sejamos
recompensados com a COP30 (em 2025) aqui em nosso pedaço de chão, recebendo as
nossas cores e o nosso jeito especial de organizar a questão ambiental.
(*) Deputada Estadual pela REDE SUSTENTABILIDADE (São Paulo). Eleita para o segundo mandato (2023-2026). Formada em Administração Pública pela Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP), com especialização em negócios e sustentabilidade pela Fundação Dom Cabral / Cambridge University.
(**) Economista e ativista ambiental. Especialista em Política Internacional pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESP-SP). Mestre em Integração da América Latina (PROLAM) pela Universidade de São Paulo (USP). Foi professor do Departamento de Economia da Fundação Instituto Tecnológico de Osasco (FAC-FITO) e do UNIFIEO (Centro Universitário Fundação de Ensino para Osasco). Autor de
Civilização em Desajuste com os Limites Planetário
” (CRV, 2018), entre outros.
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