Por Patrícia Kalil, especial para Envolverde –
“Os movimentos sociais amazônicos propõem reflexões de ponta, com discussões estratégicas que questionam profundamente o modelo de desenvolvimento e o nosso caráter civilizatório”. Dessa maneira, o historiador Guilherme Carvalho, coordenador da FASE Amazônia, comenta a abertura do décimo Fórum Social Pan-Amazônico (FOSPA), que teve início hoje em Belém e acontece até domingo, dia 31 de julho, na Universidade Federal do Pará.
O planeta enfrenta uma crise profunda provocada por um modelo de sociedade baseado na extração, produção, consumo, acúmulo e descarte que coloca os seres humanos apartados da natureza. Na FOSPA, é este modelo de desenvolvimento que está sendo posto em xeque.
Carvalho reflete sobre a origem e evolução da palavra “des-envolvimento”, lembrando que o prefixo latino “des” significa separação, afastamento. Assim, este “des-envolvimento” imposto pelo sistema atual capitalista acarreta em um distanciamento entre os seres humanos e a natureza. Aqui, Carvalho honra o geógrafo e professor Carlos Walter Porto Gonçalves que trouxe essa provocação para pensarmos juntos sobre o que está fundamentalmente errado nesse tal des-envolver. O hit global, agora, é envolver!
“Nós temos que romper com essa apartação irreal da sociedade da natureza, essa foi uma ideia falsa imposta pelo capitalismo. É necessário mudar radicalmente as relações entre nós, construindo relações em outras bases que não sejamos a todo tempo atravessados pelo mercado. Da mesma maneira, isso implica em repensar nossa relação com nossa própria vida e sentido. Hoje somos uma sociedade adoecida, baseada no consumo excessivo de tudo, de remédios inclusive, e essas coisas são funcionais apenas ao capitalismo. Dando esses passos, podemos entender que nossa vida é muito mais que o modelo econômico”, argumenta.
O FOSPA abre espaço para dezenas de painéis simultâneos auto-gestionados com o objetivo de alimentar as lutas e resistências em todos os territórios da PanAmazônia, fazendo uma leitura estratégica da conjuntura da região no século XXI, frente ao agravamento da crise climática, ao colapso global e a urgência da defesa da floresta em pé.
Uma cidade como Belém ou São Paulo não são e não podem ser referência de futuro na Amazônia, o coração pulsante que guarda a maior floresta tropical do planeta. “Essa é a riqueza do debate que vem sendo feito na Amazônia. Nós não estamos presos ao debate do modelo antigo de desenvolvimento, mas estamos discutindo civilização: o que nós somos, o que nós queremos ser hoje e o que nós queremos ser daqui pra frente. É uma discussão muito profunda porque envolve questões da mais alta relevância para a humanidade”, desentenebrece Carvalho.
Para ele, partir dessa discussão para dizer que os movimentos sociais são contra o progresso é uma armadilha político-ideológica que precisa ser combatida. Grandes empresas usam esse argumento como forma para acabar com o debate, colocando a sociedade contra os movimentos sociais, evitando a discussão de alternativas viáveis.
Hoje, o debate na Pan-amazônia é inclusivo –muito por conta das reflexões que as organizações andino-amazônicas vem fazendo. “Nós não queremos um outro modelo de desenvolvimento, nós queremos discutir um modelo ao des-envolvimento. Não é apenas um jogo de palavras. É dizer que isto não nos interessa. Os movimentos sociais na Amazônia estão no debate de ponta sobre o que é fundamental para as sociedades no mundo inteiro” . (#Envolverde)