Opinião

Pode a educação socioemocional resolver a crise ambiental?

Por Neuza Árbocz*

O ser humano tem a maior capacidade de modificar o ambiente a sua volta, produzir energia, mudar paisagens, transformar materiais e manipular outros seres vivos. Com suas mãos, torna um deserto, um oásis. Ou vice-versa.

Esse “ou vice-versa” é que assusta. Com tantas possibilidades de escolhas de atuação, por que não faz as melhores? Aquelas capazes de garantir bem estar, alegria e entusiasmo em dia-a-dias em sintonia com a vida no planeta?

Foto: Shutterstock

 

Os assentamentos humanos, de início, foram organizados em estreito contato com os ambientes selvagens e livres. As pessoas eram minoria e se reuniam para se sentir protegidas e ter mais agilidade na obtenção de água, comida e confortos. Isso possibilitou o desenvolvimento de tecnologias, vilas e cidades.

Essa busca por facilidades, contudo, ao longo das eras, formou as dificuldades que ora enfrentamos. Mais do que a perda da conexão com os ciclos ambientais de onde se fixam, a origem dos problemas para as nações atuais está na visão de mundo pautada em competição, intolerância, cultura de medo e agressão, temperada não raro por um egoísmo cego, da criança que grita e exige suas necessidades atendidas, sem noção alguma dos efeitos de sua vontade.

Por diversas vezes na História, grupos se sentiram especiais, acima dos demais. Com esta convicção, cometeram abusos causando traumas e revoltas que reverberam até o presente. O domínio de uns pelos outros, seja pela simples força bruta, seja pela inteligência e lógica, seja por crenças religiosas ou sociais, onde alguns se consideram ‘os escolhidos’ e, portanto, merecedores de privilégios e de se fazerem servir pelos demais, ainda é uma chaga no seio da civilização global.

No entanto, a organização humana pode ser baseada em comunidades circulares; onde todos os membros tenham igual status e se revezem nos serviços e tarefas a executar.

Grandes vozes pregaram esse mundo equânime, ao longo da História. Líderes espirituais como Gandhi e Madre Tereza; sociais, como Martin Luther King e políticos, como o ex-presidente uruguaio José Mojica deixaram exemplos práticos de um caminho diferente, conciliador, amoroso e baseado em altruísmo e cultura de paz. Os próprios testamentos da religião cristã migraram da dura ética do “olho por olho, dente por dente” para a fraterna “ofereça a outra face”.

Que sociedade surgiria se a educação socioemocional que cada bebê recebesse desde seu nascimento fosse centrada na gentileza? Se a própria gestação fosse sempre um ato desejado, planejado e marcado pelo mais puro amor e vontade de fazer o bem ao pequeno ser por vir?

Se as escolas e lares ensinassem, sobretudo, o desenvolvimento da empatia? O compartilhar e a generosidade? Se em vez de ameaças, castigos e punições, cada pequeno ser fosse educado com prática diária de auto-percepção, percepção do outro, relaxamento e meditação?

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Seres humanos mais maduros, conscientes de que seus impulsos, vontades e necessidades são similares as de todos os seres vivos, tornam-se menos reativos; mais capazes de enxergar seus próprios atos e a consequência deles para a vida a sua volta. Deixam, assim, de se colocar no centro do mundo, com direito de dispor da natureza e das demais pessoas e espécies sem limites ou empatia.

Estimular o sentido de pertencimento e a formação de um bom coração – não ingênuo e manipulável, mas firme e resiliente na construção do bem, do bom e do belo, capaz de enxergar naquele que comete desatinos e crueldades um semelhante a resgatar para o convívio em equilíbrio – é a tarefa mais urgente que qualquer povo deveria ter.

Só assim, inauguraremos de fato uma nova era na Terra, em que a vida abundante e em constante renovação no planeta será percebida como nosso presente diário. Onde ‘Ser’ sobreporá o ‘Ter.’ Onde ninguém se importará em fazer pequenas tarefas cotidianas ou precisará de títulos imponentes como “doutor” para gostar de si mesmo e atuar, com contentamento, na grande teia de relações que envolve a tudo e a todos.

Educar-se socioemocionalmente abre uma via para se incorporar a visão sistêmica, a ponto de frear os impulsos mais primitivos e hedonistas em prol do coletivo. Para formar, intuitiva e naturalmente, dia-a-dias de fato sustentáveis por gerações e gerações. (#Envolverde)

* Neuza Árbocz é Jornalista e pioneira da Internet do Brasil. Integrou a equipe que instalou o Yahoo! no Brasil em 1999 e foi responsável pelo conteúdo editorial do portal por seis anos. Especializou-se em Educomunicação e Gestão de Projetos Socioambientais. Foi responsável por Redes Sociais para o grupo internacional Aegis Isobar, de 2008 a 2014. Formou-se em Design para a Sustentabilidade pelo Gaia Education, educadora vivencial pelo Sharing Nature Brasil e como agente urbano socioambiental pelo programa Carta da Terra. Desenvolveu materiais para o ICLEI, o Sebrae e o BID – Banco Interamericando de Desenvolvimento. Atuou como gerente de Gestão Integrada de Território – GIT, do Instituto IBIO. Trabalha por um desenvolvimento local, integrado e sustentável em diversos pontos do Brasil e dirige projetos de Comunicação e Educacionais para Editora Horizonte. Ministra palestra sobre Sustentabilidade no Dia a Dia, Leitura crítica da Mídia, e Redes Sociais e Cidadania Planetária. Colaboradora especial da Envolverde em serviços, cursos e projetos jornalísticos. Integra a RBJA – Rede Brasileira de Jornalistas Ambientais e a rede Greenaccord de jornalistas ambientais internacionais.